"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
O Correio da Manha faz primeira página com uma alegada sondagem que dá 46,2% a Carlos Moedas contra 27,1% de Alexandra Leitão numa corrida à câmara de Lisboa, e na autarquia do Porto 29% a Manuel Pizarro, numa disputa com Pedro Duarte, que se fica pelos 26%. Lá dentro, Carlos Rodrigues, "director-geral editorial" e alegado jornalista, explica a alegada sondagem - o universo nacional a opinar sobre uma determinada câmara municipal onde só votam os residentes, tipo uma sondagem europeia sobre quem deveria ser o próximo inquilino na Casa Branca em Washington.
A primeira função já foi cumprida - os que lêem as gordas ao balcão do café, a segunda, que é a replicação em todos os telejornais desta "sondagem fidedigna", está em curso. Percebem agora porque é que Correio da Manha não leva til?
De valor era marcar um dia e uma hora com toda a gente na janela a aplaudir o alegado ministro da Saúde pelo excelente desempenho do SNS, hospitais e centros de saúde.
[Imagem de autor desconhecido]
Adenda: o Governo dos prémios de consolação, Medina nas Finanças por ter perdido a câmara do Porto, Pizarro na Saúde por os eleitores não confiarem nele para o Porto.
Portanto, alguém levar um ordenado decente para casa no final do mês obriga estar 14 horas à disposição da entidade empregadora, pública ou privada. Das 6 às 20 horas, sendo que para entrar às seis tem de se levantar da cama pelo menos uma hora antes para se preparar, higiene pessoal, vestir, etc, e ainda mais algum tempo para quem trabalha longe de casa. E depois sair às oito da noite, pelo menos mais uma hora para entrar na porta da rua às 21 horas, até já acabou o telejornal. E depois faz o quê? Janta e vai para a cama porque está todo partido e no dia seguinte tem de repetir a rotina. Nem televisão, nem saída à noite com a mulher ou os amigos, nem ida ao teatro, ao cinema, a um concerto, e se tiver filhos o crescimento e a educação passam-lhe completamente ao lado.
Um gajo, vá lá, um senhor gajo, ou um doutor gajo, anda toda a vida a tentar endireitar a vidinha e constitui uma empresa para levar a vida direita.
Um gajo, vá lá, um senhor gajo, ou um doutor gajo, mete-se na política, faz-se militante de um partido do arco da governação, para ficar mais próximo dos centros de decisão, por causa da tal empresa que constituiu para levar a vida direita, ou um gajo, vá lá, um senhor gajo, ou um doutor gajo, constituiu a empresa depois de se ter metido na política e ter percebido que o melhor para endireitar a vidinha era fazer-se à vida e constituir uma empresa para levar a vida direita, já que os centros de decisão estavam mesmo ali à mão de semear.
Um gajo, vá lá, um senhor gajo, ou um doutor gajo, mete-se de tal maneira na política que um dia chega a ministro e à incompatibilidade entre o ser e ser dono de uma empresa constituída para endireitar a vidinha e levar a vida direita. Perante isto um gajo, vá lá, um senhor gajo, ou um doutor gajo, vende a sua parte da empresa a outrem e abdica, em prol de servir o pagode, de todo o esforço despendido ao longo da vida para endireitar a vidinha e levar a vida direita através da constituição de uma empresa.
Um gajo, vá lá, um senhor gajo, ou um doutor gajo, espera que o pagode acredite nisto, que daqui para a frente não tem nada a ver com a empresa que criou para endireitar a vidinha e levar a vidinha direita, a troco de um mandato ministerial de termo incerto ou um gajo, vá lá, um senhor gajo, ou um doutor gajo ainda goza com o pagode?