"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Foi há 70 anos. A primeira revolta nos territórios ocupados contra o regime do "paraíso na terra". Seguir-se-iam a Hungria em 1956 e a Checoslováquia em 1968. À época a prosápia do actual partido Z foi a mesma que ouvimos hoje, reprodução de propaganda emitida por Moscovo, nazis a soldo dos States, "a intensificação da escalada belicista" e blah-blah-blah.
As fotos da revolta popular na capital do Chile contra o aumento do preço da tarifa de metropolitano na hora de ponta que levou a que o liberal presidente Sebastián Piñera mandasse para as ruas o exército como força repressora, algo que já não acontecia desde os idos do sanguinário Augusto Pinochet, o ditador que chamou os também liberais Chicago Boys a Santiago do Chile.
Os protestos e a revolta pela democracia, liberdade de expressão e direitos humanos, versus a apropriação e manipulação pela rua do logótipo do "circo" da Fórmula 1 [coisa interdita até ao seu criador por um período de 20 anos], uma marca com imagem de marca, e, em princípio, imune e num plano superior a estas disputas.
Uma "campanha" de mestre, ao nível das melhores agências de publicidade e marketing, e que aponta certeira ao coração do higienismo moral ocidental, inventado para esconder a cumplicidade com os regimes ditatoriais e com os atropelos aos direitos humanos por um punhado de euros dólares. Pirataria em estado puro. Nem a Naomi Klein tal coisa ocorreria.
Toda a mulher que não seja virgem não está em “bom estado de conservação” para ser violada? Toda a mulher que tenha sexo forçado (sexo contra o seu consentimento) não é considerado como violação no caso de já não ser virgem? A palavra de uma mulher não-virgem não tem valor em caso de violação?
Não há Primavera nem revolução nem abertura nem Democracia que o valha. É uma questão de cultura. E (do peso da) religião.
As imagens nos telejornais, dos avanços e recuos dos "rebeldes" (mais poesia) na Líbia, em estradas no meio do deserto e em cima de tudo o que tenha rodas e motor, transportam-me sempre para a trilogia Mad Max.
O título podia ser «EUA e Reino Unido abrem cenário de armar Saddam contra Khomeini» ou «EUA e Reino Unido abrem cenário de armar mujahidin contra soviéticos» que ia dar no mesmo:
Os títulos no day after também costumam ser igualmente surpreendentes para alguns e giram sempre à roda de «EUA e Reino Unido levam por tabela em tal parte»
Na mesma semana em que a Líbia é suspensa do Conselho dos Direitos Humanos da ONU a República Islâmica do Irão - do adultério e das condenações à morte por apedrejamento e dos 9 anos como idade mínima para casar - ganha assento na Comissão sobre o Estatuto da Mulher. (Via)
Até há coisa de 15 dias a Nélinha não sabia que Kadhafi, para quem actuou, era um terrorista-ditador-sanguinário… Talvez um petrolino rico e excêntrico, na sua tenda Quechua XXL Air B, comprada num qualquer Decathlon. Quem sabe?
Parece que o probleeeeema é que vem aí o fundamentalismo islâmico quando o probleeeema é que 30 anos de governos de partidos da Internacional Socialista não criaram qualidade de vida às populações de forma a afastar o fundamentalismo. Antes pelo contrário. Oligarquias familiares, saque e corrupção, e a função social do Estado inexistente, e habilmente preenchida por movimentos com o Hamas, o Hezbollah ou a Irmandade Muçulmana. Os fundamentalistas aprenderam mais connosco do que nós com eles. E tudo isto é novidade. E o gozo é mesmo esse: estava toda a gente formatada para apontar o dedo aos partidos comunistas e à cumplicidade com os totalitarismos a Leste e eis senão que... os mencheviques conseguem ser mais perversos que os bolcheviques.
E o supra sumo do cinismo é dizer que a Europa pode ter papel determinante no futuro político dos países árabes e do Magrebe pós-revoluções - igual ao que teve nos últimos 30 anos? - quando o nosso secret wish era termos um novo Adriano. Essa é que era.