"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Migrants who were aboard a precarious rubber boat grab a centifloat as they are rescued by a team from the Sea Watch-3, about 35 miles offshore from Libya, in Libyan SAR zone, Monday, Oct. 18, 2021. AP Photo/ Valeria Mongelli
Isto na Líbia são os bons a querer derrubar os maus, são os maus a querer derrubar os bons, são os maus a querer derrubar os maus, é o Cameron e o Sarkozy que nunca mais batem com os costados em Haia?
Ouvir Pedro Passos Coelho, em roda livre, sem o papelinho à frente que é quando o senhor fica em ponto de rebuçado, discorrer sobre as "várias raízes" dos fluxos migratórios que assolam a costa sul da Europa e fazer de conta que não nos lembramos da cumplicidade do seu Governo no despejar de toneladas de bombas sobre a Líbia em apoio de hordas de lunáticos aos gritos Allahu Akbar em cima de pick-up’s, ao jeito de Mad Max, para implantar a liberdade e a democracia e os direitos humanos, contra o coronel Khadafi marchar, marchar, que se faz tarde e isto é tudo Primavera.
Ouvir o senhor, já embalado e deslumbrado com a sua eloquência e com a fluidez do raciocínio, apontar o dedo à União Europeia porque faz falta concertar uma estratégia para um problema comum e não-sei-o-quê na necessidade de atacar o terrorismo na Líbia, que é onde a vaga de imigração nasce, através de mais cooperação económica e do fomento de um "governo de salvação nacional" e fazer de conta que não nos lembramos de Paulo Portas, mais os seus botões de punho, a entrar para o Guinness Book como o primeiro governante ocidental a aterrar em Tripoli, capital da Líbia que ia ser democrática, tal e qual o 25 de Abril em Portugal, a fechar milhentos negócios com o governo liberal e democrático e respeitador dos direitos humanos e do Estado de Direito e o maná que ia ser para as empresas portuguesas e as exportações e o coise.
Depois de terem pedido uma acção militar para derrubar o ditador-torcionário-carniceiro al-Gaddafi agora «Roma e Madrid pedem ação militar na Líbia contra tráfico humano», vítimas fugidas da democracia instaurada pela acção militar da NATO e dos apoios concedidos pela Europa e pelos Estados Unidos, do Nobel da Paz Obama, a fundamentalistas vários durante a 'primavera árabe'. Podíamos bombardea-los logo nas praias da Líbia na altura dos embarques, isso sim, era de valor.
Adriano também construiu uma muralha e morreu sem nunca perceber a razão/ as razões da atracção dos bárbaros pelo império. Mas como ninguém estuda História e até há já quem proponha a sua erradicação dos programas escolares, substituída por economias e outras disciplinas mais práticas das contagens de dinheiros e de números e de pessoas-números, isso agora também não interessa nada.
Ainda sou do tempo de Paulo Portas ter sido o primeiro governante europeu ocidental a aterrar em Trípoli para fazer negócio com o novo regime "democrático", eleito pelos bombardeamentos da NATO ao exército de Muammar al-Gaddafi. As oportunidades de negócio, as empresas de construção civil na reconstrução do país, as exportações, os amanhãs que cantam para ambas as economias, blah-blah-blah, botões de puto e sorriso Pepsodent.
E perguntam-me vocês: o que é que uma coisa tem a ver com a outra, Paulo Portas em Trípoli e os milhares de fugitivos e desesperados, diários, em barcos nas costas de Itália e os outros tantos milhares de mortos nas águas do Mediterrâneo? Não perguntem que vos fica mal a ignorância.
Daqueles com muita porrada e tiros e encontros à socapa entre colarinhos brancos e criminosos sem escrúpulos em tabernas esconsas frequentadas pelo lumpemproletariado, prostitutas, artistas underground na antecâmara do salto para o mainstream e idealistas vários da luta anti-capitalista.
O UTA [Union des Transports Aeriens] 772 que na terça-feira 19 de Setembro de 1989 levantou voo de Brazzaville, na República do Congo, com 155 passageiros e 15 tripulantes a bordo, e que nunca haveria de chegar ao seu destino, o aeroporto Charles de Gaulle em Paris, França, devido à explosão de uma mala-bomba colocada a bordo por terroristas líbios, 46 minutos depois da descolagem e quando sobrevoava a 35 100 pés de altitude uma das regiões mais inóspitas do planeta, o Ténéré, no deserto do Saara.
A história da construção do memorial às vítimas, 18 anos depois pelas mãos dos familiares, recorrendo a peças do avião desenterradas das areias do deserto e a pedras transportadas para o local de uma distância de mais de 70 quilómetros.
O memorial pode ser visto através do Google Earth e Google Maps. A história da construção, documentada em fotografias, aqui.
Um, digamos assim, ocidental num país árabe, e num pais árabe com o Islão como religião oficial, come e bebe do que há, submete-se, a bem da sua saúde, aos usos e costumes, que é como quem diz, à ditadura da religião. Que o digam sobretudo as mulheres, em viagem de turismo ou negócios. Um muçulmano no ocidente, no ocidente laico e com separação entre Estado e religião, submete os ocidentais aos seus usos e costumes, que é como quem diz, à ditadura da sua religião.
Quando o ‘colonel’ montou um circo no “parque de campismo” de S. Julião da Barra e depois quando «quatro F16 da Base Aérea Nº5, em Monte Real» voaram para Tripoli para prestar honras à bancada VIP, nunca se lhe ouviu um piu. Ou porque desconhecia a realidade dos factos, ou porque andava atarefado a comprar viaturas blindadas para a Unidade Especial de Polícia para prevenir motins e atentados terroristas, ou porque estava a dormir a sesta.