"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Podia a MEO fazer um comercial "espírito natalício" com uma família muçulmana, a filha a ser repreendida pelo pai por posar sem véu, a família falhar a festa da escola por motivos alheios, chegar no varrer da sala e ter o rebento à guarda de uma família "ocidental" que até partilha no grupo WhatsApp a representação a que os pais não assistiram? Poder podia, mas não era a mesma coisa. Porque era a islamofobia, o desrespeito pela diferença, que o multiculturalismo é bilhete só de ida. A propalada degradação da civilização ocidental começa precisamente aqui, na cedência sem retorno e da culpa interiorizada.
[Imagem de autor desconhecido]
O pormenor de um lado ser o pai que repreende e do outro ser a mãe que condescende é todo um programa.
Logo a seguir à fuga de Assad para Moscovo as televisões mostravam Al-Jolani a ordenar a duas adolescentes, que na rua tinham ido ao seu encontro de sorriso largo na alegria do derrube do regime, que cobrissem o cabelo que levavam ao vento, sendo de imediato obedecido. Ontem, na recepção ao chefe da diplomacia turca em Damasco, Al-Jolani aparece de gravata, aos olhos do fundamentalismo islâmico símbolo do cristianismo e da decadência ocidental. Ou estamos a assistir a uma enorme representação teatral ou alguma coisa mudo mesmo naquelas cabeças...
Pelo menos até à data da impressão do poster que ilustra o post, 1981, a religião era o ópio do povo. Dez anos depois, 1991, a pátria do socialismo desmoronou-se e as coisas ficam um bocado ao "deus-dará", sem ironia, até ao ano de 2006 onde temos um partido comunista a estabelecer relações diplomáticas com uma organização terrorista fundamentalista islâmica, dos inteligentes com trapos enrolados na cabeça, como no poster, um Estado dentro do Estado, com exército próprio, responsável pelo assassinato de um primeiro-ministro do próprio país, um ano antes da embaixada a Beirute. Tudo por causa da "luta contra o imperialismo" 'amaricano', contra o sionismo, e o caralho. Nada mal para quem anda sempre com a boca cheia de constituição, do respeito pela legalidade, pelas instituições e e pelo Estado democrático.
Gajos que escolhem o Natal e a Páscoa para cometerem atentados terroristas querem uma pausa na guerra durante o Ramadão. Não há solução política para guerras religiosas com mais de 2000 anos.
Pelas reportagens das televisões vemos as pessoas nas ruas de Marrocos no meio da aflição, da dor, do desespero, com Insha'Allah na boca e não com o Allahu Akbar que se ouve noutras partes. Isto vale o que vale mas vale muito.
Em 1973 o Expresso referia-se aos movimentos de libertação das colónias como "terroristas"; em 2021 a televisão do militante n.º 1 - SIC Notícias, refere os terroristas islâmicos no norte de Moçambique como "insurgentes".
O resultado imediato, no médio/ longo prazo, da decapitação do professor Samuel Paty, em Paris às mãos do tchetcheno Abdouallakh Anzorov por causa de uma aula sobre liberdade de expressão com as caricaturas de Maomé, é o silêncio da Europa numa próxima acção do czar Putin na Tchetchénia com atropelos aos direitos humanos a roçar o genocídio. Como diria o palerma que apresenta o Joker na RTP 1, "um aplauso para Abdouallakh Anzorov".
Quando os idiotas úteis ocidentais vierem para a praça pública clamar contra a proibição das cabeças tapadas nas ruas e contra a indumentária saco de serapilheira, vulgo burqa, a que estão condenadas as mulheres pelo fundamentalismo religioso, porque é a tradição, porque é a escolha da mulher, porque a mulher até se sente nua se assim não for, porque é a imposição cultural ocidental, porque é o monoculturalismo, por que é o eurocentrismo e blah-blah-blah e outras barbaridades que tais, lembrem-se deste clip e de como a tradição é incutida nas mulheres, logo desde pequeninas que é quando se torce o pepino em qualquer lado do mundo.
Não lhes ocorre que um bom começo seria eles próprios começarem por respeitar o outro, o semelhante, por respeitar as diferenças, a começar pelas religiosas, por respeitar a mulher, por respeitar os direitos humanos.
Agora que a Conferência Episcopal já tomou posição sobre o juiz medieval ao afirmar que "a Bíblia foi usada de forma incorrecta" no acórdão do Tribunal da Relação do Porto sobre violência doméstica e, uma vez que o famigerado também faz referência à "sharia", aguardamos que o líder da Mesquita de Lisboa, David Munir, diga de sua justiça sobre apedrejamentos e justiças maritais de protecção divina sob a égide do poder judicial no Estado de direito democrático, a menos que faça tenção de um dia cair nas boas graças do meritíssimo juiz...