"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
O primeiro imposto sobre os "lucros inesperados" foi aplicado em Portugal, sob aplauso da direita liberal, quando Vítor Gaspar, ministro das Finanças, resolveu taxar com 20% todos os prémios de jogo superiores a 5 mil euros, que já eram recebidos "limpos" pelos vencedores, depois de pagas todas as taxas ao Estado, obras sociais e et cetera, contra os 20 mil euros base de taxação em Espanha, por exemplo.
Ainda sou do tempo de trabalharem dezenas de pessoas nas agências bancárias espalhadas por todos os lugares do país e onde os funcionários conheciam os depositantes como o merceeiro de bairro conhece o cliente, de livro de cheques com o "canhoto" para acertar o saldo com a ficha de cliente arrumada por ordem alfabética nas gavetas fundas dos arquivos. Ia pela mão do meu pai e via muito maravilhado com olhos de puto todas estas operações e rituais e salamaleques. E os bancos tinham lucros. Grandes lucros.
Depois veio a modernização e éramos os melhores e os mais modernos do mundo em agências com balcões new age e chãos de mármore e tudo computorizado e falávamos muito nisso. E vinha o banqueiro de sorriso de orelha-a-orelha, ainda mais satisfeito que as reportagens dos jornalistas do economês nos telejornais, ainda mais satisfeitos que o banqueiro e com a modernidade da banca mais moderna do mundo, com empregados que escaparam à reforma antecipada e à rescisão amigável todos muito barbeados e equipados com fatos da Zara e da Massimo Dutti, todos muito satisfeitos e felizes por trabalharem na banca mais moderna do mundo e de fazerem sozinhos o que um exército de camisas Triple Marfel e calças terylene fazia antes deles. E os bancos continuaram a dar lucros. Grandes lucros. E quando não deram lucros, grandes lucros, estavam cá os contribuintes para assumir a culpa de viver acima das suas possibilidades.
Se tinham uma pequena ou uma grande curiosidade, se alguma vez vos passou pela cabeça saber onde é que os 'banqueiros milionários' portugueses, e outros portugueses milionários que não banqueiros, todos os dias nas televisões todos muito preocupados com o estado da Nação, têm o seu rico dinheirinho guardado, escusam moer mais a cabeça, escusam perguntar mais porque, ainda que inconscientemente, ainda que por exclusão de partes, Fernando Ulrich respondeu à questão. Em Portugal não é.