"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
No Prós e Contras, o programa mais imbecil da história da televisão portuguesa, na RTP, a televisão pública, apresentado por uma jornalista sem saber ler nem escrever, com apartes e comentários recusados pela produção dos Simpsons para a voz de Homer, esta semana sobre a Autoeuropa, a greve, e a "força sindical por trás" [sic] - trabalho interessante a fazer pela concorrência da televisão pública seria reportagem na Alemanha sobre o que um alemão anónimo pensa de uma televisão que gasta uma noite de segunda-feira a organizar debate sobre uma greve, um trabalhador colaborador da Autoeuropa apontou como "o inimigo" a administração da empresa que lhe dá o emprego e lhe paga o salário que lhe permite pagar as contas. A seguir veio outro senhor queixar-se dos horários e ritmos infernais de trabalho impostos pela administração. Estamos entregues à bicharada.
Alexandra Leitão, secretária de Estado da Educação, desmonta a posição da direita radical nos contratos de associação recorrendo a um texto enviado ao Tribunal de Contas pelo Ministério da Educação do Governo da direita radical – PSD/ CDS.
E chegámos aqui: juro que ouvi Rodrigo Queiroz e Melo, director executivo da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo, dizer no programas Prós e Contras na RTP 1 que "o Estado cometeu a ilegalidade" [sic] de construir escolas públicas onde já havia colégios privados. E, quando aqui chegamos, já não há mais nada para discutir ou debater.
"Em Portugal tiram-se selfies na praia, na Grécia tiram-se selfies na fila do multibanco, é essa a diferença entre Portual e a Grécia", Miguel Pires da Silva, líder da Juventude Popular, a jota do CDS, no Prós e Contras na RTP 1.
Juro que vi e ouvi no Prós e Contras da RTP 1 um meritíssimo senhor doutro juiz, Ricardo Cardoso de baptismo, dizer que há violação do segredo de justiça porque a empregada doméstica do arguido buscado em casa que vê o mandato nas mãos da polícia e desata a telefonar para tudo o que é jornais, televisões e jornalistas. Não esclareceu os casos em que o arguido buscado em casa não tem empregada doméstica e o segredo de justiça também é violado. Se calhar é a sogra do arguido. Ou a vizinha que todos os portugueses têm, bisbilhoteira, sempre a espreitar pelo ralo da porta. Ou assim.
Jorge Reis Novais, Professor Associado do Instituto de Ciências Jurídico-Políticas da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa dá, na televisão pública e em horário nobre, uma aula de Direito Constitucional e Direitos Fundamentais ao deputado do CDS/PP João Almeida e ao aprendiz de feiticeiro Ricardo Arroja. Se lhes foi proveitosa ou se lhes ficou alguma coisa dentro das cabecinhas ocas são contas de outro rosário.
O contexto europeu, o choque assimétrico, o Banco Central Europeu, o impacto da recessão espanhola, a União Europeia e o Euro. O Governo da Maioria do Presidente é qualquer coisa vítima das circunstâncias. Eu, eu e eu. Me, myself and i. Um umbigo tamanho da Fossa das Marianas.
"O economista fantástico que o senhor é", Fátima Campos Ferreira, a jornalista fantástica, dixit.
Ouvir umas bestas, e estou a ser minimamente educado, que não deram em alcoólicos apesar de crescidos e educados e formados num país de tabernas de portas abertas, defender, num programa de televisão, ao vivo e em directo, o fechar de portas das smartshops porque os filhinhos podem cair no mundo da droga e da toxicodependência. Se isto não é a assumpção da sua total falência enquanto pais e educadores…
Juro que ouvi ontem o ministro da Defesa José Pedro Aguiar-Branco, no Prós e Contras no canal 1 da RTP, com a mesma convicção com que defendia as 5 – cinco – 5 linhas de TGV de Manuela Ferreira Leite, acusar Luís Fazenda do Bloco de Esquerda de ser co-responsável pela construção de uma linha de TGV que levou o país à ruína. Isto depois de, no mesmo dia e no Parlamento, as Parcerias Público Privadas terem passado, num click e por artes mágicas, a ser boas para os cofres do Estado e negativas para os privados. É obra.
Como grita a palavra de ordem nas manifs, "está na hora, está na hora do Governo ir embora".
E a net que é uma coisa do Demo para o jornalismo, assim a modos que a ceifeira mecânica para o trabalho braçal nos campos do Alentejo nos idos de 60.
"A que novos desastres determinas De levar estes reinos e esta gente?
Que perigos, que mortes lhe destinas Debaixo dalgum nome preminente? Que promessas de reinos, e de minas D'ouro, que lhe farás tão facilmente? Que famas lhe prometerás? que histórias? Que triunfos, que palmas, que vitórias?"
Luís Vaz de Camões, Os Lusíadas, Canto IV, episódio O Velho do Restelo, oitava 97
E serviço público de televisão era, de cada vez que nos debates televisivos interviesse um paineleiro, passasse em rodapé o curriculum vitae do ilustre. Por exemplo, no Prós e Contras desta segunda-feira, falava António Borges e apareciam ali as letrinhas a correr devagarinho da direita para a esquerda:
Vice-Governador do Banco de Portugal, ex-Vice-Presidente do Conselho de Administração da Goldman Sachs, ex-Administração do Citibank, ex-BNP Paribas, ex-Petrogal, ex-Sonae, ex-Cimpor e ex-Vista Alegre, ex-qualquer coisa no FMI, actual conselho de administração da Jerónimo Martins e ministro do Governo PSD-CDS/PP para as privatizações.
Falava depois Vítor Bento e novamente o rodapé deslizante:
Conselheiro de Estado, director do Departamento de Estrangeiro do Banco de Portugal, ex-presidente do Conselho de Administração da SIBS, administrador da Galp.
E assim sucessivamente.
E desta forma o cidadão mais distraído destas coisas do debate da Economia ficava a perceber melhor o que é que querem dizer quando lhe falam em baixar salários e em cortar reformas e pensões.
Naquele "programa" das noites de segunda-feira na RTP 1, que serve para o cidadão comum «aferir semanalmente o seu índice de normalidade», e esta semana intitulado "Vozes Independentes", a páginas tantas Fátima Campos Ferreira interrompe um paineleiro convidado para lhe perguntar se o grupo a que pertence não é daqueles que «põem em causa a propriedade privada». Pois. Andamos nisto, vai para 40 anos, preocupados com os grupos que podem por em causa a propriedade privada, quando há mais de 100 anos uma minoiria, estruturada num emaranhado de laços sanguíneos, se abotoa com o património comum de séculos de história, e esbulha a propriedade colectiva.