"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
A amnésia accionista aguda começa a ser uma doença característica dos militantes do PSD, particularmente da tralha cavaquista. Diz que não se lembra de nada...
[E se for, como diz o professor nas suas marcelices semanais na televisão, o Quinquinhas da Fonseca Benevides, o Ministério Público também passa um papel de 25 linhas, assinado e carimbado, a atestar a idoneidade do "suspeito"?]
Seria interessante saber a que é que se deve essa suspeita, se ao FMI não saber a ponta de um chavelho daquilo que anda a fazer e se limitar a assinar de cruz tudo o que o Governo lhe dá para assinar, se ao FMI ter os ricos em tal grau de consideração e os achar, moral e eticamente, incapazes de tal coisa. Em qualquer das hipóteses o factor Governo não é despiciendo.
Entretanto, e pelas voltas que a justiça às vezes dá, vê-se envolvido, ainda que por interpostas pessoas, numa investigação de crimes de fraude fiscal qualificada, branqueamento de capitais, tráfico de influências, corrupção e abuso de informação privilegiada em processos de privatização.
Esqueceu-se. Tipo andar com os óculos na testa à procura deles. Tipo querer sair de casa e andar com a chave na mão à procura dela. Tipo guardar o sobretudo no roupeiro no final do Inverno e, quando chega o frio no ano seguinte, descobrir que estavam €5 e um lenço de papel esquecidos num bolso, ou um maço com os cigarros já amarelados. Acontece a qualquer um.
Só 6 – seis – 6 mil?! Sinceramente que não vejo motivo para tão grande espanto; até parece que acabaram de inventar a roda ou de descobrir a pólvora!
Tomemos um flagrante exemplo de “muitas vezes seis mil”: as IPSS. Nomeadamente no que concerne aos infantários, creches e jardins-de-infância.
As mensalidades são pagas consoante os rendimentos da família, cuja prova é feita através do documento comprovativo da entrega do IRS. Até aqui tudo normal.
A anormalidade começa quando, numa mesma sala, classe ou turma, encontramos no escalão mínimo de mensalidades, crianças cujos pais são, por exemplo, um casal de advogados. Ou filho de pai arquitecto e mãe médica. Ou de outra qualquer denominada profissão liberal por conta própria. E, nos escalões seguintes, acima da mensalidade mínima, filhos de casais que trabalham, por exemplo, nos serviços; ou em que o pai é empregado da construção civil e a mãe empregada de comércio. Ou simplesmente empregados por conta de outrem.
É uma multiplicação de muitas vezes mil, onde os que deveriam ser os principais beneficiados são os mais prejudicados. Duas vezes. Pela mensalidade que pagam; por pagarem para aqueles que auferem rendimentos superiores aos seus. Prevertendo-se assim o próprio conceito de IPSS.
Adenda:esta não deixa de ser uma boa pergunta. Apesar de, pessoalmente, preferir os métodos indiciários, ou sinais exteriores de riqueza, à imagem do que acontece, por exemplo, na Grã-Bretanha.
Segundo o Público, (sem link) o relatório da Provedoria da Justiça resultado de uma acção de inspecção a 11 serviços de finanças entre Junho e Agosto de 2006, revela-se arrasador do “estado da Direcção-Geral dos Impostos (DGCI) sob a direcção do seu anterior responsável máximo, Paulo Moita Macedo”.
“Contas bancárias totalmente congeladas em resultado de penhoras fiscais independentemente do valor da dívida; penhoras de vencimentos e de ordenados que ultrapassam os limites estabelecidos na lei; liquidação de juros de mora, umas vezes por excesso, outras por defeito; cativação de reembolsos de IRS sem que estejam esgotados os meios de defesa dos contribuintes; situações em que são os contribuintes a avisarem os serviços de finanças de que impugnaram as liquidações que lhes foram efectuadas; e penhoras efectuadas depois de ultrapassado o prazo de prescrição das eventuais dívidas ficais.”
Paulo Macedo, que para alguns opinion-makers e para a classe política que se senta nas bancadas à direita no Parlamento era o insubstituível, o paradigma da virtude e da eficiência do sector privado quando chamado a tomar conta da cousa pública, desde que, obviamente, devidamente remunerado, veio afinal a revelar-se que padecia de um mal; aquilo que algum sector privado tem de pior: o autoritarismo, a arrogância e o poder discricionário do patrão da revolução industrial portuguesa e que teimosamente teima em persistir no Portugal do sec. XXI. Vale tudo quando o objectivo é criar riqueza; este princípio quando aplicado ao Estado dá os resultados que o relatório aponta.
No mesmo dia em que o relatório é apresentado, ouvimos todos o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais dizer na Comissão Parlamentar de Orçamento e Finanças, com todas as letras e alto e bom som que, “alguns empresários deviam ter vergonha da sua actuação" porque fogem ao fisco, cometem fraudes fiscais e, de caminho, ainda lavam uns dinheirinhos.
Expliquem-me como se eu fosse muito burro: e ao Estado, via secretário de Estado, só lhe resta vir para a praça pública lamuriar-se? O que andou mais a fazer Paulo – o incorruptível – Macedo pelo fisco, além de continuar a receber o salário que recebia no privado e a chatear quem não tinha fuga possível? Há lobies nas Finanças? Ou tudo isto não passa de flexigurançafiscal?