"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Do Governo que "pela primeira vez na história não vai aumentar os impostos", para quem o descongelamento da taxa de carbono não é um aumento de impostos, que acredita que a descida de IRC não vai para o bolso do patrão e do accionista mas para a criação de emprego e aumento dos salários, que tem todas as previsões económicas feitas na base da fezada.
Das soluções milagrosas escondidas na manga e dos euros prometidos em campanha eleitoral "nem mais um cêntimo". Ponto. Até porque a quebra de receita com a baixa do IRC vai servir para distribuir dividendos pelo patrão e pelo accionista e o dinheiro investido na economia vai ser zero porque o trickle down não funciona e porque o tempo do "capitalismo reprodutivo" já lá vai.
Prometeram tudo a todos em campanha eleitoral - polícias, professores, médicos, militares, enfermeiros, função pública, pensionistas e reformados - sabendo de antemão que não podiam cumprir. Com a cumplicidade dos media e dos paineleiros, comentadeiros e especialistas vários, apimentaram a coisa com alarmismo social - caos na saúde, caos na educação, insegurança nas ruas, o diabo a quatro - desaparecido dos telejornais como por artes mágicas logo no dia a seguir ao das eleições. Mentiram com quantos dentes têm na boca. Enganaram uns quantos papalvos e ganharam as eleições, à rasquinha mas ganharam. Agora começa a construção da narrativa que lhes vai permitir não cumprir um avo de tudo o que prometerem, com excepção da redução do IRC para as grandes empresas, para onde um dia hão-de regressar como CEOs, administradores, conselheiros, terminado o consulado no governo da Nação. Que isto se repita sucessivamente, com êxito, diz muito da nossa baixa qualidade política enquanto povo e da nossa fraca exigência cívica, 50 anos que são passados sobre o 25 de Abril.
Em pouco tempo Luís Montenegro está a conseguir a proeza de aparecer várias vezes no telejornal a falar sobre tudo e sobre nada e sem que nada de substancial saia do que fala, coisa que até há bem pouco era pelouro de Marcelo. "Luís Montenegro disse", é contar as vezes por telejornal e nos noticiários na rádio. Luís Montenegro disse que "o Governo está em roda livre. Apesar da maioria absoluta, temos hoje um Governo onde reina a confusão e a discórdia", porque enquanto Luís Montenegro diz e diz que disse, Luís Montenegro não diz que confusão e discórdia é os deputados do PSD recusarem acatar as instruções do líder Luís Montenegro e do líder do grupo parlamentar para elegerem um protofascista vice presidente da casa da democracia. Compreende-se, ambos têm o mesmo Passos no passado, até há bem pouco tempo tratavam-se por camarada na rua de São Caetano à Lapa, e o intruja não ficou fascista de um dia para o outro.
Rui Rio, alegado líder do PSD, num evento que contou com a participação de Paulo Portas, ex-líder do CDS, das escutas que metiam um banqueiro a pagar o salário ao líder, ex-ministro que meteu o BES à força no consórcio dos submarinos, e de Cavaco Silva, o tal, aquele que para serem mais honestos que ele têm de nascer duas vezes, e que antes tinhas inventado a clique do BPN e do BPP, quer saber como foi possível um caso como o do Joe Berardo. Estas merdas não se inventam.