"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Metade de 12 mil milhões de euros da troika para a reestruturação do sistema bancário e financeiro, um dos pontos do memorando de entendimento, mandados de volta para a casa de partida por falta de uso pelo Governo da saída "êxito-limpo" e bancos escondidos debaixo do tapete, para não atrapalhar a limpeza da propaganda em campanha eleitoral, que o eleitor é cego por natureza e o bolso do contribuinte um poço sem fundo, por natureza também. E se já nem nas ditaduras sanguinárias africanas amigas para negócios amigos se pode confiar para salvar bancos – o BANIF, salvou-se António Costa vírgula primeiro-ministro vírgula corajoso vírgula a dar a cara por um problema que herdou e a não se esconder atrás do delegado do ministério das Finanças que o Governo PSD/ CDS tinha como Governador no Banco de Portugal [que teima em não colocar o lugar à disposição do novo Governo democraticamente suportado por uma maioria de deputados eleitos em eleições livres e democráticas], como fez o seu antecessor Pedro Passos Coelho vírgula primeiro-pantomineiro vírgula cobarde vírgula, agora confortavelmente refastelado na cadeira de deputado como se não fosse nada com ele. Ele, o seu ex-vice vírgula pantomineiro e a sua ex-ministra das Finanças vírgula expert em contratos swap, todos na sombra da garantia da estabilidade do sistema, exigida com cara de pau pelo pai do povo de direita - Cavaco, O Avisador, a António Costa.
Do Governo que decide antecipar os lucros aos bancos e tem o topete de vir proclamar aos quatro ventos que resolveu o problema dos contratos swap, para depois ver o Supremo Tribunal de Justiça, pela segunda vez, dar razão a quem defendia a sua denúncia e a via judicial, ao Governo que fecha a porta a uma cimeira europeia para a renegociação da dívida que permita a recuperação económica, o crescimento e emprego, o princípio é exactamente o mesmo: garantir lucros e mais-valias aos bancos, alimentar a especulação financeira, esbulhar o bolso do contribuinte, continuar o saque fiscal e desmantelar o Estado em favor de interesses privados, enquanto argumenta o contrário, que é a da salvação do Estado que se trata, da credibilidade restaurada, da recuperação económica que aí vem, da sustentabilidade garantida.
As empresas, que criam emprego e geram riqueza, como dizem o senhor Coelho e o senhor Portas, com grandes sorrisos nas caras e com os escudeiros todos a bater palmas de pé, e que gerem o Estado como se de uma empresa se tratasse, abdicam de defender o interesse público, e o dinheiro das famílias, outro tema caro, e nem sequer actuam como a administração de uma empresa, que querem à força que o Estado seja, em defesa do dinheiro do accionista-contribuinte, antes optando por antecipar o lucro aos bancos, como se o dinheiro da empresa, que querem que o Estado seja, fosse deles. Não é à toa que há sempre um banqueiro disponível para pagar o salário do líder quando o líder está na oposição.
Um povo que elege um penteado com voz para primeiro-ministro; um povo que dá a 3.ª maior votação nas urnas a um partido liderado por um vazio de ideias com uma dentadura reluzente num corte italiano com botões de punho, que depois vai fazer maioria num Governo com um ministro que é doutor sem ter andado à escola; um povo que dá 5 – cinco – 5 maiorias a um homem que se rodeou ao longo do percurso político de individualidades que promoveu, primeiro a ministros, depois a conselheiros de Estado, e que construíram uma rede de influências e usaram o curriculum adquirido ao serviço da cousa pública para fundar uma cosa nostra com o nome de um banco; um povo assim do que é que se queixa, do que é que está à espera? Toda a gente sabe que fato de macaco, jorra e biqueira de aço dá mau aspecto, aspecto de romeno, e não cria riqueza. O que cria riqueza é ser doutor, usar fato, ser bem-falante, ter um belo dum penteado e ir a eleições defender o "supremo interesse nacional", e oferecer de bandeja o saque do Estado a personagens sem rosto, doutores com dentaduras reluzentes em cortes italianos com botões de punho. Never ending story.