"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Criar mais uma classe de políticos, intermediários entre o poder central e as populações, seguida de toda uma nova casta de burocratas, de profissionais da política e de clientelas políticas e partidárias. Faz todo o sentido e é mesmo disso que o país está a precisar.
Na caça aos dotes de Clóris e Nise, curiosa a bicada dada por Gil Vaz em Fuas, que é como quem diz, a farpa do Correio da Manhã, em editorial, no "rival" Jornal de Notícias, na guerra pela conquista do nicho de mercado.
Ficamos todos a saber que, para o Correio da Manhã, há nichos de mercado, o do crime, do populismo, e o da fixação psicótica em determinados políticos, mais nobres que outros nichos, o da futebolite-regionaleira, inevitavelmente com sotaque.
E ainda mais curioso é a bicada vir quando o Jornal de Notícias abdica, por vontade própria, de ser um jornal de dimensão nacional para passar a ser um jornal regional com tiragem nacional.
Ao invés de responder que nem no Porto nem em Vila Nova de Gaia nem em outra cidade qualquer, a bem do rejuvenescimento e da transparência democrática, uma vez que já ocupa o lugar de presidente da Câmara desde 1997, que já anda na política desde os idos do PREC, e que já vai sendo mais que tempo de ceder o lugar a outra gente com outras ideias e outras visões para a cidade, para a região e para o país, interrogado se poderia ser ele o próximo a ocupar a cadeira do poder no Porto, Menezes escusou-se a comentar.
Agora que Miguel Relvas decretou o fim da RTP ilhas o deputado independente Carlos Abreu Amorim vai sair à rua a gritar contra o centralismo de Lisboa ou vai esperar pelo fim da RTP Porto para se decidir?
[Imagem do jornal Record de 10 de Setembro de 1992, finalíssima da Supertaça entre Benfica e Fóculporto]
Regionalites futeboleiras à parte, confesso não conseguir perceber o “affair” Porto-Vigo. O contribuinte português paga uma ligação ferroviária, que dá um prejuízo mensal de €19. 600, sem que se perceba se serve para os espanhóis entrarem no país ou para os portugueses fugirem para Espanha. Aparentemente as duas hipóteses são válidas, se bem que a que nos possa favorecer economicamente [a entrada de espanhóis] só seja válida durante os meses de Verão, uma vez que a Renfe só suporta os custos até ao final de Setembro…
O “affair” Porto-Vigo, e até prova em contrário, é um pouco como as portagens nas SCUT que são boas [por omissão, uma vez que não se ouve uma única voz de protesto do lado de cá da fronteira] na Galiza, e más, muito más, no Norte de Portugal [pela unanimidade de protestos que conseguiram gerar desde Aveiro a La Coruña].
Adenda: quando escrevia o post, o Word corrigiu-me "Porto-Vigo" para "Morto-vivo". Faz sentido.
Os defensores da redução do número de deputados e da reforma administrativa do território pela redução do número de concelhos e freguesias, tudo em nome da racionalização de meios e da e eficiência e optimização de resultados, são os defensores da criação de uma estrutura administrativa [e de poder] intermédia, com uma classe política intermédia e mais as suas respectivas clientelas, também em nome da eficiência e optimização, e a que dão o nome pomposo de “regionalização”.
Meia dúzia de maduros (não é preciso mais) sai nas respectivas viaturas para a auto-estrada, em marcha lenta - de preferência nas entradas/ saídas dos grandes centros urbanos - e com a mão em cima do cláxon. Os outros, os milhares que anseiam por chegar a casa, ao trabalho, buscar os filhos à escola, or ever, desesperados com a lentidão do trânsito e a ver a vidinha a andar para trás, começam a stressar e desatam a buzinar como forma de escape. Está feito o maior buzinão da história, em protesto contra a introdução de portagens nas SCUT. Mais fácil que limpar o rabo a meninos.
Adenda: os jornais, isentos e descomprometidos destas coisas do regionalismo-futeboleiro, informam as horas e os locais das concentrações. È aproveitar a info e não passar por lá.
