"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Um sistema judicial que permite que um advogado transite directamente do gabinete jurídico de uma televisão tablóide, líder de audiências nas notícias sobre uma rede de pedofilia, para a defesa de um dos arguidos no processo; um sistema judicial que permite que durante 6 – seis – 6 longos anos advogados de defesa empastelem um processo e um julgamento invocando todas as questões imaginárias e aquelas que estão para além da imaginação; um sistema judicial que permite que um processo possa ter 900 – novecentas – 900 testemunhas, é o mesmo sistema judicial que tem de se explicar perante a opinião pública, contra o risco de criar dano na imagem que a opinião pública tem da Justiça, por causa de um erro informático que deu azo a que o acórdão do julgamento seja entregue com uma semana de atraso em relação ao previsto. Qual foi a parte que eu não percebi?!
O problema é ser tudo muito pequeno - e nem estou a referir a dimensão fisica - uma proximidade (ia escrever promiscuidade mas arrependi-me) muito grande entre poder político, poder judicial e jornalistas (basta ver o tratamento de excepção que os agora condenados, e nomeadamente Carlos Cruz, tiveram nos media enquanto durou o processo,comparativamente com as vítimas), que não permite olhar e ao mesmo tempo manter uma distância de segurança e a necessária independência.
Ao contrário do que se diz por aí, e bastava estar minimamente atento às conversas cruzadas na rua, nos cafés ou nos transportes públicos, a surpresa foi o ter havido culpados e condenados. O resto, e voltando ao início, é conversa do sítio onde tudo é muito pequeno.
Comparativamente com as vítimas e os outros arguidos, é incrível o tempo de antena que o senhor Carlos Cruz tem nos jornais, nas rádios e nas televisões, todos os dias e a todas as horas.
É imaginar o que seria o mesmo lobby a mesma pressão com um líder dum partido ou um primeiro-ministro, por exemplo, numa qualquer outra situação. Haja respeito.
Ouvi no telejornal António Serra Lopes, o advogado de Carlos Cruz no Processo Casa Pia, dizer que nunca haverá uma decisão do colectivo de juízes antes do fiinaldo Verão, porque a leitura do acórdão pode coincidir com o período eleitoral que se avizinha.
Senhor causídico, importa-se de repetir? O que é que uma coisa tem a ver com a outra? É que sempre me foi ensinado que em Portugal havia separação de poderes…
O PS de Ferro, Pedroso & Ana Gomes, à época, não incomodava ninguém. E de tanto não incomodar até se atrapalhava a si próprio. Barroso dá de frosques para Bruxelas e Ferro dá de frosques do PS zangado com Sampaio pela opção Santana Lopes. Que foi o que se viu e que proporcionou ao PS a primeira maioria absoluta da sua história, com Sócrates a liderar, depois de ter ganho o partido com uma goleada à antiga.
E por demais óbvio que quem beneficiou da suposta decapitação politica do PS foi… o PS de Sócrates.
Era (é) aqui que Ana Gomes quer chegar?
(Na foto roubada no New York Times, Estaline, o mestre da Teoria da Conspiração, retocando, retocando, retocando o negativo, até ficar sozinho…)
Sempre quis acreditar – e atenção que escrevi “quis”, não escrevi “acreditei” – que a Justiça em Portugal era justa. Que não havia uma Justiça para os “ricos e poderosos” e outra para a restante “maralha”. Ontem esta minha convicção sofreu um sério rombo no casco.
Comecemos pelos “ricos”:
“A lei do tabaco não vai, afinal, ser seguida de igual modo por todos. Os casinos vão ter que aplicá-la, mas com uma alteração importante: combinando-a com a lei do jogo, o que significa com regras mais flexíveis. A decisão foi ontem tomada em reunião do grupo técnico consultivo da Direcção-Geral de Saúde. A associação dos casinos saiu satisfeita.” (Público hoje).
Só um pequeno aparte de um cidadão anónimo não-formado em Direito: desde quando, e com que autoridade, uma Direcção-Geral de Saúde (!) dá pareceres técnicos (!!!) sobre uma Lei da República aprovada em assembleia própria?!
Passemos aos “poderosos”:
Paulo Pedroso moveu um processo cível contra o Estado português, pedindo uma indemnização de 600 mil euros por ter permanecido preso cinco meses no âmbito do Processo Casa Pia, acabando por não ter sido pronunciado. Na primeira sessão que decorreu à porta fechada por decisão do juiz, depôs como testemunha de Pedroso, António Costa. Seguem-se o ministro do Trabalho Vieira da Silva, e os deputados Vera Jardim e Mota Amaral.
“Sobre o facto de o julgamento decorrer à porta fechada, Celso Cruzeiro (advogado de Pedroso) assegurou que o pedido não foi dele, explicando que o processo cível em geral é público” (Público hoje).