"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Começa a avença a mentir com quantos dentes tem na boca, foi o PP, desde o primeiro minuto, o único a assacar culpas à ETA pelos atentados, e continuou Aznar contra todas as evidências a apontar o dedo aos etarras, já a investigação policial criminal apontava para o terrorismo islãmico. Daí até ao trucidar de partido nas urnas foi menos de um fósforo. Um peru menor. Não havia redes sociais mas tínhamos os blogues no apogeu a passarem informação em tempo real mais rápido que as agências de informação e os media tradicionais. Outro peru menor. Entusiasmada continua. Ela em pequenina ia a Espanha e pelo caminho os pais e os irmãos "aqui foi assassinado pela ETA o não sei quantos, ali foi assassinado o não sei quem", o chamado turismo terrorista. Não se levam herdeiros dos terroristas para o Governo, a menos que sejam franquistas. Ou ex bombistas do MDLP, sentados no Parlamento nas cadeiras onde antes se sentavam os doutores do CDS e que servem de base de apoio ao Governo PSD nos Açores. Ou se o PP fizer um acordo com o EH Bildu em Vitoria, os terroristas bons, com sentido de Estado, porque o PSOE está a sequestrar a democracia. Ela depois faz uma adenda.
Quando íamos a España o meu pai também pelo caminho "ali a ETA matou sicrano", "aqui o Paquirri cortou 3 orelhas e 1 rabo", "acolá os GAL meteram uma bomba", "aqui fazem umas tapas de boquerones en vinagre que são um espectáculo". A minha família sempre foi muito ecléctica. Não tenho é jeito nenhum para a escrita. Nem para me movimentar nos meandros do amiguismo lisboeta.
"Sou comentadora porque passei anos a escrever - bem - em blogues. E depois passei anos a escrever - bem - em jornais", escreveu a escrivã um destes dias no Twitter.
Respeitar o funcionamento da democracia e a vontade expressa nos votos dos eleitores é governar quem tiver maioria parlamentar, tenha ou não ganho as eleições. Como nos Açores, como convinha ao PSD. E chama-se democracia parlamentar constitucional. Parece haver especialistas mais especialistas que os especialistas. Especializaram-se. Diz que este senhor é vice-presidente do PSD.
O patriota abalou todo lampeiro para Madrid com a fezada de aparecer na varanda ao lado do chefe da nova falange que apresenta o mapa de Espanha com Portugal incluído, sem as fronteiras da nação mais velha da Europa assinaladas. É tudo nosso, dele, do espanhol. E o patriota não apareceu à janela com o cabelo à Lua, não por causa do mapa de Castela mas porque a dose de presunto foi cortada para metade e na sede da nova falange só houve melão para o jantar.
Tinha para aí 10 anos fui com os meus pais à Semana Santa em Sevilha. As gajas descalças na procissão a chover, os gajos de Klu Klux Klan e o caralho. Grande cena para um puto. Ao almoço, num restaurante qualquer, "o que é que queres?" pergunta o meu pai, "um bife de cerdo" respondo. Um silêncio instantâneo no restaurante, a espanholada toda a olhar para a nossa mesa, o garçon com cara de quem ia ali mesmo na gravata do meu pai amolar uma faca para me decapitar, o meu pai mais rápido que a própria sombra "ele vai comer calamares", e eu "porque é que não posso comer um bife?", a minha mãe "xiu, não se fala mais nisso". Foi o meu primeiro choque com os talibãs antes de haver talibãs. A religião não é o ópio do povo, como dizia o outro, a religião lixa é o bife ao povo.
Quase duas décadas passadas o ídolo da direita radical e ilusionista liberal do tugão repete o mantra que os apóstolos lusitos escreviam nos blogues - Blasfémias, O Insurgente, 31 da Armada, replicado do Tea Party de Ron Paul, Sarah Palin, Michele Bachmann, que elegiam, ambos, os de lá e os de cá, Al Gore como alvo preferencial, "desconstruído" pelo humor reaccionário do The People's Cube, e que serviria para abrir caminho à MAGA de Donald Trump e inspirar a réplica imbecil em terras de Vera Cruz :
Ayuso dice que la lucha contra el cambio climático favorece el comunismo y que la izquierda va "contra la evidencia científica"
António Costa e o Partido Socialista governaram como a direita queria:
não se pôs um travão ao aumento das rendas de casa por ser um ataque ao investimento privado na recuperação dos imóveis urbanos, depois de décadas ao abandono e à degradação, nem nas outras rendas, as das energéticas e das PPP rodoviárias, por exemplo, que o Estado tem de honrar os compromissos e não pode dizer que agora afinal não senhor, acabou-se a mama;
não se taxaram as empresas com maiores lucros, nem com lucros conjunturais devido à pandemia ou à invasão russa da Ucrânia, que isto não é a União Soviética, nem o socialismo, nem tampouco a Venezuela, e ainda corríamos o risco de deslocalizarem para a Taprobana onde o mercado é mais liberalizado e amigo do investimento;
teve um arremedo de baixa de imposto sobre combustíveis, rapidamente absorvido pela margem de lucro das gasolineiras, e depressa deixou de ser uma vitória do Ilusão Liberal reclamada em cartaz na rotunda, para cair no esquecimento ou do "mais vale estar calado que fazer figura de urso" a reivindicar coisas que até um puto da primária percebe o logro;
deu 60 paus de ajuda alimentar a cada família carenciada enquanto os espanhóis se esticaram até aos 200, mas também não é por aí, que dar dinheiro vivo a calaceiros e manhosos é incentivo à chulice de quem não quer trabalhar e fazer pela vida, como defende a direita, e se têm fomeca está cá o Banco Alimentar e o voluntário Marcelo, que até sai mais barato ao Estado que sai do bolso e do bom coração dos compatriotas que recusam a lei da selva do direito do mais forte à sobrevivência, princípio ético e moral do liberalismo;
e o pasquim que passou 5 anos a acusar o PS de governar a toque de caixa dos parceiros da esquerda geringonça, a apontar os males que isso trazia, trouxe ao país, e com reflexos nas décadas vindouras, agora chora porque afinal os socialistas não governaram como os comunas e os esquerdalhos queriam que governasse.
A Judiciaria já fazia uma investigação, com um daqueles nomes pomposos, imagem de marca, que costumam abrir telejornais, tipo "Operação Papel para Forrar o Balde do Lixo", sobre como é que jornais que não vendem, i e Sol, por exemplo, estão sempre nas bancas e no online ao minuto.
"Agenda Espanha": Os fascistas foram a Espanha dobrar a espinha a fazer vénias a um partido que tem na agenda não escrita uma Ibéria una sob a égide de Castela e com capital em Madrid. Dizem-se patriotas, os traidores.