"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
"O mostrengo que está no fim do mar Na noite de breu ergueu-se a voar; À roda da nau voou três vezes, Voou três vezes a chiar, E disse: Quem é que ousou entrar Nas minhas cavernas que não desvendo, Meus tectos negros do fim do mundo? E o homem do leme disse, tremendo: El-Rei D. João Segundo!
De quem são as velas onde me roço? De quem as quilhas que vejo e ouço? Disse o mostrengo, e rodou três vezes, Três vezes rodou imundo e grosso,
Quem vem poder o que só eu posso, Que moro onde nunca ninguém me visse E escorro os medos do mar sem fundo? E o homem do leme tremeu, e disse: El-Rei D. João Segundo!
Três vezes do leme as mãos ergueu, Três vezes ao leme as reprendeu, E disse no fim de tremer três vezes: Aqui ao leme sou mais do que eu: Sou um Povo que quer o mar que é teu; E mais que o mostrengo, que me a alma teme E roda nas trevas do fim do mundo; Manda a vontade, que me ata ao leme, De El-Rei D. João Segundo!"
O pontapé de saída havia sido dado por Joacine Katar Moreira quando, no primeiro dia como deputada, papagueou qualquer coisa sobre o colonialismo e a escravatura enquanto posava à sombra do óleo de Domingos Rebelo no Salão Nobre da Assembleia da República com a representação da recepção de Vasco da Gama pelos emissários do Samorim de Calecute. Tudo a ver.
Agora, à boleia da revisão da História em curso nos Estados Unidos e em Inglaterra, um qualquer imbecil vandalizou a estátua do Padre António Vieira em Lisboa, precisamente ele, uma voz à frente no seu tempo, contra a escravatura e defensor dos índios brasileiros, perseguido pela Inquisição. É o triunfo da ignorância.
Já estamos todos habituados à pobreza de léxico e ao discurso infantil, capaz de envergonhar uma criança da escola primária, de Donald Trump, o oito a seguir ao oitenta Barack Obama. Custou mas foi, não há nada a que o ser humano não se habitue.
Já estamos todos habituados à boçalidade de Bolsonaro e à burrice de Abraham Weintraub, o ministro da Educação do Brasil que escreve "imprecionante", "suspenção" e que confunde Franz Kafka com kafta, um prato árabe.
Agora vamos habituar-nos à ignorância, aos erros ortográficos, aos erros de concordância, à confusão de conceitos do líder do Chaga [não é gralha]. "Bertol Brecth", "Dostoywesky", "massiço", "chisato", "solarengo", "despoletar", "há dez anos atrás", "buçal", replicados pelos aios e escudeiros, gente que não sabe a diferença entre um acento grave em "à" e um acento agudo em "ás" e que se calhar até pensa que é assento, que escreve República sem acento agudo no u, que confunde Presidência com Previdência, ou talvez não, nas mãos do líder Ventas seria "Previdência e Abono de Família". Gente que nos idos de quem têm saudades apanhavam 25 reguadas em cada mão e iam para o canto da sala com umas orelhas de burro enfiadas cornos abaixo.
Ou o abstencionismo ignorante que dá vitórias à direita.
"Viemos ver, isto é um acontecimento, antes isto do que a política, não é?"
Na estacada da marina de Cascais a assistir às operações de desencalhe do petroleiro "a professora Ana com a aluna Carolina" [sic], ao colo, em directo para o telejornal da televisão do militante n.º 1.