"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
O governo que em três meses ia resolver todos os males de que o Serviço Nacional de Saúde padece esconde a sua incompetência e falta de qualidade nas nomeações para cargos chaves, ao abrigo do amiguismo e do cartão do partido, com uma alegada incapacidade de quem está no terreno a dar o melhor de si contra a permanente falta de meios e o garrote da tutela.
Questionado sobre o prometido fim da invasão russa da Ucrânia em 24 horas Donald Trump respondeu que estava a ser sarcástico, a Luís Montenegro já ouvimos dizer que nunca tinha dito aquilo que todos o ouvimos dizer, que ia resolver os problemas do SNS em 90 dias. Há aqui um padrão, o da mentira e do embuste para chegar ao poder.
Diz que os hospitais tiveram prejuízos de mais de 1.500 milhões de euros em 2024 e que todas as unidades locais de saúde tiveram resultados negativos. E de imediato ficámos com os ecrãs de televisão cheios de especialistas em economês, todos em carneirada "O drama! A tragédia! O horror!". Falta de eficiência e subfinanciamento à parte não é suposto o Serviço Nacional de Saúde dar lucro. Nem sequer resto zero. É para isto que servem os nossos impostos. E por isso que se chama Serviço Nacional de Saúde e não Luz Saúde ou CUF Saúde. E se calhar é por causa disso mesmo que estas coisas aparecem elevadas ao cubo.
[Na imagem, minha, cartaz no desfile dos 50 anos do 25 de Abril, Avenida da Liberdade, Lisboa]
Louvo, por proposta da Ministra da Saúde, Ana Paula Martins, o Tenente-Coronel, médico, 12204597, António João Sant’Anna Gandra Leite d’Almeida, pela forma excecionalmente dedicada e competente, bem como pela nobre conduta, integridade e profissionalismo com que exerceu as suas funções como diretor da Delegação Regional Norte do Instituto Nacional de Emergência Médica entre 2021 e 2024. [...].
Parece-me manifestamente pouco para alguém com o dom da omnipresença e que, mal grado uma incapacidade atestada de 60%, consegue estar em vários locais ao mesmo tempo, separados por centenas de quilómetros, a desempenhar quatro funções diferentes. Tem dois apóstrofos no nome, há-de haver alguém capacitado para, cientificamente, estabelecer esta correlação.
No tempo do PS era "o caos nas urgências hospitalares", com eternos directos da porta do hospital, entrevistas a utentes, médicos e enfermeiros sem rosto e com a voz filtrada, gravações piratas do interior feitas com telemóvel pelos acompanhantes dos internados.
Agora são as "urgências com constrangimentos" e umas breves declarações da tutela ou de um administrador de hospital nomeado pela mesma tutela, com a atenuante de estarmos na época das gripes e das infecções respiratórias, coisa nunca vista era o Partido Socialista governo.
Primeiro acabar com a manifestação de interesse. As filas para a regularização deixaram de ser visíveis nas portas dos serviços de estrangeiros e lojas de cidadão, a tal "visibilidade" papagueada por Montenegro. Mas os migrantes continuam cá, agora clandestinos, "por no llevar papel", sem contrato de trabalho, tudo apalavrado com empreiteiros e patrões sem escrúpulos, sem casa, sem segurança social, abrangidos pelo contrato colectivo do medo, "correr es mi destino para burlar la ley". A seguir vedar o acesso aos cuidados de saúde gratuitos e universais, só deveres, trabalhar, muito, em empregos de merda que mais ninguém quer, mal pagos, nenhuns direitos a não ser o direito a passar mal. Estava escrito, as notícias eram curiosas, diria mesmo muito curiosas.
Por um lado temos um Serviço Nacional de Saúde esgotado, sem recursos - humanos e materiais, nalgumas valências a chegar ao limite ou mesmo sem capacidade de resposta; por outro lado temos milhares de estrangeiros a usufruírem gratuitamente da excelência do Serviço Nacional de Saúde. "Doctor, doctor give me the news", ponha o dedo no ar quem gosta de ser gozado.
Voltando aos 100 mil não residentes que recorrem ao SNS, aos 48 mil no Algarve - mão-de-obra barata para construção civil, restauração e hotelaria; aos 42 mil na Região Oeste - mão-de-obra barata para hortícolas e frutícolas; aos 41 mil na região de Lisboa - mão-de-obra barata para construção civil, restauração, hotelaria, alojamentos locais, limpezas, entregas e outros uber desta vida, lá se vai a hipóteses do turista manhoso que vem do estrangeiro usufruir da qualidade do nosso SNS, e vai haver muito boa direita do "sentido de Estado", e alegadamente democrática, a chegar à proposta do partido da taberna de interditar o acesso de imigrantes aos cuidados de saúde gratuitos e à escola pública.