Os camelos somos nós
Depois do relambório que foram os milhões do contribuinte despejados em cima do Papa, que não queria que despejassem dinheiro em cima dele, isso era coisa dos mortais, que também não sabiam que o dinheiro que iam despejar era assim tanto, e mais o palco que o Papa também não queria tamanho dum filme do William Wyler, isso era coisa dos mortais, que também não sabiam que o palco era tamanho dum filme do William Wyler, caso contrário nem tinham planeado outro, no Parque, tamanho do Quo Vadis, onde o Pedro, que ainda não era santo, fez um comício à luz da tocha dentro dum buraco aproveitando a inclinação do terreno.
E assim, à medida que o dinheiro que o Estado laico vai "investir" no picnicão da Igreja católica ia caindo nos telejornais, o ouvido do povo foi-se habituando à melodia, como aquelas músicas que não valem a ponta de um báculo mas que à força de serem passadas na rádio vão vendendo e chegam ao primeiro lugar do top. E depois nem eram tantos milhões assim quanto isso que os gajos são de boas contas com o dinheiro que não é deles e corrigiram prontamente e agora são poucos milhões assim quanto isso, e os palcos já não são tão grandes assim, são um cadinho menos tão grandes assim, e o da beira-rio vai servir para o Moedas trazer o Coachella e o Glastonbury e o caralho para Lisboa, vocês vão ver, ele até foi falar com os comerciantes da zona para manterem o comércio aberto, disse na televisão, não pode dizer que não disse, está gravado, porque os atrasados nem sabiam que podiam ganhar numa semana o que habitualmente ganham em dois meses, agradeçam ao Moedas esta lição de economia e empreendedorismo.
E no meio do barulho das luzes o "morreram todos" fez um telejornal em cima do palco, inaugurou-o, #ChupaFrancisco, e ninguém já repara nem no preço da alcatifa, apesar de assim a coisa estar ao contrário, o tal de sofrer na vida terrena para ganhar o Reino dos Céus, onde não há cardos nem picos, não é preciso a tal da alcatifa que está no palco, agora quero ver a cara do padre com a ladainha do sofrimento depois do chão alcatifado.
Nem ninguém repara nos milhões da câmara de Cascais para paramentos e outras alfaias religiosas, câmara rica, esta, um dia há-de ser feito um reajustamento territorial para excluir o Fim do Mundo e a Quinta das Marianas, só dão mau nome à zona.
Nem ninguém repara na única limpeza a que a câmara de Lisboa meteu mãos à obra desde que o camarada Moedas foi eleito presidente, a dos sem-abrigo da Avenida, ainda assim o senhor Francisco a meio da celebração fosse desatar a cantar "webaba silale maweni, webaba silale maweni, homeless, homeless, moonlight sleeping on a midnight lake, homeless, homeless" do Paul Simon perante o horizonte visual poluído até à Praça do Comércio, aqueles homeless onde o Marcelo vai com as televisões atrás entregar sopa e dizer boa-noite, calado que nem um rato, o Marcelo, beato.
Nem ninguém repara na mudança de nome do Alto do Parque para Colina do Encontro, estou mesmo a ver num futuro próximo, entram num táxi "leve-me à Colina do Encontro" e o taxista a olhar de lado "quem é este pacóvio?" .
Como dizia o Mateus em 19:16 "É mais fácil um camelo passar por o buraco duma agulha que um rico". Os camelos somos nós, apesar do dinheiro dos ricos ser nosso.
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