"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Se fosse um Governo PS: "Começa julgamento de nº 2 de __________ [nome do líder] e antigo líder da bancada do PS"
E juntavam-se aspectos da governação da pessoa em causa do ponto de vista ideológico, misturando tudo, com um subtexto "PS = corruptos".
E no entanto ninguém pergunta a Passos Coelho, em entrevistas sucessivas ao longo de semanas, o que pensa de Miguel Macedo, se ainda são amigos e se o foi visitar.
«A comissão parlamentar de Ética recusa levantar a imunidade parlamentar do deputado Miguel Macedo. O ex-ministro da Administração Interna "não é arguido nem testemunha em nenhum processo", justificou o presidente Pedro Lynce», esquecendo-se de justificar ao pagode, que não sabe destes mecanismos e ao pagode que só lê as gordas – pedagogia e serviço público prestado por um deputado eleito da Nação, que Miguel Macedo que, por amor à cousa pública passou directamente da cadeira imune de ministro para a imune cadeira de deputado, só devia ter pedido o levantamento da dita imunidade após um pedido judicial nesse sentido e que assim foi só circo para as massas distraídas e lá foi o ex-ministro-actual-deputado cantando e rindo, à sua vidinha, envolto numa aura de honestidade, credibilidade e desprendimento – Miguel Macedo, "O Deputado Sem Medo".
"[...] tendo em conta a especial responsabilidade que recai sobre um ministro como o da Administração Interna, e a necessidade de manter uma inquestionável autoridade política no exercício dessas funções [...]" que não é a mesma especial responsabilidade que recai sobre um ministro como o da Justiça, por exemplo, ministério onde não há a necessidade de manter uma inquestionável autoridade política no exercício de funções, para já não falar do ministério dos Negócios Estrangeiros, o tal, o da "nossa imagem no estrangeiro". Vai acabar, mais cedo ou mais tarde, ministro. À frente de um ministério com "especial responsabilidade" a necessitar de "inquestionável autoridade política".
Há esquadras de polícia a meter água pelo telhado e pelas paredes; há esquadras de polícia forradas a amianto; há esquadras de polícia sem camaratas, onde os polícias de turno dormem no chão em cima de papelões e dentro de sacos cama trazidos de casa; há esquadras de polícia onde o papel higiénico é trazido de casa pelos polícias; há esquadras de polícia onde as patrulhas automóvel não se efectuam por falta de verba para pagar o arranjo e manutenção das viaturas na oficina; há esquadras de polícia onde as patrulhas automóvel não se efectuam por falta de verba para o gasóleo e gasolina; há esquadras de polícia onde só uma das várias viaturas ao dispor é usada, por falta da verba para a oficina e gasóleo; há esquadras de polícia onde por falta de verba para gasolina os polícias se deslocam a pé para entregar contra-ordenações e restante expediente. Tudo disponível online para consulta, até o ministro pedir ao Tribunal Europeu que ordene a retirada dos links.
E ainda há os salários miseráveis dos polícias, o fardamento pago do seu bolso, a carga horária, as progressões na carreira, o armamento obsoleto e a falta de treino e preparação, também online para consulta via Google.
Como diria o vice-trampolineiro Paulo Portas, "o socialista é muito bom a gastar o dinheiro dos outros mas quando acaba o dinheiro chamam-nos a nosotros y a vosotros para compor as coisas"
Corria o ano de 1980 e Francisco 'o pensamento político' Sá Carneiro, primeiro-ministro, e Cavaco 'nascer duas vezes' Silva, ministro das Finanças, assinam um decreto-lei a estabelecer que aos membros do Governo que «não tenham residência permanente na cidade de Lisboa ou numa área circundante de 100 quilómetros poderá ser concedida habitação por conta do Estado ou atribuído um subsídio de alojamento».
Decreto-lei que, 30 anos depois, havia de dar um jeitaço do caraças à tralha cavaquista, entretanto recuperada para o Governo da Nação pelo passismo [rima com passadismo], apesar da habitação própria e permanente em Lisboa, a vida custa a todos, a prestação ao banco e o IMI, e tal, mas que, assim que caiu em público, abdicou dos direitos adquiridos, pelo exemplo que vem de cima e os sacrifícios pedidos aos portugueses e a imagem e a imagem do Governo e a imagem da coligação e "por decisão pessoal minha, amanhã mesmo, e eu vou abdicar de um direito que tenho, faço-o porque entendo que devo fazê-lo", prontes.
E eis que chegados ao ano de 2014, e chegados os alunos da "escola alemã", que viaja de avião em económica e que acha absolutamente natural que alguém a ganhar o salário mínimo nacional vá trabalhar para 50 ou mais quilómetros de casa, sem subsídio de transporte nem subsídio de alimentação, quanto mais subsídio de residência, apesar da mulher e dos filhos que ficam lá e da casa ao banco para pagar, a mobilidade social, e tal também, e alarga o raio de acção do decreto de Francisco 'o pensamento político' Sá Carneiro, primeiro-ministro, e Cavaco 'nascer duas vezes' Silva, ministro das Finanças, de 100 para 150 kms e a comparticipação reduzida de 75% para 50%, também o exemplo que vem de cima e os sacrifícios pedidos aos portugueses e a imagem e a imagem do Governo e a imagem da coligação, decreto mesmo à medida de Agostinho 'roubaram-me a password do Twitter, who the fuck is the Ongoing?' Branquinho.
