"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Eu estava descansado em casa quando me foram desinquietar, "é pá, não queres ir fazer o dj Faísca à Capricho e coise?", e eu "é pá o dj Faísca está morto há mais de 10 anos, não me fodam o juízo", e do outro lado "é pá, anda lá, uma vez não são vezes e o caralho", e eu " e qual é o nome da noite?", e do outro "lado "hang the dj!, como a música dos Smiths", e eu "foda-se, até parece que não sei, rebéubéu, conversa para aqui, conversa para ali, eu faço o cartaz". E prontes, o cartaz está feito, estão convidados, e vamos lá ver que merda é que sai daqui. O nome da noite não é para levar à letra, just saying.
[Provavelmente o graffiti mais antigo da cidade de Setúbal, desde o dia 26 de Abril de 1974 na parede da antiga conserveira 1.º de Março à Rua Camilo Castelo Branco]
Diz o candidato do Ilusão Liberal à câmara de Setúbal no Diário de Notícias de hoje que "em 47 anos foi só perder". Fazendo uma contas rápidas de cabeça: 2021 - 47 = 1974, o ano do 25 de Abril, e conclui-se que ele "Chega" ao tempo em que o presidente da câmara era nomeado pelo poder central fascista, o tempo em que a família valia na cidade pelo nome, em que não havia cá chatices com eleições e democracias. "Nos anos 70, éramos a terceira cidade do país". Cercada de bairros de lata por todos os lados, excepto pelo lado do rio, onde estavam os pés descalços que iam ao mar quando fazia bom tempo, 4.ª classe para os filhos e ala deitar rede ou aprender um ofício, que davam as mulheres às fábricas de conservas e divertiam-se a falar de bola nas centenas de tabernas que floresciam na cidade e, quando o paizinho do nome de família passava na rua, tiravam o boné, faziam uma vénia e diziam "bom dia sô tôr", que o respeitinho, que era muito bonito, perdeu-se todo com a merda do 25 de Abril, que a escumalha agora até tem canudo e não se inibe de opinar sobre a cousa pública. O partido novo da gente velha ou o novo partido da velha gente, vai dar no mesmo.
Pessoas de Lisboa não podem almoçar ou jantar até tarde em restautantes por causa do vírus mas podem meter-se no carro e ir almoçar a restaurantes em Setúbal por causa do vírus. O vírus não carrega no erre.
- Que violência chama violência e quem quem passa a vida a insultar e agredir verbalmente os outros só pode esperar a retribuição, é uma questão de tempo. E depois lá virá o Calimero com o dia negro e o atentado à democracia e a liberdade e o coise e tal quando dos maiores atentados que se podem fazer à democracia e ao Estado de direito democrático são as agressões a jornalistas e a coacção à imprensa, mas isso não é merecedor de condenação ou reparo.
- Que Joseph Goebbels inventou tudo o que havia para inventar em matéria de propaganda e agit-prop e que agora é só ir buscar e remasterizar porque há sempre uns pobres de espírito dispostos a tudo papar.
E foi um processo em crescendo. Começou com a insinuação de fraude eleitoral. Passou para a fraude dos ciganos inventados. Uma perseguição automóvel do Bloco de Esquerda. Uma incursão em território religioso que correu mal e passou ao lado da generalidade da comunicação social. Até uma tentativa de apedrejamento por ciganos verdadeiros com cartazes da candidata que o vai remeter para a terceira posição nas Presidenciais numa luta ombro-a-ombro com o candidato comunista. Tipo a facada do Bolsonaro, mas como os ciganos modernos não usam facas os ciganos inventados estavam lá atrás preparados para que tudo corresse pelo melhor. E o melhor tinha de ser hoje, o penúltimo dia de campanha, porque se fosse amanhã, o último dia, não servia para nada porque não era notícia em lado nenhum por causa do "dia de reflexão".
Percebem?
[A montagem de Bernie Sandres na recepção cigana ao Ventas é do Nuno Alexandre]
Cada vez mais perto os gloriosos dias das "vistas maravilhosas" em que deitados na toalha no areal de Tróia teremos como paisagem o Cristo-Rei, a ponte 25 de Abril e toda a linha de costa desde Lisboa até Cascais.
Cruzei-me com "o dono do jardim" ao pé de casa, o cabo-verdiano que o tem por conta, todos os dias, de segunda a sexta, aparar sebes, cortar relva, podar árvores, tudo num brinco, que me retribui sempre o cumprimento de bom dia ou boa tarde e que já não via desde que toda a gente recolheu a casa. Viu-me de máscara e, a deixar adivinhar o sorriso de orelha a orelha tapado pela sua, ao bom dia acrescentou "doutor, agora somos todos doutores".
