"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Como já aqui havia oportunamente sido referido, a solução para a onda de criminalidade que assola a chamada diversão nocturna, com os casos mais ou menos graves que com inusitada regularidade vão fazendo as primeiras páginas dos jornais e as aberturas dos noticiários nas televisões; desde agressões de seguranças a confrontos entre gangs, passando, agora nesta última fase, pelo assassinato de proprietários de casas, não passava por colocar mais Polícia nas ruas – a ladainha preferida da Direita em tudo o que diga respeito ao crime e à violência –, uma vez que a Polícia já lá se encontra, à porta e no interior das próprias discotecas ou bares.
Ontem veio o presidente da Associação Sócio-Profissional da PSP, Paulo Rodrigues, dizer com o ar mais cândido do mundo que a associação por si presidida vai pedir à direcção nacional que investigue o eventual envolvimento de polícias neste esquema das seguranças; revelando que a ASPP “tem recebido informações, não só do Porto, mas de vários outros pontos do país, de que haverá vários polícias ligados à segurança privada” (ler mais aqui). Pois. Toda a gente sabia – proprietários, clientes, polícias que fazem as rondas e as patrulhas – excepto a ASPP, vá-se lá saber porquê…
As questões que gostava de ver respondidas da parte de Paulo Rodrigues e ErnestoPeixoto Rodrigues são:
. – Acaso os futuros candidatos a agentes da autoridade (PSP, GNR e PJ) não têm o conhecimento prévio das condições de trabalho, das regalias, e das remunerações que vão usufruir nas corporações?
. – Dando de barato que não têm esse conhecimento; é justificável que para tentar compor o salário se recorram a meios que roçam a ilegalidade e a criminalidade? E esta é uma pergunta válida para qualquer cidadão.
Aqui a questão passa a ser outra: a da ausência de valores. Entrar num campo onde o único valor que vale é o "vale tudo" - desde que renda euros. De preferência fáceis.
«Este interlocutor criticou ainda as leis portuguesas por, na sua opinião, serem favoráveis aos criminosos.» (também no Público). Tem toda a razão o “elemento próximo da família da Aurélio Palha”, como anteriormente aqui havia sido escrito, isto não é um caso de Polícia, é um caso de Finanças, vulgo Fisco.
Identifique-se e seja (m) levado (s) a julgamento o (s) responsável / responsáveis pelo assassinato de Aurélio Palha, é o mínimo que se exige; é o caso de Polícia. Investiguem-se todos os Aurélios Palha deste país, e as suas ascensões meteóricas. E, mais importante, sejam criados mecanismos de controlo e prevenção a futuros candidatos a “empresários” da noite; é a parte que cabe ao Fisco.
Adenda: Ainda sou do tempo – como no spot publicitário – em que ser “empresário” era sinónimo de criador de emprego e bem-estar para uma comunidade.
E de repente, como que por artes mágicas, todos os partidos do leque parlamentar descobriram a criminalidade associada à noite, e, da esquerda à direita, de um extremo ao outro das bancadas em S. Bento, vêm todos ao terreiro exigir medidas para pôr cobro à situação.
Não estranho que à direita, pelas vozes de Agostinho Branquinho (Distrital do PSD/ Porto), Nuno Magalhães (CDS/ PP) ou Luís Filipe Menezes, se venha pedir o reforço das medidas de segurança que passa inevitavelmente por mais polícias na rua – de preferência um polícia para cada perigoso noctívago. É a receita habitual da direita: polícia, muita polícia, quanto mais polícia melhor. Estranho é que a esquerda, habitualmente mais desconfiada nestas coisas de polícias, alinhe pelo mesmo diapasão e, faça suas, as mesmas exigências e reivindicações que a direita-policial (vejam-se as declarações do presidente socialista da Câmara de Matosinhos, do vereador comunistana autarquia do Porto, Rui Sá, e até um “insuspeito” bloquista: Teixeira Lopes).
Estou frontalmente contra estas exigências. Repugna-me a ideia de um Estado policial. Não quero viver num País com um polícia em cada esquina como na Roménia de Ceucesco.
A solução para este tipo de problemas que começaram a ter mais visibilidade com o caso Mea Culpa em Amarante, não passa por colocar mais polícia na rua; os polícias já lá estão, à porta das discotecas e bares, no interior dos estabelecimentos, onde eles próprios exercem as funções de seguranças, em part-time e horários pós-laborais.
A solução para este tipo de problemas – falo com a autoridade adquirida em mais de 20 anos de actividade ligada à noite (dj) –, sejam eles no Porto,Setúbal, Lisboa, ou outra qualquer localidade de Portugal, chama-se Finanças, vulgo Fisco. Investigar como se fazem e desfazem sociedades e fortunas ligadas ao negócio da noite, cujo caso do recém assassinado proprietário da discoteca Chic é exemplar: Em meia-dúzia de anos – literalmente – de segurança a dono de um império que inclui até uma rádio! Depois os seguranças mais os tráficos de drogas vêm por acréscimo; são os chamados fait-divers, apesar de estarem intimamente ligados ao chamado “negócio da noite” e funcionarem em círculo fechado – um leva ao outro, e assim sucessivamente. Da mesma forma que não se começa a construir uma casa pelo telhado, que é parte integrante da casa; não se começa a investigar o negócio da noite pelos seguranças e pelos dillers, malgrado alguns terem sido o embrião dos outros.
Pelos vistos o “Ídolo” Paulo Macedo tem “pés-de-barro” e andou a dormir na forma e no conteúdo nalgumas áreas que eram sua responsabilidade.
Ao PSD fica-lhe mal, muito mal, vir assacar culpas ao actual executivo pelo clima de insegurança que se vive na noite – e neste particular do Porto –, quando já teve várias oportunidades de pôr ordem na coisa e nunca o fez nos sucessivos governos em que participou, quer sozinho, quer em coligação; uma delas de ouro, por via de um ex-líder e ex-primeiro-Ministrohabituée nestas lides e que tinha / tem necessariamente o conhecimento de como as coisas se processam.
Mas os bares e as discos das elites são muito mais higiénicas e exclusivas, blindadas ao exterior. E enquanto o azar não bater à porta de um qualquer novo Stones, Bananas ou outro K qualquer, vai tudo ficar na “paz dos deuses”, até que noutra qualquer cidade portuguesa, outro Aurélio Palha por via da sua morte, fornecer mais “palha” para alimentar aos media e a indignação da classe política.