"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
«Don't be told what you want, Don't be told what you need,
There's no future, No future, no future for you»
Alguns, por mais que se esforçassem, não conseguiam perceber o que lhes estava a acontecer mesmo debaixo dos ouvidos olhos. Outros fingiam não perceber, na secreta esperança de conseguir evitar o inevitável. Tarde demais. O mundo, tal como o conhecíamos, tinha mudado. Definitiva e radicalmente. A "revolução já estava nas ruas. Valeu, sobre tudo, pelos anos que se lhe seguiram, pela tomada de consciência política e social, por uma geração "perdida" e descrente- «there's no future, no future for you», e que teve expressão em movimentos como o "Rock Against Racism", "Rock Against Fascism", iniciativas várias contra a descriminação de minorias étnicas, minorias sexuais, e que culminou com as campanhas contra a fome em África. E tudo fora das baias ideológicas e político-partidárias e da "pele de galinha" de aslguns. 35 anos.
Passam hoje 30 anos sobre o lançamento da “bomba atómica” que dá pelo nome de Never Mind The Bollocks Here’s The Sex Pistols, e que ao mesmo tempo assinala o dia em que o Punk morreu, dando origem a uma miríade de tribos, subgéneros e outros derivados. Aliás só podia ser desta maneira, num movimento que trazia gravado no seu ADN o que o futuro lhe reservava: No Futur! era então o lema e a palavra de ordem. No Futur! para o Punk, numa atracão suicida pelo abismo mas necessária para pôr cobro ao marasmo em que o Rock n’ Roll havia caído por via de bandas como os Genesis, Yes, Van deer Graft Generation ou King Crimson, que lhe haviam retirado toda a energia e rebeldia, e o tinham levado pelos caminhos do sinfónico até aos limites do insuportável. No Futur! a máxima personificada na vida e na morte de Sid Vicious, para a posteridade como o ícone do movimento; too fast too live too young too die. Nesta fúria avassaladora os Pistols não eram os porta-vozes da destruição, eram a própria destruição encarnada em forma de banda; o papel de ideólogos, a consciência política estava reservado para outros, os The Clash. O puto John Simon Ritchie-Beverly, filho de uma hippie, e que havia sido repescado para a banda já com o comboio do Punk em andamento, acaba por simbolicamente personificar Orestes na tragédia grega: o Punk, descendente directo do movimento Hippie, e cuja praxis levou à destruição da aberração musical em que o flower power se tinha transformado.
Ao contrário dos desgraçados da chamada geração de 60, que respondem pelo nome de hippies e que constantemente bradam aos ventos que “no nosso tempo é que era bom!”, nós, os do Punk não dizemos que "naquele tempo é que era". Eu andei por lá e digo, naquele tempo foi o que foi. Foi bom? Com certeza que foi. Foi curto e bom, mas não vamos ficar até ao fim das nossas vidas a chorar pelos bons velhos tempos. Antes pelo contrário, neste momento, e pelo caminho que as coisas levam, já vai fazendo falta uma outra bomba atómica. Aqui há uns anos tivemos umas ameaças com o grunge, mas não passaram disso mesmo, ameaças. O que me dói, o meu quase desespero, é não conseguir ver actualmente, mesmo que em gestação, nada minimamente semelhante e que possa vir a produzir resultados idênticos aos de 77. Vai ser preciso esperar muito mais?
Post-Scriptum: Por uma daquelas coincidências da vida, hoje 30 anos após o lançamento de Never Mind The Bollocks, e dois antes de escrever este post, tive um jantar de amigos, daqueles que já não vemos "aos anos!", assim ao jeito de Os Amigos de Alex, aqueles amigos que como já aqui havia referido, e que, apesar de serem da minha geração, à época andavam pelo sinfónico e me faziam a cabeça em água. Trinta anos passados e eles por lá continuam, pelo sinfónico, e eu, que já não ando por lá, pelo Punk, nem de longe nem de perto, e que depois disso já passei por tantas! O gozo que este jantar me deu!
(Na foto abaixo, poster que acompanhava a primeira edição do disco)