"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Muito mais impressionante do que o saco de vacuidades, banalidades, lugares-comuns e falta de rigor, que dá pelo nome de Guião para a Reforma do Estado, é o espírito de missão e sacrifício, a capacidade de sofrimento dos aios, escudeiros e cavaleiros da maioria, todos os dias a todas as horas na comunicação social, para apresentar como ouro um monte de esterco ideológico, que não é Guião coisíssima nenhuma, que não se propõe reformar coisíssima nenhuma, que não é base de trabalho coisíssima nenhuma, quanto muito um programa eleitoral para uma hipotética AD 2.0.
Podíamos interrogar-nos da legitimidade de um sindicato sem implantação no terreno ou qualquer género de influência que não em alguns sectores dos serviços, ligados aos bancos e às seguradoras, para assinar e fazer valer concertações sociais e códigos do trabalho, minudências. Se por um lado a CGTP aparece como correia de transmissão das decisões do Comité Central do PCP, a UGT com o seu sindicalismo de homenzinho muito responsável e bem comportado e prenhe de “sentido de Estado”, desde os célebres brindes com cálices de Porto, entre Torres Couto e o senhor Silva primeiro-ministro, até á concertação social assinada por João Proença e Pedro Passos Coelho, dispensa adjectivos já que é muito substantiva.
«Como o exemplo deve vir de cima o documento prevê algumas reformas dos ministérios […] uma integração gradual e respeitando especificidades das funções jurídicas e contenciosas dos ministérios, o Estado precisa de se capacitar juridicamente para defender o interesse público e não deve recorrer ao outsourcing, não deve ir buscar fora do Estado a qualidade jurídica para defender o interesse público, pode e deve fazê-lo a partir de uma agregação de departamentos de contencioso e departamentos jurídicos que existem nos vários ministérios, ganhando escala, ganhando recursos» [Apresentação do Guião para a Reforma do Estado, partir do minuto 20:08]
«Governo bate recorde em gastos com escritórios de advogados.
A embrulhar a desresponsabilização total do Estado, via entrega a privados, daquelas que são as suas funções base e essenciais, escrito em Arial 16, com 3 toques na tecla de espaço entre cada linha, para preencher 112 páginas com aquilo que cabia em 30 [elucidativa a ideia subjacente do calhamaço cheio de rococós e vazio contraponto ao minimal directo e com substância, muita parra pouca uva, vox pop], pela mão do mais oco protagonista político de que há memória que, acossado por todos os flancos, obrigado a dar, por uma vez na vida, a cara, desresponsabiliza para canto na esperança de que o ruído criado lhe permita sair de mansinho debaixo do foco dos holofotes e regressar aquilo que melhor sabe fazer: manobrar e intrigar na penumbra do backstage. O Principio de Peter em todo o seu esplendor.