"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
A Comissão Europeia, que foi contra o aumento do Salário Mínimo Nacional, tem saudades do Governo da direita radical e da reforma que Passos Coelho lamentou ter deixado por fazer - baixar os custos do trabalho, e insinua que Portugal deve ir mais longe na facilitação dos despedimentos e na precariedade.
No tsunami que vai ser a integração de milhares de precários a recibo verde nos quadros do Estado, vão vir também, mesmo na crista da onda, os recibos verde-cunha do amiguismo e do cartão do partido que, de outra forma, nunca teriam entrada na administração pública. Vai ser um fartar vilanagem para a clientela político-partidária, de todos os partidos sem excepção, com o maior impacto a ser sentido e absorvido pelas Câmaras Municipais e a legião de assessores, técnicos e licenciados de todas as áreas. É a sorte grande, a lotaria do Natal, a taluda, o El Gordo, o Euromilhões em jackpot, com Joker e tudo.
Com o argumento de que "não há pior precariedade do que estar desempregado" [ouvi agora o sósia do Danny Kaye que, sem piada e sem dançar, chefia a bancada do PSD na Assembleia da República, dizê-lo no debate parlamentar], "o Governo que não tem um modelo de salários baixos e de desemprego para o país" fomenta a precariedade, o trabalho temporário e os baixos salários, enquanto aumenta as mais-valias aos patrões e accionistas com a descapitalização da Segurança Social que paga o salário aos empregados temporários nas empresas e ainda apoia a implantação da caridadezinha no terreno, via IPSS’s, maioritariamente apêndices da igreja católica, já subsidiadas com o dinheiro dos contribuintes e que ainda recebem os "voluntários", ex-desempregados, agora "colaboradores" pagos com... o dinheiro dos contribuintes.
Mas como é "preciso aliviar o peso do Estado na economia", dizia o senhor Coelho antes de se alçar ao poder, e porque "não é o Estado que cria emprego" mas porque "o emprego só virá da retoma económica", disse o senhor Coelho, já primeiro-ministro, numa comunicação de Natal ao pagode, há ainda que "limar algumas arestas", diz a dona Ana Vieira da Confederação do Comércio, neste acordo de concertação social, assinado pela UGT e onde, curiosamente, o secretário-geral Carlos Silva não aparece a dar o bigode ao manifesto e às câmaras, se calhar ainda a digerir o António Costa do passado fim-de-semana no congresso do PS, e as arestas todas limadinhas e com os rebordos boleados era os trabalhadores a trabalharem para as empresas os colaboradores a colaborarem com as empresas com a colaboração da Segurança Social com o salário pago na totalidade pela Segurança Social, que está descapitalizada e precisa de reforma e de consenso para a reforma, diz o Governo, todo, e o Presidente do Governo, no palácio que é da República.
E a prova provada de as empresas ultrapassaram as dificuldades, recuperaram e estão a responder aos desafios, de que a economia está aí, em modo milagre, e de que "chegou o momento do investimento" é que uma medida temporária, como era a suspensão dos feriados, pode até ser antecipada, diz agora o vice-pantomineiro, em modo barata tonta, à procura de uma nova vocação para o partido do contribuinte-pensionistas-ex-combatentes-lavoura-famílias-numerosas, a adivinhar o que lhe vai acontecer nas próximas legislativas. Viva!