"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Andava o general Jaruzelski em cima do Solidariedade na Polónia, sempre com a memória dos tanques de Moscovo em Praga e em Budapeste, e o Vaticano escolhe um Papa polaco. A história conta o resto.
Temos Trump, Vance, e um bando de alucinados a cometerem as maiores barbaridades e atrocidades em nome de Deus, replicados por fotocópias em todas as partidas do mundo, e o Vaticano elege um Papa norte-americano, que fez a vida na América Latina, das ditaduras e dos governos corruptos com o apoio americano, que geram as hordas de migrantes que assolam a fronteira com o México.
Isto é um bocado como as votações do Festival Eurovisão da Canção, com as vitórias para Israel e Ucrânia em tempos diferentes.
Dirigentes políticos que insultaram Jorge Bergoglio de comunista para cima, de minar os alicerces do cristianismo, de destruir a Igreja por dentro - de Trump a Orbán passando por Milei e outros alucinados menores, na primeira fila no funeral do Papa com o silêncio e a cumplicidade de quem agora critica o de comunista para cima Pedro Sánchez por delegar a função na figura do rei. Sonso ou hipócrita [*] o espanhol não é.
Eu acho que este Papa tem prestado um mau serviço ao cristianismo. Acho. Acho que tem mostrado a esquerda revolucionária quase como heroica e a esquerda europeia marxista como a normalidade. Acho que este Papa tem contribuído para destruir as bases do que é a Igreja Católica na Europa e acho que em breve vamos todos pagar um bocadinho por isso.
Hoje é um dia de tristeza e sofrimento para os cristãos do mundo inteiro. O Papa Francisco deixa uma marca inspiradora de proximidade e simplicidade que a todos tocou profundamente. Que a sua vida intensa seja um exemplo para todos os que querem servir a causa pública!🙏
Atormentado pelo gozo e pela culpa, o Presidente chega a ir a Fátima de 15 em 15 dias para rezar. As sondagens menos positivas voltam a mergulhá-lo na solidão [...].
Todas as manigâncias são possíveis, todas as intrigas e jogadas de bastidores são admissíveis, todas as mentiras e meias verdades são ética e moralmente aceitáveis, porque a seguir estamos perante Deus para o perdão, saímos como novos, voltamos às manigâncias, às intrigas e às jogadas de bastidores, às mentiras e às meias verdades, assim sucessivamente num eterno retorno. O Presidente beato católico, do recalcamento da culpa, que obedece à Igreja e responde a Deus, em vez de à Constituição e ao povo, de quem só quer massagens no ego. Temos o que merecemos.
[Na imagem a primeira página da revista do Expresso]
Jesus porém dizia: "Pai, perdoa-lhes, que não sabem o que fazem!" Eles dividiram entre si a roupa de Jesus, depois de terem deitado sortes. Lucas 23:34
O padreco com quem Marcelo fazia panelinha para abafar o nome dos padrecos que abafavam os menores vai ter nome numa ponte. A seguir recebe uma medalha no Dia da Raça. Todos os povos têm as merdas que merecem ter.
Nós, na nossa santa ignorância, pensávamos que a Jornada Mundial da Juventude significava debates, encontros, conferências, simpósios, palestras com direito a interpelações, etc, etc, conclusões, ideias, caminhos a apontar. Afinal o Papa, que às vezes é o Santo Padre e outras Sua Santidade, chega, diz meia dúzia de coisas que alguém com boa formação familiar e humanista ouve em casa desde que nasceu, respeitar o próximo, não discriminar, não olhar de cima, incluir, coise e tal - a angústia de Francisco ao constatar a igreja que herdou para ter de lhe dizer o óbvio, recebe quem muito bem entende receber sem dar cavaco a ninguém nem justificar opções, prontamente interpretados os sinais pelas pitonisas papais, que, pasme-se, são mais que os comentadores de futebol - o Papa quis dizer isto, o Papa quis dizer aquilo [se o quis dizer porque é que não o disse logo preto no branco e deixou a interpretação a cargo de terceiros?], e um grupo de patetas, denominados "jovens", faz barulho para as televisões, excursionistas que na novilíngua equivale a "peregrinos". A ideia de jovem e juventude que a ICAR tem é afinal a mesma desde que Pedro que, ao contrário do Papa ainda não era santo, pisou as ruas de Roma: os velhos falam e os jovens abanam o rabo com a língua de fora e vão encarneirados tomar o "corpo do Senhor". Amém.
