"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Atormentado pelo gozo e pela culpa, o Presidente chega a ir a Fátima de 15 em 15 dias para rezar. As sondagens menos positivas voltam a mergulhá-lo na solidão [...].
Todas as manigâncias são possíveis, todas as intrigas e jogadas de bastidores são admissíveis, todas as mentiras e meias verdades são ética e moralmente aceitáveis, porque a seguir estamos perante Deus para o perdão, saímos como novos, voltamos às manigâncias, às intrigas e às jogadas de bastidores, às mentiras e às meias verdades, assim sucessivamente num eterno retorno. O Presidente beato católico, do recalcamento da culpa, que obedece à Igreja e responde a Deus, em vez de à Constituição e ao povo, de quem só quer massagens no ego. Temos o que merecemos.
[Na imagem a primeira página da revista do Expresso]
A 13 de Maio de 1917 Portugal mudou para sempre. Fomos escolhidos! Também eu senti esta mudança profunda num 13 de Maio da minha vida. Hoje sinto, sei, que de alguma forma a minha missão política está profundamente ligada a Fátima. É este, talvez, o meu grande Segredo.
Apanhados de calças nas mãos, como em Abril de 1974, sem discurso, sem tema, sem guião, completamente à nora a direita radical abala a correr para os braços da Santa Madre Igreja, também como em Abril de 1974, hoje a propósito de umas comemorações do Dia da Liberdade, que tentou misturar com o ir passar a Páscoa à terrinha, e com o Dia do Trabalhador a equivaler a uma peregrinação a Fátima, numa gorada tentativa, como em Abril de 1974, de provocar uma fractura entre o povo e o poder político, agora eleito, misturar tudo o que se quer separado - Deus e César. Só que desde Abril de 1974 a Igreja católica mexeu-se, pouco mas mexeu-se, e, com raríssimas excepções, ignorou o apelo dos desesperados e manteve as distâncias. A direita radical, essa, continua exactamente no mesmo sítio onde Salgueiro Maia a foi encontrar, de pais para filhos, de filhos para netos, sem bulir. São tão previsíveis, benza-os o Bispo e a Senhora de Fátima.
Ontem, a propósito da visita de Jorge Mario Bergoglio a Fátima, foram repostas as fronteiras terrestres. À parte a piada feita que é repor as fronteiras terrestres a pretexto da segurança de alguém que reclama o estatuto de secretário de Deus no planeta Terra, as televisões estavam lá todas, desde Quintanilha a Vila Verde de Ficalho, passando por Vilar Formoso e Caia, para mostrar que os possíveis eventuais malfeitores terroristas atentadores da vida e da segurança do Papa Francisco têm todas as portas barradas pelos guardas fronteiriços de ocasião. Não podem entrar. Aliás, só entravam a partir de ontem e exactamente a contar da hora do fecho das ditas.
O aspecto mais curioso, chamemos-lhe assim, do argumentário justificativo da tolerância de ponto dada aos funcionários públicos aquando da visita de Francisco, Papa, a Fátima, ou à cova Deiria, como dizem as televisões, argumentário comum ao Governo, aos partidos da 'Geringonça' e à direita radical beata, uma verdadeira 'união nacional', prende-se com o facto de "muitos portugueses manifestarem interesse em se deslocarem ao santuário", por coincidência, e só por coincidência, todos funcionários públicos, que no Estado laico o sector privado não tem tempo para terços nem se governa com Pais-Nossos e Avé-Marias.
Em nome da Função Pública e com a benção dos partidos da 'Geringonça', ateus-agnósticos-jacobinos-laicos e religiosamente multi coloridos mas com a base eleitoral de apoio à sombra do Estado.
Crescemos todos a ouvir a avó Ilda, que nasceu era D. Manuel II El Rei de Portugal e morreu com Jorge Sampaio na Presidência da República, contar como foi ir de Setúbal a Fátima, ela e os irmãos, de charrete com os pais, estradas só de nome, dormir ao relento onde os cavalos pediam e lá, na Cova de Iria, e depois toda a gente a olhar para o ar no dia do "Milagre do Sol", ela também, e jurar a pés juntos não ter visto nada nem sequer ter percebido o porquê de estar toda a gente a olhar para cima. Valeu pela aventura da viagem. Lembrei-me a propósito do insólito no Diário de Notícias.