"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
O Correio da Manha [sem til] dá conta que "Luís Capela perdeu a carpintaria nos incêndios. Vítimas ainda não foram ressarcidas do prejuízos nem sabem quando o serão". Alguém, que não os próprios, ainda se lembra disto? E foi só em Setembro... Mas agora Marcelo vai aparecer todos os dias nos telejornais a falar sobre o assunto e vai amiúde visitar os locais como forma de pressionar o Governo. Ou não. E nem é pelo Presidente durante um Governo PS e o Presidente com um Governo da sua cor política, é pela velhacaria para com as populações, usadas sem pudor como armas de arremesso político.
"Morreram [em Tábua] a combater o fogo na floresta de uma multinacional que não quer saber". Ontem na RTP, na reportagem a seguir ao Telejornal. Ah, e tal, o problema não é o eucalipto, o problema é o eucalipto selvagem, o desordenado, do pequeno proprietário que não quer saber, só pensa no lucro, a floresta de eucalipto ordenada é que é. E coise. [Os grandes proprietários não pensam no lucro]. É o responso que há décadas nos tentam enfiar pelos ouvidos. "A empresa de celulose foi convidada a comentar mas não respondeu". Não sabemos se a dupla Procissão Cristas & Pires de Lima, os ministros do eucalipto no Governo da troika de Passos Coelho, foram convidados a comentar.
Uma quinta biológica, uma fábrica de casas de madeira, uma plantação de mirtilos, uma oficina de reparação automóvel, um aviário de pintos, um olival, colmeias, uma malhada de porcos, uma vinha, uma criação de cavalos, tudo levado pelo fogo. Estas têm sido nos últimos dias as reportagens em todos os canais de televisão. Investimentos de uma vida, criação de emprego, criação de riqueza, fixação de populações no interior, apesar do poder central se estar a borrifar para o interior e retribuir com o encerramento de serviços, escolas, tribunais, repartições de finanças, centros de saúde. O famoso "empreendedorismo" com que os papagaios a ocuparem temporariamente cargos políticos aparecem com a boca cheia na propaganda barata a parecer música aos ouvidos de quem ainda quer acreditar. A todas, da quinta biológica à criação de cavalos, um ponto em comum pela boca dos proprietários, investidores, empreendedores, criadores de emprego, "tínhamos tudo limpo à volta e fomos vítimas do fogo que veio do eucaliptal aqui ao lado". O eucalipto, esse grande injustiçado. É perguntar ao ministro da Agricultura pela "esquerda fundamentalista , e alarmista, do ambiente, é perguntar ao poder autárquico do "petróleo verde" que pede adiamentos na aplicação de legislação, é perguntar aos "portas giratórias" que eles confirmam precisamente isso, a injustiça que se faz ao eucalipto neste país.
Em comunicação ao país, com Marcelo ao lado e com o olho no eleitorado do taberneiro, na campanha eleitoral permanente em que se empenharam desde o dia da tomada de posse, Luís Montenegro que há interesses nos incêndios, que quer pulso firme nos incendiários, e até vai falar com a Procuradoria. Vai falar com a Procuradoria. Com Marcelo ao lado. Às malvas a separação de poderes. Imaginem o Montenegro, os minions da direita radical de plantão às redes, os palermas na coluna Opinião no Observador, se fosse um governo "socialista".
Trump foi ao cemitério de Arlington filmar um vídeo para capitalizar eleitoralmente a dor dos familiares dos militares norte-americanos mortos em combate. Pode ser que a fraca memória na política não se lembre de que enquanto presidente dos States os ter classificado como losers.
Luís Montenegro meteu-se num barco de borracha e andou no Douro feito emplastro na busca dos militares da GNR mortos no helicóptero de combate a incêndios despenhado. Na proa levava um assistente que ia registando a operação para a posteridade no Insta, no TikTok, no Face e coise.