O terceiro lugar de Aristides Sousa Mendes
Começo o post com uma declaração de interesses: Votei
Em editorial assinado no Público de hoje, José Manuel Fernandes (JMF) aponta os “ Quatro motivos para a eleição de Salazar não ser esquecida”.
Procurando justificações para o facto de os dois primeiros lugares do pódium terem sido ocupados por Salazar e Cunhal que “representam o que não se quer que Portugal seja, mas que ainda é em boa parte”, JMF avança que “foi o voto militante que derrotou a dispersão de votos nos outros candidatos, mas que existam ainda tantos militantes em nome deste tipo de figuras é um sinal de atraso do país.”
Plenamente de acordo. Aliás em posts anteriores arrisquei mesmo avançar que o vencedor seria Álvaro Cunhal, eleito pelo lobby que colocou a ceifeira de Baleizão nos 15 primeiros. Falhei; não por muito, mas falhei.
(O PC deve estar neste momento a pensar se terá sido boa aposta a defesa de Cunhal nas mãos de Odete Santos. De cada vez que a “camarada” abria a boca, o telefone tocava a favor de Salazar. Mais valia ter apostado em Pacheco Pereira.)
Onde JMF falha, a meu ver rotundamente, é na análise ao terceiro lugar de Aristides Sousa Mendes.
“Porque é que surge tão bem colocado? Só há uma explicação: foi o voto de refúgio para os que desejam enviar um sinal contra a polarização da corrida entre o ditador e o comunista.”
Num país onde em inquéritos de rua à porta de uma Universidade (!!!) e em concursos de televisão, Américo Tomaz é identificado como o primeiro Presidente da República a seguir ao 25 de Abril, e Sá Carneiro como ex-preso político, quem é que sabe quem foi Aristides?
Não! Foi também o mesmo voto militante. Custe-lhe o que custar, foi o chamado lobby judaico, em defesa de um “justo” com árvore plantada na Alameda, e tudo.
Não estando em causa os inegáveis princípios e valores humanistas que estiveram por detrás da atitude de Aristides Sousa Mendes (valores que aliás partilho em absoluto), JMF não pode querer aplicar um determinado raciocínio a dois finalistas e ignora-lo para outro. JMF está a cair no “politicamente correcto”; para não ser acusado de anti-semitismo faz uma interpretação enviesada da classificação; essa sim, uma atitude anti-semita.
Seria útil ao director do Público dar uma passagem de olhos por um livro de Hannah Arendt intitulado As Origens do Totalitarismo.