"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
A base de recrutamento das "tropas especiais" e, sobretudo a dos Comandos, os principais fornecedores de "matéria prima" são bairros como o da Bela Vista em Setúbal, a Cova da Moura na Amadora, Chelas/ Zona J e Galinheiras em Lisboa, Quinta do Mocho em Sacavém, o do Cerco e o do Aleixo no Porto, o Vale da Amoreira na Baixa da Banheira, a Quinta da Princesa no Seixal, etc. , etc. , os designados bairros problemáticos, onde os miúdos crescem nas ruas, entregues a si próprios, na aprendizagem do direito do mais forte à liberdade e que, chegados à idade adulta, encaram o voluntariado numa tropa de elite como parte do seu percurso natural, sentido de pertença a uma família, fuga ao desemprego polidor de esquinas e trambolhões nas ruas, daí o "jornal" soma 2 mais 2 e o resultado dá igual a 5, como se de uma operação concertada se tratasse, uma coisa assim ao estilo das células soviéticas infiltradas nos Estados Unidos nos idos da Guerra Fria à espera de um sinal de Moscovo. Jornalismo de qualidade é no Jornal i. E filmes de espiões também.
E já que estamos em época Pascal e a coisa leva automaticamente a coelhos, e dos coelhos até ao Coelho e ao desmantelamento do Estado e à destruição do tecido económico e ao desemprego e à recessão e à desestruturação social e familiar e ao aumento da miséria e das desigualdades é um pulinho, vejamos o que nos diz o Urban Dictionary sobre "O Caminho do Coelho": «you are unable to distinguish normal reality from the magical reality that has taken hold of your mind». Pois…
Começa a ser uma tradição: os putos vão asneirar para Espanha em excursão de finalistas e, no derradeiro minuto antes da passagem da fronteira, uma operação conjunta GNR / câmaras de televisão. Apreensão de uns charros, identificações, notificações e só faltou aparecer o ministro Rui Pereira a congratular-se e a felicitar as suas “tropas” por mais este sucesso na luta contra o tráfico e consumo de estupefacientes.
Uma palhaçada para telespectador ver. Big deal, umas quantas ganzas just for having fun! Eu se fosse pai de um finalista a asneirar em Espanha ficava muito mais preocupado com o “sucesso” desta operação do que se ela não tivesse acontecido. Quem fuma ganzas fuma sempre, e 10 dias a mil e tal quilómetros de casa, por que portas travessas vão andar para recuperar os charros apreendidos na fronteira? Mas isso já é em Espanha onde, como é sabido, não há nada disso, e a Guardia Civil que se preocupe com a guardia de los nuestros.
Estou aqui a ler as edições on-line dos jornais e o puto ao pé de mim a ver o Canal Panda. De carro vai um cão com aspecto de sexagenário, cabelo com algumas entradas apanhado em rabo-de-cavalo e com uma argola na orelha – tem ar de quem gosta do Blowin’ In The Wind e de quem assistiu ao debate Nixon – Kennedy. Ao seu lado vai um coelho branco com aspecto de coelho-comum. Vão a fugir de uns ratos malvados. Às duas por três diz o cão hippie para o coelho: “Já não tinha uma má onda destas desde que fumei uma erva marada no concerto dos Mamas & Papas!”.
Eh pá, eu até sei o que isso é e já passei por coisas que nem vos passa pela cabeça, além de ser dj há um porradão de anos e apanhar à noite com cada um pior que o outro que por sua vez ainda é pior que o “Deus Me Acuda!”; mas desculpem que vos pergunte, acham isto normal num desenhos animados para putos mesmo putos?
Desde os tempos do Liceu que não via o; há já mais de 20 anos. Ficámos ali os dois à conversa na beira do passeio.
Tinha medo que o mundo acabasse já amanhã e teve um filho aos 17 anos; depois a inevitável separação, umas muitas deambulações pela Europa de polegar esticado à beira da estrada e umas viagem com bilhete só de ida ao “paraíso do cavalo”.
Estava com mau aspecto. Ainda assim com menos mau aspecto do que tinha até há uns meses atrás; segundo ele. Tinha feito uma desintoxicação, e por um qualquer programa de apoio, está a trabalhar como coveiro num cemitério municipal.
«Um gajo habitua-se e vai-se vivendo um dia de cada vez»; disse-me. Nos intervalos do serviço «vou lendo o Expresso, o Público e uns livros que ficaram pendentes desde “aqueles tempos”. Vou agora n’Os Cantos de Ezra Pound e o pessoal do cemitério que só lê A Bola e o Record diz que sou esquisito. É o que custa mais…”
“Aguenta-te!”; foi o que me ocorreu, e ficámos de ir jantar um dia destes.
Gostei de reencontrar o Jorge “daqueles tempos”.
E fui para casa a pensar que enquanto for vendo o Coveiro Jorge é bom sinal. Para mim, pelo menos.