Depois do relambório que foram os milhões do contribuinte despejados em cima do Papa, que não queria que despejassem dinheiro em cima dele, isso era coisa dos mortais, que também não sabiam que o dinheiro que iam despejar era assim tanto, e mais o palco que o Papa também não queria tamanho dum filme do William Wyler, isso era coisa dos mortais, que também não sabiam que o palco era tamanho dum filme do William Wyler, caso contrário nem tinham planeado outro, no Parque, tamanho do Quo Vadis, onde o Pedro, que ainda não era santo, fez um comício à luz da tocha dentro dum buraco aproveitando a inclinação do terreno.
E assim, à medida que o dinheiro que o Estado laico vai "investir" no picnicão da Igreja católica ia caindo nos telejornais, o ouvido do povo foi-se habituando à melodia, como aquelas músicas que não valem a ponta de um báculo mas que à força de serem passadas na rádio vão vendendo e chegam ao primeiro lugar do top. E depois nem eram tantos milhões assim quanto isso que os gajos são de boas contas com o dinheiro que não é deles e corrigiram prontamente e agora são poucos milhões assim quanto isso, e os palcos já não são tão grandes assim, são um cadinho menos tão grandes assim, e o da beira-rio vai servir para o Moedas trazer o Coachella e o Glastonbury e o caralho para Lisboa, vocês vão ver, ele até foi falar com os comerciantes da zona para manterem o comércio aberto, disse na televisão, não pode dizer que não disse, está gravado, porque os atrasados nem sabiam que podiam ganhar numa semana o que habitualmente ganham em dois meses, agradeçam ao Moedas esta lição de economia e empreendedorismo.
E no meio do barulho das luzes o "morreram todos" fez um telejornal em cima do palco, inaugurou-o, #ChupaFrancisco, e ninguém já repara nem no preço da alcatifa, apesar de assim a coisa estar ao contrário, o tal de sofrer na vida terrena para ganhar o Reino dos Céus, onde não há cardos nem picos, não é preciso a tal da alcatifa que está no palco, agora quero ver a cara do padre com a ladainha do sofrimento depois do chão alcatifado.
Nem ninguém repara na única limpeza a que a câmara de Lisboa meteu mãos à obra desde que o camarada Moedas foi eleito presidente, a dos sem-abrigo da Avenida, ainda assim o senhor Francisco a meio da celebração fosse desatar a cantar "webaba silale maweni, webaba silale maweni, homeless, homeless, moonlight sleeping on a midnight lake, homeless, homeless" do Paul Simon perante o horizonte visual poluído até à Praça do Comércio, aqueles homeless onde o Marcelo vai com as televisões atrás entregar sopa e dizer boa-noite, calado que nem um rato, o Marcelo, beato.
Nem ninguém repara na mudança de nome do Alto do Parque para Colina do Encontro, estou mesmo a ver num futuro próximo, entram num táxi "leve-me à Colina do Encontro" e o taxista a olhar de lado "quem é este pacóvio?" .
Como dizia o Mateus em 19:16 "É mais fácil um camelo passar por o buraco duma agulha que um rico". Os camelos somos nós, apesar do dinheiro dos ricos ser nosso.
Negociar o quê, com quem, em que moldes? Edgar Clara, 48 anos, pároco de Castelo, Santiago, Socorro e São Cristóvão e São Lourenço, e capelão do Hospital Egas Moniz, não diz. Mas se calhar também não é preciso dizer. A avaliar pelo que foi a punição aplicada pela Igreja Católica aos abusadores, saltitarem levemente de paróquia em paróquia enquanto iam desfrutando dos prazeres do silêncio de novos inocentes. Que este senhor tenha a soberba lata de escrever isto nas páginas de um jornal, que sinta a Igreja armadilhada, diz muito do reino da impunidade no reino dos céus que tem sido décadas da "palavra do Senhor".