"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Tanta gente nas ruas de Tbilisi, ontem, de bandeira da União Europeia na mão. Coisa quase de exército medieval, o estandarte não podia cair no chão, de maneira nenhuma, era símbolo, abrigo e bóia de salvação. E, quando por momentos parecia que ia ser derrubado, logo uma multidão se juntava para amparar o porta-estandarte. No país de Estaline as pessoas não saíram à rua com a bandeira da União Soviética erguida a pedir o regresso do capitalismo de Estado, saíram com a da União Europeia e pedem integração, livre circulação e liberdade. Dá que pensar.... Não, não dá, segundo o partido pan-eslavista português isso acontece porque os protestos são artificiais, instigados e financiados pela... União Europeia. Ainda não perceberam, ou ainda não acreditam, que o muro de Berlim caiu para o lado de cá, não caiu para o lado de lá. Torce-se a realidade para se encaixar na ideologia e tudo se explica com um "por causa da intensificação da escalada belicista dos Estados Unidos, da NATO e da União Europeia".
O partido que todos os anos chora o fim da União Soviética, onde o partido comunista proibiu todos os outros partidos, está contra a ilegalização do partido comunista na Ucrânia e não reconhece legitimidade, "no que à democracia e aos direitos humanos diz respeito", à União Europeia, onde os partidos comunistas não são proibidos. Como diria o criador da Cheka, aprendam, aprendam, aprendam sempre.
António Costa, aquele que ia ter uma carreira brilhante na Europa - "the future's so bright, i gotta wear shades", o que até mereceu raspanete de Marcelo, em tom de ameaça, no dia da tomada de posse do Governo, que anda desde a visita de Ursula von der Leyen a Kyiv a esvaziar expectativas ucranianas sobre a adesão à União Europeia, que não são favas contadas e coise, soube da visita de médico de Draghi, Macron e Scholz a Zelensky como todos os portugueses que vão a Bruxelas tirar fotos ao lado do Atomium, pela televisão, e pela televisão viu a presidente da Comissão Europeia dizer que a entrada da Ucrânia no clube é schnell, schnell. Agora só lhe resta ficar isolado no fica pé, ou engolir um sapo e dizer que o que disse não foi exactamente aquilo que toda a gente ouviu dizer. Como diria Mark Twain, "as notícias da importância europeia de António Costa eram manifestamente exageradas".
E, de repente, o número 3 do artigo 7.º da Constituição da República Portuguesa é mandado às malvas, por quem desde sempre a traz no bolso, qual livrinho vermelho de Mao, e a brande bem alto em todas as ocasiões, com o argumento de não afrontar o "espaço vital" de uma potência autocrática - Rússia, que se vê atacada e ameaçada pelas decisões soberanas de um país - Ucrânia, que se deve abster de o ser, e se calhar até pedir desculpa por existir, e da expansão de uma organização militar - NATO, e de outra político-económica - União Europeia, que, para o bem e para o mal, são até à data o cimento e a garantia de maior período de paz e prosperidade no continente.
A questão que deve ser colocada é: por que razão ou razões todos os países saídos do ex Bloco de Leste ou das ex repúblicas soviéticas têm como objectivo primeiro sair da órbita da Rússia e abrigarem-se debaixo do guarda-chuva da NATO e da União Europeia?
Pessoas que nasceram e cresceram numa Europa de paz, prosperidade, liberdade e democracia, só possível por causa da União Europeia e da NATO, e que investem a sua qualidade de vida vida a invectivar a UE e a NATO e a tecer loas a Putin, e outros democratas do mesmo calibre.
Depois do sucesso que foi a gestão da crise das dívidas soberanas, com contas de merceeiro a pensar nos "mercados", na salvação dos bancos e na nacionalização da dívida privada, ignorando que com pessoas empobrecidas e sem consumo não há capitalismo que resista, de onde nunca saíram regressam os mesmos de sempre com o sucesso anunciado da vacinação europeia, delineada a pensar nas multinacionais farmacêuticas, outra vez sem perceberem que se sem pessoas não há economia que resista e que as economias que primeiro conseguirem alcançar o objectivo imunidade de grupo são as que vão partir à frente na recuperação à escala global. São sempre os mesmos os mesmos de sempre, não é "a Europa", não é "a Comissão Europeia", nem tão pouco "os países do Norte" ou "os frugais", é o Partido Popular Europeu, desde 1999 à delinear os destinos da União Europeia. Até podíamos argumentar, como os minions da direita - PSD e CDS de plantão às "redes", que se fosse uma empresa privada a doutora Ursula Gertrud von der Leyen já há muito tinha sido despedida por incompetência, não se desse o caso de que a sua competência para governar para os grandes grupos económicos é que motivou a sua eleição e a mantém no cargo.
"Nos anos 60 já nós tínhamos homens no espaço ainda vocês aqui em Portugal andavam de burro".
Lembro-me sempre desta resposta dada por um ex colega moldavo a uns trolls imbecis, daquela espécie que tem por desporto gozar com quem vem de outros países procurar melhor vida no nosso, quando vejo os gráficos da Ilusão Liberal "até pelos países de leste já fomos ultrapassados!", prontamente papagueados pelos comentadeiros com lugar cativo nas televisões.
260.591 € para equipar um centro de imprensa em Lisboa - embora as conferências de imprensa da presidência sejam realizadas online e jornalistas estrangeiros não viajem para a capital portuguesa.
35.785 € em bebidas - num momento em que poucas pessoas se reúnem.
39.780 € na compra de 360 camisas e 180 fatos - com toda a gente em teletrabalho.
Projecto confiado a empresa que não obtém um contrato público desde 2011 e cuja experiência anterior em contratos com o sector público envolveu a organização de eventos para festas de aldeia.
Portugal’s ‘ghost’ EU presidency racks up in-person expenses
Agora que se avizinha a mui badalada bazuca europeia de ataque à Covid saem dos buracos aos magotes a clamar por um Governo de Salvação Nacional que é como quem diz um governo de salvação dos bolsos de amigos e clientes partidários arredados que estão da ida ao pote. A bondade patrioteira do bloco central dos interesses é uma coisa de bradar aos céus.
Em 2001, José Serra, ministro da Saúde do governo brasileiro de Fernando Henriques Cardoso, quebrou a patente do medicamento Nelfinavir, um dos 12 que compõem o cocktail anti SIDA, invocando a situação de emergência. Em 2021, com o planeta numa situação de pandemia, assistimos a quebras contratuais das multinacionais farmacêuticas no fornecimento de vacinas, havendo até a suspeita de "desvio" de vacinas para países que estão a pagar mais, apesar dos contratos previamente assinados. Não vale tudo para as farmacêuticas, o direito ao lucro não é um princípio absoluto.