"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Temos Marcelo, o que aparecia todos os dias a todas as horas em todas as televisões a comentar assuntos de todos os ministérios. As pessoas nem sabiam quem era o ministro mas lá estava o Marcelo a largar postas sobre matérias que não eram da competência do Presidente. Temos Marcelo, que convoca Conselhos de Estado por tudo e por mais um par de botas, alguns com a ideia implícita de pressionar a oposição, outros com o fim de pressionar o Governo, como se o Conselho de Estado fosse uma segunda câmara do Parlamento. Temos Marcelo, o que não se inibe de publicamente pedir a demissão de ministros em situações em que o ministro nem sequer foi tido nem achado, nem pouco mais ou menos, como se o Governo respondesse perante o Presidente e não perante a Assembleia da República. Temos Marcelo, o que dissolve governos com maioria parlamentar por causa de um chumbo orçamental exacerbando as suas competências constitucionais. E temos o Donaltim de Marcelo que no jornal do militante n.º 1 do partido de Marcelo e na FOX News do partido de Marcelo - SIC Notícias, aparece com a maior cara de sonsa preocupada com "Gouveia e Melo a entrar no palácio de Belém com o país sem um Orçamento aprovado. O que fará? Forçará um novo OE? E se Montenegro e Pedro Nuno não se entenderem, obrigará o líder da AD a sentar-se com Ventura ou demitirá o Governo sem eleições? Voltaremos aos governos de iniciativa presidencial?". O título do post esteve quase para ser "Não ter a puta da vergonha na cara é isto".
Marcelo a sair de um evento com o braço por cima da beata Maria de Belém recusa comentar a alegada candidatura do almirante à Presidência. Melhor imagem da miséria a que chegámos nestes 50 anos de democracia não podia haver. O pior do PS de braço dado com o pior do PSD, que podia muito bem ser o melhor da União Nacional. 40 anos depois temos os militares de regresso à vida política activa. E também foi para isto que se fez o 25 de Abril.
O Correio da Manha [sem til] dá conta que "Luís Capela perdeu a carpintaria nos incêndios. Vítimas ainda não foram ressarcidas do prejuízos nem sabem quando o serão". Alguém, que não os próprios, ainda se lembra disto? E foi só em Setembro... Mas agora Marcelo vai aparecer todos os dias nos telejornais a falar sobre o assunto e vai amiúde visitar os locais como forma de pressionar o Governo. Ou não. E nem é pelo Presidente durante um Governo PS e o Presidente com um Governo da sua cor política, é pela velhacaria para com as populações, usadas sem pudor como armas de arremesso político.
A morte de uma grávida a caminho do hospital numa ambulância motivou a queda de uma ministra, depois de dezenas de horas com directos nas televisões e intermináveis comentários de especialistas - do palerma Ferrão ao chalupa Zé Gomes passando pela picareta falante mano Costa, sobre a degradação do Serviço Nacional de Saúde, o caos nos hospitais e o caralho. Isso foi antes do dia 21 de Março de 2024. Depois foi-se embora a irresponsabilidade socialista e veio o "sentido de Estado" AD. Agora morrem seis pessoas à espera de uma ambulância no espaço de uma semana e é o Amorim no Manchester, o dilúvio universal em Valência, interrompido pela goleada dos lagartos ao City, é as eleições na América e o regresso do homem cor-de-laranja. Montenegro, agora alçado ao poder, diz que "não temos a certeza de que as mortes foram causadas por falta de assistência", ele que na oposição tinha a certeza de tudo e de mais alguma coisa e até em três meses ia resolver a coisa de que tinha a certeza. Marcelo II, de cognome O Velhaco, na FOX News, também conhecida por SIC Notícias, para os pés de microfone, escolhidos a dedo pelo menor coeficiente de inteligência para desempenharem a função de jornalista, sai-se com um "eu não gosto de falar de problemas específicos da governação" . A puta da lata! Ou não ter a puta da vergonha na cara é isto. Só morreram seis pessoas à espera de uma ambulância, "qual é a pressa?", como diria o outro que agora se olha ao espelho e se vê com cara de Presidente . Ainda se fosse um badameco qualquer à sopapada dentro do ministério do Galamba na ausência do ministro, aí o caso já piava mais fino e motivava uma saída do velhaco para comunicar um ralhete ao Governo na abertura do telejornal. Isto não é a morte de seis cidadãos, isto é a morte da decência. Da decência em política e da decência em jornalismo.
Em vez da gestão do silêncio e do soft power fazer barulho, muito barulho, de forma a que parecendo estar a ajudar entalar o Partido Socialista no affair Orçamento do Estado. Marcelo Rebelo de Sonso. Parabéns a quem cunhou o nome.
Não, o problema não é o desaparecimento dos ministros e ministras deste Governo com a sua incompetência escondida atrás de silêncios ensurdecedores, não. O problema é o eclipse do sonso fala-barato que se senta na cadeira de Presidente, de emplastro dos ministros e do Governo de António Costa a homem invisível com a língua comida pelo gato. Não é Presidente de todos os portugueses, é Presidente da cúpula do partido a que pertence.
