"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Contava o malogrado Jorge Palhas que chegado à Argélia por via terrestre não o tinham deixado entrar porque vinha de Marrocos com quem estavam de relações cortadas, por causa de guerras antigas e da Frente Polisario, e que regressado a Marrocos, pelo mesmo caminho e apenas alguns minutos depois, os mesmos guardas fronteiriços que havia pouco o tinham visto sair agora não o queriam deixar entrar porque vinha da Argélia com quem Marrocos estava de relações cortadas, por causa de guerras antigas e da Frente Polisario, tendo ele ali permanecido, em "terra de ninguém", um dia inteiro à conversa com os ditos fronteiriços e só conseguindo voltar a entrar depois da mudança da guarda e pelo seu conhecimento do Alcorão. E ria-se muito de todas as vezes que contava a história.
Mais uma vez a extrema-direita a cumprir a função para a qual foi criada: perpetuar no poder a direita do "sentido de Estado", com o voto da "aliança europeísta" constituída para derrotar a extrema-direita e salvar a Europa. Se o ridículo matasse...
"Can you really cough it up loud and strong The immigrants They wanna sing all night long It could be anywhere Most likely could be any frontier Any hemisphere No man's land and there ain't no asylum here King solomon he never lived round here
Ainda sou do tempo em que os U2 eram magros e genuínos e que foi mais ou menos por entre 1980 com Boy e 1983 com o inaudível War, quem disser que o conseguiu ouvir de seguida da primeira à última faixa está a mentir, passando por 1981 com October, no tempo de tocarem para umas quantas centenas em Vilar de Mouros, que na sua grande maioria nem sequer lá tinham ido por eles, e no tempo em que não faziam "grandes músicas" para a RFM passar e as que eram realmente grandes iam parar ao Index.
Depois veio a cedência comercial The Unforgettable Fire, que a vidinha custa a todos, e é legitímo e cada um escolhe o caminho que quer trilhar e, fezada, logo no ano seguinte, na embalagem do sucesso global (Feed The World) Do they Know It's Christmas Time pela Band Aid, vem o Live Aid, que cai que nem ginjas numa juventude globalizada, a ressacar da new wave e do pop manhoso dos 80s, sem choque de gerações e órfã de grandes causas. Alimentou-se África e o 'Virgin Prune" frontman Bono, que já tinha perdido a virgindade e que de ameixa não tinha nada, rapidamente percebeu que quanto mais aparecesse e quanto mais desse a cara ao manifesto mais pingava. E foi um fartote. ONU, presidentes, ministros, governos, era ir a todas e até a Davos, Mandela, meter umas imagens fortes nos ecrãs dos concertos ao vivo e umas palavras do Dr. King, beija-mão papal, o Papa a beijar a mão a Bono, e era o "nosso" homem global, a "nossa" voz, o "nosso" líder a bater o pé às corporações, às marcas, aos donos do mundo Nem sei se não ganharam um Nobel qualquer, os U2 por interposta pessoa, o vocalista.
Alimentaram-se assim e engordaram os U2 e, como diz o pagode, "dinheiro puxa dinheiro" e como o dinheiro é sempre pouco e um músico não dura sempre, vai de retirar o dinheirinho da querida Irlanda e depositá-lo na Holanda, que isto é tudo Europa e a carga fiscal é mais baixa. E, como diz o pagode "dinheiro puxa dinheiro" e como o dinheiro é sempre pouco e um músico não dura sempre, vai de investir através de paraísos fiscais, que é tudo legal, não há aqui qualquer espécie de crime, não há aqui nada para ver, é circular, é circular.
Mas, como já são muitos anos a virar palcos e a fazer depósitos bancários e África saiu da agenda mediática e o mainstream não importuna nem políticos nem multinacionais, há que inventar uma bandeira para enfeitar os concertos, e o nacionalismo e o autoritarismo e o Steve Bannon e o Orbán e o Salvini estão mesmo aqui à mão, mesmo que se alimentem de apontar à opinião pública dos respectivos países os ricos e os poderosos que fogem a pagar os impostos nos países de origem e investem o pecúlio amealhado pelos labirintícos paraísos fiscais, de bandeira da união Europeia na mão e na lapela do casaco.
"A Europa ficou muito desiludida com Itália" diz, sem se rir, Frans Timmermans, vice-presidente da Comissão Europeia, e sem perceber que o resultado destas eleições é consequência da Itália ter ficado muito desiludida com a Europa.
Mário Centeno, ministro das Finanças de um Governo, parafraseando a direita radical, constituído, contra a tradição, por um partido que não ganhou as eleições, é candidato a um cargo que legalmente não existe nem é consignado em nenhum tratado europeu, e que, oficialmente, define a política económica dos governos dos diversos estados europeus, eleitos em eleições livres e democráticas. Siga para fim-de-semana.