"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
O Presidente da República do Estado laico que anda todo babado, e faz questão de misturar a baba com o cargo que exerce, com os milhões de euros do contribuinte enterrados na Jornada Mundial da Juventude a cargo da Igreja Católica, é o Presidente da República que alerta para para a pobreza e crise social em evento promovido pela Mota-Engil cujo CEO aufere anualmente um salário 73 vezes superior à média do que paga o seu grupo. Isto antes da bola, que foi ver a Braga, agora que os combustíveis estão a baixar há semanas consecutivas e se pode dar a esse luxo, e aproveitar o intervalo para lamentar, em directo para a televisão, ter perdido os primeiros 15 minutos do jogo e dar a táctica para levar de vencida o Uruguai na segunda parte.
No fim do jogo a televisão do militante n.º 1, SIC Notícias, foi "em directo para o Funchal, Cristiano Ró Náldo [assim mesmo, com dois acentos] não marcou mas os madeirenses estão contentes".
Seixas da Costa foi o embaixador português na UNESCO responsável por convencer aquela entidade de que a Barragem de Foz Tua era compatível com o Alto Douro Vinhateiro, Património Mundial. Um ano depois foi trabalhar para a Mota-Engil, uma das construtoras da obra. Hoje é administrador da EDP Renováveis.
Paulo Portas, na altura líder do CDS/PP, foi o Ministro dos Negócios Estrangeiros que nomeou Seixas da Costa para o cargo. Paulo Portas vai agora para a Mota-Engil.
Assunção Cristas, do mesmo partido, era a Ministra do Ambiente quando autorizou o abate de 1104 sobreiros e 4134 azinheiras. Prestou declarações erradas ao Parlamento, em 2011, dizendo que o paredão estaria feito, quando nada havia no terreno. Podia ter parado a barragem. Assunção Cristas, hoje presidente do CDSPP, vinha do escritório de advogados Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva e Associados, onde trabalhou antes de ir para o Governo. Este firma de advocacia tem como cliente a concessionária da barragem de Foz Tua, a EDP.
E depois? Vão daqui para o México meia dúzia de engenheiros de confiança da Mota-Engil tomar conta da obra e dos nativos - baratos, a empregar na obra que vai usar matéria-prima nativa - barata, e receber uma pipa da massa, não em MXN peso mexicano - barato, mas em USD dólares amaricanos - caros e bons, para distribuir pelo patrão e pelos accionistas, cá.
E depois desta ginga-joga toda e de saldadas estas contas e pagas as mais-valias o que é que sobra para a economia nacional, quais são as melhorias que os nativos, baratos, cá, vão sentir na seu dia-a-dia, cá?
E a menos que sejamos membros do Governo e que após terminada a [co]missão de serviço em 2015 ingressemos nos quadros da Mota-Engil como doutores e engenheiros especialistas e qualificados, o que é que a gente ganha com isso? O que é que a gente tem a ver com a Mota-Engil ter ganho uma obra não-sei-quantas no México ou na Patagónia ou fim do mundo?
Ao dar de caras com a notícia que Jorge Coelho vai assumir a “presidência executiva do maior grupo de construção civil de Portugal, o grupo Mota-Engil”, não consigo evitar recordar-me do programa A Quadratura do Círculo.
Das palavras de Jorge Coelho, de cada vez que se falava de quem quer que fosse; desde a personalidade mais mediática do país, ao anónimo sem-abrigo: “Fulano de tal é uma pessoa que eu conheço; Sicrano é uma pessoa de quem aliás sou amigo; de Beltrano tenho como pessoa íntegra; e a quem aliás aproveito para saudar e enviar um forte abraço”.