Em comunicação ao país, com Marcelo ao lado e com o olho no eleitorado do taberneiro, na campanha eleitoral permanente em que se empenharam desde o dia da tomada de posse, Luís Montenegro que há interesses nos incêndios, que quer pulso firme nos incendiários, e até vai falar com a Procuradoria. Vai falar com a Procuradoria. Com Marcelo ao lado. Às malvas a separação de poderes. Imaginem o Montenegro, os minions da direita radical de plantão às redes, os palermas na coluna Opinião no Observador, se fosse um governo "socialista".
Capicua, um dia em Belém a dizer merdas a convite de Marcelo, no dia a seguir na Festa do Avante! a dizer merdas a convite do comité central, quando podia ter ficado para a história como uma gaja que dizia coisas.
Ainda sou do tempo em que os músicos e os artistas tinham princípios. O deslumbramento, a doença infantil do protesto.
O nome de Leonor Beleza é chutado para cima da mesa das presidenciais e ninguém se lembrou de ir ouvir a Associação Portuguesa dos Hemofílicos. Como dizia o outro, "há muita fraca memória na política".
O ministério das polícias é assaltado e o segurança, de uma empresa privada, não dá por nada. O ministério das polícias tem segurança privada. E tudo isto é normal porque, como dizia o outro, "há Estado a mais na vida das pessoas" e se calhar também dentro do Estado, e outro, amigo dele, remata "o liberalismo faz falta".
Pior que Marques Mendes ser aventado para candidato a Presidente da República é Marques Mendes ele próprio se achar candidato a Presidente.
Os 2,7% de crescimento económico que com António Costa eram "poucochinho", e os 2% de Luís Montenegro, a herdar de António Costa, que "não há disto na Europa". Ainda não disse se dissolve o Parlamento no caso do chumbo do Orçamento do Estado.
Há muito, muito tempo, mais precisamente em 2023, Frederico Pinheiro, exonerado do cargo de adjunto do ministro das Infra-estruturas, agrediu duas mulheres no ministério, atirou a bicicleta contra o vidro da fachada do ministério, abriu bué telejornais, não menos primeiras páginas de jornais, motivou uma comissão par[a]lamentar de inquérito, uma rebaldaria sem rei nem roque do Governo socialista.
Há bocado, João Soalheiro, director do Património Cultural, atirou cadeiras pelo ar, exerceu bullying sobre os trabalhadores colaboradores, e os telejornais foram em directo para Marienfeld saber do estado de espírito do Ró náldo, as primeiras páginas foram sobre as lágrimas do CR7, o sofrimento da sua excelentíssima mãe e o sofrimento das não menos excelentíssimas irmãs.
Do Governo "propaganda em movimento" temos Luís Montenegro a chegar à Figueira da Foz, recebido por um Santana Lopes, marreco e com cara de defunto, a propósito do naufrágio de um barco de pesca, mimetizando Marcelo, mais rápido que o INEM, a chegar à queda de um bimotor no telhado de um hipermercado em Tires. Todos os votos contam nas eleições daqui a 6 meses.
Os baptizados "inimigos do povo", pelo líder do partido da taberna, continuam alegremente a representar o papel de "inimigos do povo".
Numa fuga ao segredo de justiça, onde o Correio da Manha [sem til] não foi tido nem achado, um parágrafo vem a público no dia 7 de Novembro de 2023 entre as dez e meia da manhã, hora da saída de António Costa, primeiro-ministro, da audiência com o Presidente da República, e o meio-dia e vinte, hora da saída de Lucília Gago, Procuradora-Geral da República, 50 minutos depois de ter entrado para falar com Marcelo, e faz cair um Governo de maioria absoluta.
Duas gémeas próximas do doutor Nuno, com cunha do doutor Nuno, despachadas pelo pai do doutor Nuno para a Casa Civil da Presidência do pai do doutor Nuno, constituem um ex -secretário de Estado arguido por abuso de poder, e alvo de buscas cinco anos depois do caso e passados 3 meses depois de ter vindo a público, a três dias de umas eleições para o Parlamento Europeu, perante a inocência do doutor Nuno, a inimputabilidade do pai do doutor Nuno, e a Casa Civil do pai do doutor Nuno que só faz aquilo que lhe mandam fazer.
Atormentado pelo gozo e pela culpa, o Presidente chega a ir a Fátima de 15 em 15 dias para rezar. As sondagens menos positivas voltam a mergulhá-lo na solidão [...].
Todas as manigâncias são possíveis, todas as intrigas e jogadas de bastidores são admissíveis, todas as mentiras e meias verdades são ética e moralmente aceitáveis, porque a seguir estamos perante Deus para o perdão, saímos como novos, voltamos às manigâncias, às intrigas e às jogadas de bastidores, às mentiras e às meias verdades, assim sucessivamente num eterno retorno. O Presidente beato católico, do recalcamento da culpa, que obedece à Igreja e responde a Deus, em vez de à Constituição e ao povo, de quem só quer massagens no ego. Temos o que merecemos.
[Na imagem a primeira página da revista do Expresso]