"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Embalada pela vitória na aprovação da Lei da Cópia Privada, que lhe permite extorquir dinheiro aos cidadãos para distribuir pelos associados, a Sociedade Portuguesa de Autores acha-se agora no direito de poder retirar às famílias os cadáveres dos entes queridos, contra a sua vontade e contra a vontade do defunto, porque "representa 26 mil autores de todas as áreas e tem 93 anos de existência".
Lembrei-me do debate Prós e Contras da passada segunda-feira na RTP1 subordinado ao tema "proposta de lei n° 246/XII, da Cópia Privada", de uma plateia composta por autores, criadores, cantores, cantautores, escritores, e sanguesugas-chupistas-chulos, destes últimos e do contribuinte, curiosamente nenhum deles vivo, quer os terminados em "ores" quer as rémoras destes, e de a páginas tantas ouvir-se argumentar que "neste momento já há músicos a passar fome". Lembrei-me, prontes...
«Meio milhão de portugueses precisa de ajuda alimentar
Expressamos o total e profundo desacordo com a proposta de lei n° 246/XII que pretende «clarificar e alargar o quadro de isenções previsto na Lei n.º 62/98, de 1 de setembro, procede à atualização da respetiva tabela de compensação equitativa, nela incluindo alguns equipamentos e suportes no âmbito da fixação e reprodução digitais que, por excelência, são hoje objeto de uma utilização alargada»
Agora é só cada português inscrever-se na Sociedade Portuguesa de Autores para passar a receber royalties provenientes das fotos que posta no Facebook e no Instagram tiradas com o telemóvel taxado pelo Governo para remunerar e acudir aos autores.
De um país de poetas tesos a um país de fotógrafos. Remunerados. Do capitalismo popular, onde cada cidadão era accionista de qualquer coisa, ao país do rendimento mínimo assegurado, por via da criação de qualquer coisa. É isto, não é, ou é apenas mais um roubo de Lei?
E já que pagamos taxa pelas fotografias que tiramos e pelos downloads que não fazemos é agora legítimo, porque está coberto pela Lei e pela taxa, desatar a fazer downloads e a piratear como se não houvesse amanhã. Continua a ser isto, não continua?
O Partido Socialista que recusa a criminalização do enriquecimento ilícito por considerar que se está perante uma inversão do ónus da prova, é o mesmo Partido Socialista que não tem pruridos em nos considerar a todos de criminosos, com o Projecto de Lei 118, ao introduzir uma taxa sobre todos os suportes, aparelhos e dispositivos de armazenamento digitais que são actualmente, ou venham a ser no futuro, utilizados para cópia privada?
Meanwhile as vozes incómodas dos artistas, os mesmos de sempre, nos sítios do costume, só grandes músicas e a melhor música de todas as estações (e apeadeiros), mais as Deolindas manhosas à procura do “venha a nós o vosso reino” (os bilhetes para a Sombra são mais caros que para o Sol, é por isso que as corridas nocturnas são mais democráticas) ficam macias. Granulação acima de 2000, só para tirar o brilho. Não se morde a quem nos dá de comer, um velho ditado salazarento. A esquerda sempre teve um jeito especial para tratar destes assuntos da kultura.
Pão e circo. Equação perfeita. Não se dera o caso de ir faltando o pão.