"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Pescar à linha meia dúzia de medidas, inócuas, indolores, incolores, nos programas dos diversos partidos, e que só não estão no programa do partido do Governo por esquecimento ou de propósito, para serem depois pescadas e mostradas como exemplo de abertura à negociação, como se o problema fosse esse e não o que não foi dito em campanha eleitoral, e que nem sequer constava no programa sufragado nas eleições.
"O Governo refez as contas do Orçamento do Estado previsto para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e o saldo apresentado inicialmente como positivo é afinal negativo. O prejuízo será superior a 217 milhões de euros". Como, porque, porquê, a equação "Positivo - Neutro - Negativo" é aplicada a um serviço público tendencialmente gratuito? É todo um programa político onde só há um perdedor, o suspeito do costume, conhecido como "cidadão", ou "contribuinte", se bem que a melhor de todas, ainda que nunca invocada, seja "eleitor".
[Imagem "Britain's Prime Minister Margaret Thatcher and President Ronald Reagan share a laugh during a break from a session at the Ottawa Summit on July 21, 1981, at Government House in Ottawa, Canada"]
Do Governo que "pela primeira vez na história não vai aumentar os impostos", para quem o descongelamento da taxa de carbono não é um aumento de impostos, que acredita que a descida de IRC não vai para o bolso do patrão e do accionista mas para a criação de emprego e aumento dos salários, que tem todas as previsões económicas feitas na base da fezada.
"52% dos portugueses querem novas eleições caso o Orçamento seja chumbado pela oposição", contra as opiniões de Marcelo a Marques Mendes até ao Núncio do CDS, ao presidente da CIP e ao cardeal de Lisboa, passando pela dupla Bernardo Ferrão & Zé Gomes, e do Baldaia e mano Costa. Desde 21 de Março, data da tomada de posse de Montenegro & Cia Ltda. Seis meses nisto. As pitonisas já não são o que eram.
A três dias da entrega do orçamento do Estado para 2025 no Parlamento, a televisão do militante n.º 1 - SIC, mete Maria João Avillez a entrevistar Luís Montenegro. Maria João Avillez a entrevistar Luís Montenegro. Isto depois de uma semana inteira de pressões sobre Pedro Nuno Santos, desde o presidente do Supremo ao cardeal de Lisboa, passando pelo presidente dos patrões e outros bonzos avulso, um tempo de antena de bandeja. Honi soit qui mal y pense, isto não é o Pedro Tadeu a entrevistar o Paulo Raimundo, nem pouco mais ou menos.
Ontem Luís Marques Mendes na homilia semanal sem contraditório, também na televisão do militante n.º 1, por mais que uma vez sublinhou a histórica vitória que foi um Governo de minoria absoluta ter conseguido juntar na concertação social as assinaturas da CIP e da UGT. Onde é que já se viu? A UGT, essa grande central sindical com ligação ao mundo do trabalho, não é cá como os fantoches da CGTP, assinar por baixo o que a CIP lhe diz para assinar. Inédito.
Fazer reparos ao funcionamento da justiça, tentar reformar a justiça, oh da guarda que o poder político quer meter o bedelho onde não é chamado, a inaceitável ingerência, a separação dos poderes, vem aí o totalitarismo, desta vez sem os tribunais plenários, que saltaram directamente para a casa da partida sem passarem pela prisão. Já uma Procuradora-Geral da República derrubar um Governo de maioria absoluta em conluio com o Presidente da República, e um presidente do Supremo Tribunal de Justiça a largar postas de pescada sobre o Orçamento do Estado é a normalidade democrática, não há cá ingerência coisíssima nenhuma e os poderes continuam separados.
Em vez da gestão do silêncio e do soft power fazer barulho, muito barulho, de forma a que parecendo estar a ajudar entalar o Partido Socialista no affair Orçamento do Estado. Marcelo Rebelo de Sonso. Parabéns a quem cunhou o nome.
A direita, que mais que não querer eleições tem medo de ir a votos, a propósito de um hipotético chumbo do Orçamento do Estado no Parlamento, paulatinamente vai construindo a narrativa de que ninguém, o pagode, quer ir a votos, e que ninguém, o pagode, percebe que se queira ir para eleições. É como aquelas canções foleiras que passam na rádio e de que ninguém gosta mas que ao fim de tocadas uma vez por hora toda a gente as canta na rua.
Os 2,7% de crescimento económico que com António Costa eram "poucochinho", e os 2% de Luís Montenegro, a herdar de António Costa, que "não há disto na Europa". Ainda não disse se dissolve o Parlamento no caso do chumbo do Orçamento do Estado.