"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Bom era quando o camarada Bruno de Carvalho, ilegalmente em território ucraniano, acompanhava a invasão "operação militar especial" e, com fotos no Twitter, encontrava um azove em cada ucraniano morto e uma bandeira nazi e um exemplar do Mein Kampf em cada habitação que devassava, por cá com direito a livro no prelo a dar conta de tão profunda experiência como jornalista "independente".
Deve ser a isto que algumas mentes iluminadas, com avença nos jornais e lugar cativo no comentariado televisivo, chamam de russofobia e censura a tudo o que vem dos lados da Rússia.
Independentemente da "venezuelização de Portugal" que isso significava, segundo os apóstolos e escudeiros, minions de plantão às redes, e que antes era e agora já não é, que financiamento o contribuinte vai desembolsar? O do amigo que tem o grupo de comunicação com a corda na garganta? O dos amigos prestimosos nas acções de propaganda denominada "análise independente" em jornais que não vendem mas que miraculosamente todos os dias aterram nas bancas? O do grupo que chega em primeira mão e em exclusivo ao segredo de justiça? O do não menos amigo que tem noticias direccionadas na base do mui independente princípio "double standard"?
Aceitam-se apostas sobre quantas televisões vão abrir telejornais com este trabalho do Público:
“A lista de extremistas que, em tempos, se preparavam para entrar no partido e que entreguei em mão ao André tinha nomes ligados ao assassinato de Alcindo Monteiro. Era extrema-direita dura”, recorda ao PÚBLICO o antigo vice-presidente do Chega, Nuno Afonso, que se desfilioue encabeça a coligação Alternativa 21 por Lisboa. “Já tinha suspeitas de que vagas de pessoas desse género podiam entrar, havia gajos da NOS [Nova Ordem Social], a extrema-direita a sério. Mas quando mostrei a lista ao André [Ventura], a resposta foi: ‘Não faz mal, queremos os votos de toda a gente’”.
No dia a seguir a Marcelo ter promulgado o diploma sobre os professores, acompanhado de uma nota onde assume, sem um pingo de vergonha, que tentou condicionar a acção governativa com duas propostas de diploma por si apresentadas ao Governo, e lamentando que ambas tivessem sido rejeitadas, mandando às malvas a separação de poderes e imiscuindo-se numa área para a qual não foi eleito e nem sequer tem poder para legislar, tivemos uma manada de "jornalistas", entre aspas, acampados na porta do ministério para, de microfone em punho, rodearem João Galamba enquanto lhe perguntavam se tinha condições para continuar ministro. Isto de andar atrás do fait-divers e do ruído e deixar passar o que realmente importa, de abdicar de ser jornalista para ser o jornaleiro, para o caso, de Marcelo aprende-se na Faculdade? Não vos incomoda profundamente desempenhar o papel de palhaços úteis para servirem os intentos de alguém?
Escreve o jornal do militante n.º 1 na secção "Sociedade" que os "supermercados estão a colocar alarmes em produtos alimentares básicos, como latas de atum ou garrafas de azeite", "as pessoas estão desesperadas, escondem latas de atum e leite para comer ou dar aos filhos". Vira-se a página para o caderno "Economia" e ficamos a saber que a "inflação castiga todo o tipo de famílias: nas mais pobres pesam alimentos e habitação, nas mais ricas os restaurantes e hotéis". Os que vêem o atum e o azeite ao preço do whisky na prateleira do supermercado e os que por estarem quase pobres vão ter de abdicar de brincar aos pobrezinhos na Comporta. Isto podia ter outro título, sei lá, jornalismo de merda.
A direita chora a morte de um "grande" jornalista, daqueles de fazer inveja ao The New York Times ou ao The Guardian, pelo que se lê nas redes. O jornalista que no dia a seguir a Anders Breivik, cristão de extrema-direita, ter assassinado 77 pessoas num ataque terrorista em OIslo e na ilha de Utoia, faz uma primeira página a chutar para o terrorismo islâmico da Al-Qaeda. A direita nunca desilude, nas celebrações, evocações, e na selectividade dos temas. Valha-nos isso.
Em cima o print screen da conta da superstar trauliteira do PCP no Twitter no elogio ao propagandista luso às ordens de Putin com a capa de "jornalista", aquele que acha, diz e escreve, que o 25 de Abril tem dono e que o PS é inimigo da revolução, seguido da notícia da execução a sangue-frio pelas tropas russas do fotojornalista Marks Levin. "a cobrir uma zona de guerra. Mas mesmo na zona de guerra". O PCP que diz não apoiar e invasão russa da Ucrânia, até porque não há invasão coisíssima nenhuma, é uma "operação", magister dixit pela boca de Jerónimo de Sousa, o PCP indignado com o ataque à liberdade de expressão e de imprensa que foi a proibição em espaço da União Europeia das agências de propaganda russas Sputnik e Russia Today, o PCP de onde não sai um pio sobre a proibição da Novaya Gazeta pelo regime de Putin nem sobre os jornalistas que caem como pardais a mando do Kremlin. É a diferença entre jornalismo e propaganda e propaganda e jornalismo numa zona de guerra. Mas mesmo na zona de guerra,
A tear drop rolls down a young woman's cheek aboard a bus after fleeing from Ukraine to Romania, at the border crossing in Siret, Romania, March 16. Reuters/ Clodagh Kilcoyne
"Todos os dias jornais e revistas são lidos por mais de 500 mil pessoas aos balcões de cafés, pastelarias, restaurantes, colectividades. Não leia o jornal que encontra em cima de um balcão ou de uma mesa. Um jornal lido num estabelecimento de restauração ou numa colectividade é um jornalista desempregado". Isto dava um bom anúncio de televisão, mas a cabecinha não lhes permite mais.
"O novo agente parasitário, o jornalista, qual tumor maligno aniquilou a ideia fundadora do contrato social ao ter corrompido gravemente as relações entre o poder e o povo. Não restam dúvidas sobre quem anda a matar os fundamentos da moral social, democracia, funcionalidade das instituições, justiça social, vitalidade das economias, salvaguarda da multiplicidade de identidades sociais e nacionais do mundo ocidental."
O Facebook, o Instagram e o WhatsApp estiveram em baixo e, descontando os agarrados que migraram para o Twitter à procura de "metadona social", o apagão obrigou os jornalistas a fazerem trabalho de jornalistas e a sabermos todos pela comunicação social o que acontecia no Facebook, Instagram e WhatsApp, ao invés de sabermos pelas três redes o que acontecia na sociedade e no mundo, dito por quem trabalha nos jornais, rádios e televisões. Por cinco horas voltámos a ser uma sociedade funcional, com a vantagem de não termos o discurso do ódio amplificado e difundido urbi et orbi.