"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Logo a seguir à fuga de Assad para Moscovo as televisões mostravam Al-Jolani a ordenar a duas adolescentes, que na rua tinham ido ao seu encontro de sorriso largo na alegria do derrube do regime, que cobrissem o cabelo que levavam ao vento, sendo de imediato obedecido. Ontem, na recepção ao chefe da diplomacia turca em Damasco, Al-Jolani aparece de gravata, aos olhos do fundamentalismo islâmico símbolo do cristianismo e da decadência ocidental. Ou estamos a assistir a uma enorme representação teatral ou alguma coisa mudo mesmo naquelas cabeças...
Vai grande excitação nas redes com a recuperação de umas declarações proferidas em 2017 por Mike Huckabee, à época governador do Arkansas, agora nomeado por Donald Trump embaixador dos EUA em Israel, onde afirma sem artifícios ou subterfúgios que a Cisjordânia não existe, que se recusa a usar essa palavra, que o nome é Judeia e Samaria, que não existem colónias israelitas mas bairros e cidades, no fundo um fanático religioso a citar o Antigo Testamento em Josué 1:4 4 "Desde o deserto e desde este Líbano, até o grande rio, o rio Eufrates, toda a terra dos heteus, e até o grande mar para o poente do sol, será o vosso termo", tal e qual os fundamentalistas do governo de Netanyahu. E perceber isto ajuda a perceber toda esta loucura e insanidade. Como se resolve uma guerra religiosa é a million dollar question.
Pelo menos até à data da impressão do poster que ilustra o post, 1981, a religião era o ópio do povo. Dez anos depois, 1991, a pátria do socialismo desmoronou-se e as coisas ficam um bocado ao "deus-dará", sem ironia, até ao ano de 2006 onde temos um partido comunista a estabelecer relações diplomáticas com uma organização terrorista fundamentalista islâmica, dos inteligentes com trapos enrolados na cabeça, como no poster, um Estado dentro do Estado, com exército próprio, responsável pelo assassinato de um primeiro-ministro do próprio país, um ano antes da embaixada a Beirute. Tudo por causa da "luta contra o imperialismo" 'amaricano', contra o sionismo, e o caralho. Nada mal para quem anda sempre com a boca cheia de constituição, do respeito pela legalidade, pelas instituições e e pelo Estado democrático.
Corria o ano de 135 e Adriano, para pôr fim às revoltas e constante instabilidade na região, depois de ter perdido uma legião, desloca para a Judeia a VI legião, a de Ferro, a XII legião, a Fulminante, e o general Lucio Severo, com um grupo de especialistas em guerrilha urbana vindos da Bretanha. Foram massacrados 580 mil judeus, cidades e templos arrasados, milhares de judeus escravizados, a cabeça de bar Kosba cortada e exibida como troféu, e a região rebaptizada de Síria Palestina. "Oitenta mil romanos invadiram Betar, e assassinaram os homens, mulheres e crianças, até correr sangue das soleiras e valetas". Nascia o judaísmo como condição religiosa e cultura, acabava a condição política.
Na apresentação do plano para controlar militarmente o "corredor de Filadélfia" Netanyahu recorre a um mapa onde a Cisjordânia já não aparece assinalada, é tudo Israel, só já ali resta Gaza a incomodar e atrapalhar. Netanyahu e os fundamentalistas religiosos e de extrema-direita com quem está coligado no governo vão "corrigir" a história e repetir na "terra prometida" com os palestinianos o que Adriano lhes fez há quase 1900 anos. E ninguém quer saber.
Atormentado pelo gozo e pela culpa, o Presidente chega a ir a Fátima de 15 em 15 dias para rezar. As sondagens menos positivas voltam a mergulhá-lo na solidão [...].
Todas as manigâncias são possíveis, todas as intrigas e jogadas de bastidores são admissíveis, todas as mentiras e meias verdades são ética e moralmente aceitáveis, porque a seguir estamos perante Deus para o perdão, saímos como novos, voltamos às manigâncias, às intrigas e às jogadas de bastidores, às mentiras e às meias verdades, assim sucessivamente num eterno retorno. O Presidente beato católico, do recalcamento da culpa, que obedece à Igreja e responde a Deus, em vez de à Constituição e ao povo, de quem só quer massagens no ego. Temos o que merecemos.
[Na imagem a primeira página da revista do Expresso]
"O uso de desinformação, provocando medo nos fiéis – naquilo que um investigador designa de conspiritualidade”, a associação de teorias de conspiração e espiritualidade – e a aliança com políticos bolsonaristas marcou campanha política do Chega e do ADN."
Gajos que escolhem o Natal e a Páscoa para cometerem atentados terroristas querem uma pausa na guerra durante o Ramadão. Não há solução política para guerras religiosas com mais de 2000 anos.
Jesus porém dizia: "Pai, perdoa-lhes, que não sabem o que fazem!" Eles dividiram entre si a roupa de Jesus, depois de terem deitado sortes. Lucas 23:34
Uma mesquita, a de Al-Aqsa, situada num monte, o Monte do Templo, o Templo de Salomão, numa Judeia renomeada Palestina depois de Adriano ter ordenado o massacre de toda a população e o desaparecimento do mapa de cidades, vilas e aldeias. O resto, até chegarmos aqui, vem na Bíblia, no Antigo Testamento. Pode um problema religioso ter solução política?
