"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
As misericórdias, os maiores proprietários imobiliários nas cidades de norte a sul do país. As misericórdias, onde para meter um familiar num lar é necessário uma doação de milhares de euros, ou uma propriedade e/ ou imóvel que fazem o tal património, e uma propina mensal de muitos salários mínimos. As misericórdias, onde apesar das quotizações cobradas aos "irmãos" tudo custa os olhos da cara, desde fisioterapias a apoios domiciliários passando por actividades ocupacionais. As misericórdias, o albergue do emprego para a vida das distritais do PSD e CDS. As misericórdias dão ultimato ao Governo.
Se por um azar morrer algum familiar de um governante [toc-toc-toc três vezes na madeira; lagarto, lagarto; salvo seja e todas aquelas coisas que é normal dizer] o Governo pára, por via dos dias de nojo consignados em lei. Pai/ mãe/ sogro/ sogra/ conjugue: 5 dias; irmão/ irmã: 3 dias; primos: dia do funeral, etc. , etc. . E não é difícil imaginar todos os constrangimentos que isso traz ao governo, com letra pequena, da Nação.
Dois anos depois e das trapalhadas com os bancos, herdadas do anterior Governo, resolvidas e com o sistema financeiro estabilizado; com todas as metas estabelecidas cumpridas, sem recurso a extraordinários; com a economia a crescer e as exportações no mesmo sentido; com o défice mais baixo da democracia; com o PIB a aumentar e o desemprego a regredir até aos números de 2008; com o país fora do procedimento por défice excessivo, contrariando as ameaças de Bruxelas ao anterior Governo; com a Standard & Poor’s a reavaliar positivamente a notação do país; com as taxas e sobretaxas anuladas e o rendimento restituído às pessoas e às famílias; com a oposição a brandir os incêndios de Verão, o paiol de Tancos, o jantar no Panteão, a legionella na chaminé do hospital, o Infarmed no Porto e a comemoração paga à Universidade de Aveiro para assinalar o 2.º aniversário do Governo. Como diria Assunção Cristas, "um Governo preocupado só com a sua imagem".
Rui Medeiros, o constitucionalista que atestava a constitucionalidade dos diplomas do Governo PSD/ CDS declarados inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional.
Fernando Negrão, da demissão do cargo de director da Polícia Judiciária no quadro do processo Moderna [que chegou a envolver Paulo Portas] por suspeitas de violação do segredo de justiça. De Setúbal para Lisboa, de Lisboa para o Parlamento, onde ainda ontem não foi eleito presidente porque os socialistas-comunistas-esquerdistas-anarquistas não respeitam a tradição. Contra a democracia marchar, marchar.
«[...] ausência de fornecimento por parte do governo e da coligação de informação indispensável ao suporte financeiro das medidas que apresentaram e que é indispensável para podermos avaliar da consistência e da credibilidade do exercício que nos é apresentado.» [A partirt do minuto 02:49]
E depois havia a tradição. O filho do pedreiro era pedreiro, o filho do pescador era pescador, o filho do sapateiro era sapateiro, o filho do trabalhador rural era trabalhador rural, que por acaso era camponês, e por aí, e andavam na escola até à quarta classe a aprender que D. Afonso Henriques tinha sido o primeiro rei de Portugal e que em 1385 tinha havido uma batalha em Aljubarrota onde tínhamos dado nos cornos dos espanhóis, os rios do Continente, as plantações das Ilhas Adjacentes e os caminhos-de-ferro do Ultramar, a escrever o nome para quando fossem tirar o bilhete de identidade ao registo civil e a tabuada de cor e salteado para contar os trocos e o rol a pagar na mercearia no final do mês. O filho do rico era o filho do rico e o filho do doutor era o filho do doutor, categoria que abrangia todos os doutores de todas as categorias à face da terra, à excepção do engenheiro que era senhor engenheiro e era filho do senhor engenheiro. As mulheres eram as mulheres com a nuance de poderem ser mulheres ricas ou mulheres pobres, mulheres dos ricos ou mulheres dos pobres, quietas lá no seu sítio de donas de casa e parideiras. Na Santa Paz do Senhor, Amém.
Depois vieram os comunistas e os anarquistas e os socialistas e os esquerdistas e os do reviralho e ficou tudo de pernas para o ar e já não se percebe quem é quem. E é preciso um electricista e já não há electricista, só se for um brasileiro, que o filho do electricista agora é engenheiro. E é preciso um estucador e já não há estucador, só se for um preto qualquer das ex-colónias, que o filho do estucador agora é advogado e preto estucador é o pai que os filhos dos pretos estucadores andam no gamanço e a vender droga. E depois é preciso um canalizador e já não há canalizador, só se for um ex-comunista qualquer do leste da Europa, que o filho do canalizador agora é médico. Onde é que já se viu?!
E há que corrigir estas distorções à tradição e ao normal funcionamento da sociedade e isso consegue-se dando às famílias a possibilidade de escolher a melhor escola que dê o melhor ensino e a melhor educação aos seus rebentos, coisa até agora impossível de conseguir por causa do interregno que foi o fim da tradição imposto de fora pelos outros, sem respeito, comunistas e anarquistas e socialistas e esquerdistas e do reviralho.
E o senhor Presidente do Conselho preocupava-se com as coisas que eram de preocupação e os trabalhadores preocupavam-se com as coisas que eram de trabalhar e os colaboradores preocupavam-se com as coisas que eram do colaboracionismo e os engenheiros com as coisas que eram da engenharia e os doutores com as coisas que eram dos doutores, em geral, e da medicina, em particular, e não haviam cá estas democracias da democracia e de haver eleições onde ninguém elege um primeiro-ministro, quanto mais um Presidente do Conselho, mas onde são eleitos deputados que formam maiorias.
E pode o partido que não ficou em primeiros no final da contagem formar Governo, com o suporte da maioria dos deputados que foram eleitos para formar maiorias e não para eleger primeiros-ministros, e governar? Não pode, por causa da tradição.