O que me deixa tranquilo nesta contaminação dos lares da terceira idade com Covid-19 é que até agora só os "colaboradores" foram contaminados, nas televisões não há notícias de trabalhadores nessa situação, menos mal.
Fui ao Lidl do Bairro do Liceu e estava a tocar Massive Attack nas colunas de som. À saída fiquei um bom bocado cá fora para ver se a seguir vinha Tricky mas era sorte a mais no mesmo dia no mesmo supermercado.
No regresso passei pelo Bairro do __________ e o barbeiro estava aberto a cortar o cabelo aos velhos. A vida é bela.
[Provavelmente o graffiti mais antigo da cidade de Setúbal, desde o dia 26 de Abril de 1974 na parede da ex-conserveira 1.º de Março à Rua Camilo Castelo Branco]
Tinham 200 metros de altura cada e estavam há 42 anos na paisagem da cidade. Nos idos do liceu chegámos [um grupo de amigos] a planear uni-las por uma corda com cuecas, peúgas e soutiens, pendurados com molas, ao estilo estendal de roupa, acção de "guerrilha urbana" não concretizada por nunca termos conseguido contornar a segurança da central. Foram abaixo, sem glória e sem direito a multidões de despedida, com sticks de selfie e directos nas "redes sociais", por via do confinamento e afastamento social. As chaminés morrem de pé.
O post sobre a "rotunda do Lidl" gerou dois tipos de comentários, por e-mail para o blogue e por mention ou mensagem directa no Twitter:
- Pessoas do PCP, que abomina as PPP's, a defenderem as virtudes de uma PPP com o argumento de que não é uma PPP; - Discípulos e escudeiros de João César das Neves a jurarem a pés juntos que há almoços grátis.
Na imagem o prémio Secil para construções em betão armado, no Parque do Bonfim há mais de 30 anos, que é agora usado pelos cartilheiros do PCP de serviço às "redes" como exemplo para justificar a privatização do espaço público por uma câmara comunista, a exemplo do que se faz nos estados Unidos ou no Chile, que Portugal não seria na Europa logo a seguir à revolução de Abril. Outro exemplo a que recorrem é o das paragens de autocarros e as paredes da cidade com propaganda. A coluna vertebral direita é um bem precioso.
O triunfo do capitalismo consumista através da privatização do espaço público pelas mãos de uma autarquia comunista, Câmara Municipal de Setúbal.
São boas todas as explicações sobre esta parceria público-privado, as PPP's que os comunistas abominam desde que seja a pimenta no cu dos outros. Desde a autarquia estar falida e a cadeia de hipermercados pagar a requalificação, alargamento das vias e toda a operação urbanística de um supermercado que assim consegue duplicar a área comercial e triplicar o estacionamento da primeira construção, feita em terrenos de cheia numa alteração cirúrgica ao PDM efectuada por um anterior executivo PS, até à obrigatoriedade de ler No Logo de Naomi Klein, sobre como as marcas e as corporações se insinuam na cousa pública, nas instituições e no espaço público, até ao ponto de definirem políticas e prioridades que deviam caber ao decisor político, eleito em eleições livres e democráticas, para depois fazer uma redacção, como TPC [trabalho para casa], posteriormente lavrada em acta de câmara, truncada ou não pelo espartilho leninista da análise histórica ou por uma qualquer directiva emanada do centralismo democrático, já que isso agora é o que menos interessa, quando o leque, de uma extremidade à outra, cabe todo no mesmo saco. O PS começou, o PCP deu-lhe continuidade e o PSD não desdenha e até é capaz de aparecer a dizer que faria muito melhor.
Viva a rotunda do Lidl, viva! Pim!
[Na imagem a nova rotunda na confluência da avenida de Moçambique com as ruas Cidade Debrecen e Engenheiro Henrique Cabeçadas]
Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Médicos, desde 2017 todos os dias em todos os telejornais em cima do Governo por causa da carga horária e da pediatria e da maca no corredor da urgência e da falta de ligaduras no banco e de palhinhas para o leite no pequeno-almoço dos doentes manetas na ortopedia.
2 - Um senhor do Conselho Disciplinar da Ordem dos Médicos aparece em todos os telejornais em todas as televisões a dizer ser normal um processo levar 6 - seis - 6 anos a ser tratado;
3 - A Ordem dos Médicos chama o obstetra para ser ouvido nos processos movidos, o obstetra ignora a Ordem e continua na sua vidinha como se nada fosse;
4- O bastonário da Ordem dos Médicos aparece em todas as televisões em todos os telejornais com ar cândido a dizer que é o Estado que tem de explicar como é que são feitos os convénios com as clínicas privadas;
E se todas as mal-formações foram mesmo todas detectadas pelo obstetra mas não declaradas por o senhor ser contra o aborto, via interrupção médica da gravidez, contra os seus princípios religiosos, um fundamentalista católico?