Pelas reportagens das televisões vemos as pessoas nas ruas de Marrocos no meio da aflição, da dor, do desespero, com Insha'Allah na boca e não com o Allahu Akbar que se ouve noutras partes. Isto vale o que vale mas vale muito.
Nós, na nossa santa ignorância, pensávamos que a Jornada Mundial da Juventude significava debates, encontros, conferências, simpósios, palestras com direito a interpelações, etc, etc, conclusões, ideias, caminhos a apontar. Afinal o Papa, que às vezes é o Santo Padre e outras Sua Santidade, chega, diz meia dúzia de coisas que alguém com boa formação familiar e humanista ouve em casa desde que nasceu, respeitar o próximo, não discriminar, não olhar de cima, incluir, coise e tal - a angústia de Francisco ao constatar a igreja que herdou para ter de lhe dizer o óbvio, recebe quem muito bem entende receber sem dar cavaco a ninguém nem justificar opções, prontamente interpretados os sinais pelas pitonisas papais, que, pasme-se, são mais que os comentadores de futebol - o Papa quis dizer isto, o Papa quis dizer aquilo [se o quis dizer porque é que não o disse logo preto no branco e deixou a interpretação a cargo de terceiros?], e um grupo de patetas, denominados "jovens", faz barulho para as televisões, excursionistas que na novilíngua equivale a "peregrinos". A ideia de jovem e juventude que a ICAR tem é afinal a mesma desde que Pedro que, ao contrário do Papa ainda não era santo, pisou as ruas de Roma: os velhos falam e os jovens abanam o rabo com a língua de fora e vão encarneirados tomar o "corpo do Senhor". Amém.
Depois do relambório que foram os milhões do contribuinte despejados em cima do Papa, que não queria que despejassem dinheiro em cima dele, isso era coisa dos mortais, que também não sabiam que o dinheiro que iam despejar era assim tanto, e mais o palco que o Papa também não queria tamanho dum filme do William Wyler, isso era coisa dos mortais, que também não sabiam que o palco era tamanho dum filme do William Wyler, caso contrário nem tinham planeado outro, no Parque, tamanho do Quo Vadis, onde o Pedro, que ainda não era santo, fez um comício à luz da tocha dentro dum buraco aproveitando a inclinação do terreno.
E assim, à medida que o dinheiro que o Estado laico vai "investir" no picnicão da Igreja católica ia caindo nos telejornais, o ouvido do povo foi-se habituando à melodia, como aquelas músicas que não valem a ponta de um báculo mas que à força de serem passadas na rádio vão vendendo e chegam ao primeiro lugar do top. E depois nem eram tantos milhões assim quanto isso que os gajos são de boas contas com o dinheiro que não é deles e corrigiram prontamente e agora são poucos milhões assim quanto isso, e os palcos já não são tão grandes assim, são um cadinho menos tão grandes assim, e o da beira-rio vai servir para o Moedas trazer o Coachella e o Glastonbury e o caralho para Lisboa, vocês vão ver, ele até foi falar com os comerciantes da zona para manterem o comércio aberto, disse na televisão, não pode dizer que não disse, está gravado, porque os atrasados nem sabiam que podiam ganhar numa semana o que habitualmente ganham em dois meses, agradeçam ao Moedas esta lição de economia e empreendedorismo.
E no meio do barulho das luzes o "morreram todos" fez um telejornal em cima do palco, inaugurou-o, #ChupaFrancisco, e ninguém já repara nem no preço da alcatifa, apesar de assim a coisa estar ao contrário, o tal de sofrer na vida terrena para ganhar o Reino dos Céus, onde não há cardos nem picos, não é preciso a tal da alcatifa que está no palco, agora quero ver a cara do padre com a ladainha do sofrimento depois do chão alcatifado.
Nem ninguém repara na única limpeza a que a câmara de Lisboa meteu mãos à obra desde que o camarada Moedas foi eleito presidente, a dos sem-abrigo da Avenida, ainda assim o senhor Francisco a meio da celebração fosse desatar a cantar "webaba silale maweni, webaba silale maweni, homeless, homeless, moonlight sleeping on a midnight lake, homeless, homeless" do Paul Simon perante o horizonte visual poluído até à Praça do Comércio, aqueles homeless onde o Marcelo vai com as televisões atrás entregar sopa e dizer boa-noite, calado que nem um rato, o Marcelo, beato.
Nem ninguém repara na mudança de nome do Alto do Parque para Colina do Encontro, estou mesmo a ver num futuro próximo, entram num táxi "leve-me à Colina do Encontro" e o taxista a olhar de lado "quem é este pacóvio?" .
Como dizia o Mateus em 19:16 "É mais fácil um camelo passar por o buraco duma agulha que um rico". Os camelos somos nós, apesar do dinheiro dos ricos ser nosso.