Não fora o caso, e o exemplo, dos alemães, os "donos da escola", e tudo isto era tudo absolutamente normal, assim é só conversa de taxista, porque a política precisa dos melhores e dos competentes e os melhores e os competentes fazem-se pagar, a cousa pública não tem nada a ver com isto e já chega de conversa populista e nas próximas eleições a abstenção vai ser outra vez recorde e "será sempre a subir até ao cimo de ti", como na canção da ex-deputada do CDS e ex-pivot de um telejornal que apresentava com um megafone de vender cuecas nas feiras, "e leva mais este par de meias e estes atoalhados e os turcos para a casa de banho".
E não só somos bons, muito bons, como também somos a verdadeira terra das oportunidades, a terra do leite e do mel, como dizem os amaricanos nos filmes. Um país para novos [de acabadinhos de chegar ao mercado, subentenda-se], criar empresas de véspera para no dia seguinte começar a facturar, contra os interesses dos instalados na praça. Venha de lá o investimento estrangeiro. Somos bons, muito, bons, somos fantabulásticos, e até damos dó-tôres à Goldman coise:
Chefe de gabinete do MAI demite-se após ajuste directo a empresa sua
«Além de Rita Abreu Lima, a POP Saúde tem como sócio Miguel Soares Oliveira, ex-presidente do conselho directivo do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), e foi criada poucos dias antes do ajuste directo da ARS LVT. Soares de Oliveira é marido de Rita Abreu Lima e gerente da sociedade.»
E eis senão quando somos remetidos para o passado dia 21 de Novembro e as perguntas voltam a ser pertinentes:
- Houve um pauzinho na engrenagem da hierarquia de comando?
- As ordens do ministro não foram acatas pelo comando; as ordens do comando não foram acatadas pelo comando no terreno; os operacionais no terreno recusaram cumprir as ordens do comando?
- O ministro Miguel Macedo, sentindo-se desautorizado e sem o controlo da situação, apresentou o pedido de demissão e viu-o recusado pelo primeiro-ministro?
- A face do ministro, desautorizado e menorizado, foi salva por um comandante, "voluntário" para ser imolado?
- Era necessário mudar alguma coisa para que tudo ficasse na mesma, daí o aparente contra-senso da substituição do comandante pelo comandante das forças no terreno?
- As contrapartidas para o acto de "voluntarismo heróico" do comandante começam agora a ser conhecidas?
A novidade é um Governo de direita embrulhado com a lei e com a ordem, a juntar às embrulhadas em que esta maioria PSD/ CDS-PP é pródiga. Imagem de marca.
A sério?! Miguel Macedo é ministro da Administração Interna deste Governo, desta maioria que, desde o dia da tomada de posse mais não fez do que violar as regras e ultrapassar os limites, desde os sucessivos Orçamentos do Estado até ao contrato social, ignorando que tem por missão fazê-las respeitar e dar o exemplo, ou foi só ali comprar cigarros e chegou agora?
Miguel Macedo acabadinho de chegar de Marte que não sabe o que foi o 25 de Abril de 1974 nem o significado que a data matém 40 anos passados nem nunca ouviu falar em "margem sul" nem em "cintura industrial" nem em "De pé, ó vítimas da fome! De pé, famélicos da terra!" nem percebe nada de simbolismos e para quem "a ponte é uma passagem" e nunca uma ligação.
Miguel Macedo que nem sequer é ministro deste Governo, o tal, o que ressuscitou a luta de classes em Portugal:
Reza a história que nos idos de François 'Papa Doc' Duvalier no Haiti a Milice de Volontaires de la Sécurité Nationale só recebia uma farda e uma arma, mais nada, nem salário, o resto era por conta deles.
O ministro Miguel Macedo, habituado que está a ver Clint Eastwood, com 80 anos, a perseguir e dar caça à bandidagem, pensou para com os seus botões, "se ele aguenta eles também aguentam. Ai aguentam, aguentam" e, vai daí, decide aumentar a idade com que os profissionais da PSP e GNR podem passar à reserva ou pré-aposentação dos 55 para 57 ou 58 anos.
Paulo Portas, que já não anda a passear Correios da Manha [não, não há engano, é mesmo sem til] debaixo do braço pelas feiras e mercados, fica-se perante o descalabro que se adivinha na manutenção da ordem pública e no combate à criminalidade.
Foi quando dois polícias fardados puseram as liberdades de Abril em perigo e a Direita, à boleia da Esquerda, saiu em peso para o Facebook, Twitter e blogocoisa, para fazer uma revolução por minuto. Agora 'elementos estranhos' à paisana vasculham na televisão pública e "toda a gente sabe que" e no pasa nada…
"Lamento que não tenha sido possível da parte do senhor ministro da Administração Interna uma declaração mais esclarecedora quanto à intervenção do Governo", disse.