“Subtilmente” elimina-se o Governo Civil, coisa que ninguém sabe para que o serve, mas que toda a gente sabe a quem serve, e passa-se a ideia de que “somos” todos muito simplex e racionais na gestão do erário e da cousa pública. Mas depois “ficamos” com um problema (um graaaaande problema) em mãos, e, “subtilmente”…
Em Novembro de 1998 o PSD de Marcelo Rebelo de Sousa “obrigou” o PS de António Guterres a levar a regionalização a referendo. Ganhou o “Não”. Mandam as regras da Democracia e o bom senso que, qualquer futura decisão, passe obrigatoriamente por um novo referendo. Já assim foi com a Interrupção Voluntária da Gravidez. O bom senso e as regras da Democracia, não o chico-espertismo de querer fazer passar a regionalização pela porta do cavalo com a criação de regiões-piloto. E depois da região-piloto estar há éne de anos a “pilotar”, e supondo que há novo referendo e volta a ganhar o “Não”, é suposto fazer-se o quê; acabar com a região?
(Imagem de autor desconhecido)
Post-scriptum: O que é que têm sido até hoje a Madeira e os Açores, se não exemplos de regiões-piloto? Compreendo que sejam exemplos, principalmente no caso da Madeira - e até para o PSD longe do folclore Chão da Lagoa -, que não interessem trazer a debate…
«Nas últimas duas décadas, o país seguiu por caminhos divergentes. Em 2004, “Lisboa” (Lisboa e a Península de Setúbal) exibia um PIB per capita acima da média europeia (105, 8%); o Norte (os distritos acima do Douro) só chegava a metade (58, 8%). O Norte é hoje equivalente ao Sul italiano ou ao Leste alemão»
Muito bonito o raciocínio do historiador Rui Ramos no Expresso (sem link), não fora a manipulação, por via da omissão, dos factos uma “pequenina” falha na interpretação das aspirações autonómicas do “povo” do Norte, o que quer que isso signifique: Quer o Norte de Itália, quer a Catalunha, quer a Flandres quer mesmo a antiga Checoslováquia, com a separação entre a República Checa e a Eslováquia, querem/quiseram mais autonomia, e até a independência, pelo facto de serem as regiões mais ricas e desenvolvidas dos respectivos países. Ora se o “Norte” está a metade da média europeia, qual é o factor “invisível” nesta reivindicação regionaleira a cavalo do futebol? O leitor que tire as suas conclusões.
Nos anos 80, do encerramento de fábricas, do desemprego, da fome na Península de Setúbal, quando povo saiu para a rua com bandeiras negras numa tentativa de chamar a atenção para o fosso crescente entre os cada vez mais ricos e os cada vez mais pobres, no “Norte”, no Vale do Ave, o “povo do Norte” que sofria o mesmo flagelo na carne, entrevistado na rua dizia, com um encolher de ombros na abertura dos telejornais ,que o patrão - que tinha 10 Ferraris na garagem mas não pagava os salários ia fazer uma ano -, era um coitadinho vitima da crise e que não podia fazer nada e que o Estado isto e que o Governo aquilo. Povo do Norte. Povo do quê?
(Na imagem do filme Who Are You, Polly Maggoo, William Klein, 1966)
Colocando a questão ao nível do regionalismo-futeboleiro – dividir e acirrar ânimos para reinar – e recorrendo da terminologia tão ao gosto do Goebbels das Antas – que não tem adversários mas inimigos –, é o Sporting de Braga e não o SL Benfica o grande “inimigo” do FC Porto, é a cidade de Braga e não Lisboa, a verdadeira “ameaça” à cidade do Porto, é lá que se encontra o mítico espírito das “gentes do Norte” e do seu empreendedorismo, o que quer que isso signifique. E o Norte não cabe todo dentro do Porto – Praise the Lord! E tudo isto já Salazar o havia percebido quando abençoou a construção do segundo Estádio Nacional na cidade dos Arcebispos. Eu também gostava que o Sporting de Braga tivesse sido campeão. A sério.
Adenda: Palhaço, adj. (do it. Pagliaccio). || Cómico, burlesco. S. m. Artista de circo, que diverte o público com habilidades, anedotas, etc. || Pessoa que por actos ou palavras faz rir os outros, falando-se especialmente de quem tem a pretensão de ser engraçado.
Palhaçada, s. f. Acção, dito ou gesto de palhaço. || Cena cómica, burlesca.
In Grande Dicionário da Língua Portuguesa, coordenação de José Pedro Machado, Círculo de Leitores, Lisboa 1991.