"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Um grupo de guineenses é suspeito de ter morto um português à facada em Lisboa e um grupo de portugueses é suspeito de ter morto um cabo-verdiano à paulada em Bragança. Um é objecto de comunicados de partidos políticos a preto-e-branco e de organizações de combate ao racismo e de manifs várias convocadas e várias cidades do país. O resto do pagode vai trabalhar de manhã para chegar à noite a casa e espera que a justiça seja feita, funcione, e que a ida e o regresso do trabalho continue a ser um trajecto seguro.
Mentirosos compulsivos que fazem toda uma pré-campanha e uma campanha eleitoral com a promessa de libertar o cidadão, as famílias, as empresas, da carga fiscal excessiva, como forma de potenciar o crescimento da economia, quando se alcandoram na cadeira do poder, além de não cumprirem o prometido, uma das primeiras medidas que tomam seja criminalizar a mentira na declaração de impostos.
E, antes da entrega, juramos sobre a Bíblia que tudo o que ali consta corresponde à verdade e nada mais que a verdade, assim Deus nos ajude?
Mesmo sem ter lido o livro – o que espero vir a fazer – e estando 100% de acordo com o que aqui se diz e escreve, como soi dizer-se: “Saramago sabe muito mas anda a pé”. O livro teria de ser rigorosamente Caim, o criminoso. Nunca Abel, o inocente.
Escreve Karl Marx no capítulo “Teoria da Mais Valia” do Capital:
«O criminoso produz crimes. Se olharmos mais de perto as relações que existem entre este ramo de produção e a sociedade no seu conjunto, ultrapassaremos muitos preconceitos. O criminoso não cria apenas crimes: é ele que cria o direito penal. (…) Mais: o criminoso cria todo o aparelho policial e judiciário – polícias, juízes, carrascos, jurados, etc. – e estas diferentes profissões, que constituem igual número de categorias da divisão social do trabalho, desenvolvem diferentes faculdades do espírito humano e criam ao mesmo tempo novas necessidades e novos meios de as satisfazer.
O criminoso cria uma sensação que participa da moral e do trágico e ao fazê-lo oferece um «serviço», mobilizando os sentimentos morais e estéticos do público. Não cria apenas tratados de direito penal: cria igualmente arte, literatura, ou seja, tragédias, sendo disto testemunhas não só La Flaute de Müllner e Les Brigands de Schiller; mas também Édipo e Ricardo II. O criminoso quebra a monotonia e a segurança quotidiana da vida burguesa, pondo-a assim ao abrigo da estagnação e suscitando a interminável tensão e agitação sem a qual o estímulo da própria concorrência enfraqueceria. Estimula assim as forças produtivas (…).
Descobrindo incessantemente novos meios de se dirigir contra a propriedade, o crime faz nascer incessantemente novos meios para a defender, de modo que o criminoso dá à mecanização um impulso tão produtivo como aquele que resulta das greves. Para lá do domínio do crime privado, teria o mercado mundial nascido se não houvesse crimes nacionais? E as próprias nações? (…).»
O “camarada” diz: « (…) eu sou ladrão rapaz, eu não gosto de trabalhar, não (…) é a minha profissão (…) se eu não roubar ninguém tem trabalho (…) o repórter, o escrivão, o delegado, o juiz, o promotor, tudo através de mim que sou ladrão (…) estou contribuindo para o bem de todos (…) »
Agora que Karl Marx voltou à agenda, façamos um reload ao que está escrito nas páginas do Das Kapital no capítulo «Teoria da Mais-Valia»:
«O criminoso produz crimes. Se olharmos mais de perto as relações que existem entre este ramo de produção e a sociedade no seu conjunto, ultrapassaremos muitos preconceitos. O criminoso não cria apenas crimes: é ele que cria o direito penal. (…) Mais: o criminoso cria todo o aparelho policial e judiciário – polícias, juízes, carrascos, jurados, etc. – e estas diferentes profissões, que constituem igual número de categorias da divisão social do trabalho, desenvolvem diferentes faculdades do espírito humano e criam ao mesmo tempo novas necessidades e novos meios de as satisfazer.
(…)
O criminoso cria uma sensação que participa da moral e do trágico e ao fazê-lo oferece um «serviço», mobilizando os sentimentos morais e estéticos do público. Não cria apenas tratados de direito penal: cria igualmente arte, literatura, ou seja, tragédias, sendo disto testemunhas não só La Flaute de Müllner e Les Brigands de Schiller; mas também Édipo e Ricardo II. O criminoso quebra a monotonia e a segurança quotidiana da vida burguesa, pondo-a assim ao abrigo da estagnação e suscitando a interminável tensão e agitação sem a qual o estímulo da própria concorrência enfraqueceria. Estimula assim as forças produtivas (…).
Descobrindo incessantemente novos meios de se dirigir contra a propriedade, o crime faz nascer incessantemente novos meios para a defender, de modo que o criminoso dá à mecanização um impulso tão produtivo como aquele que resulta das greves. Para lá do domínio do crime privado, teria o mercado mundial nascido se não houvesse crimes nacionais? E as próprias nações? (…).
Duvido que o “camarada” tenha alguma vez lido Marx. Ou sequer que saiba quem foi. Mas que é a prova viva da validade da teoria, disso não tenho a mais pequena dúvida.
(Há por aí falta de monitores para ministrar cursos de “quadros”?)
Se há coisa que nunca percebi, foi a razão para que em todos os cafés e restaurantes haja sempre um Correio da Manhã em cima do balcão, gentilmente dispensado pela gerência, para usufruto e consulta pelos clientes.
“Oh sôr fulano, tem aí o Correio da Manhã?” perguntava ao balcão a meu lado, um cliente do café onde costumo ir de manhã. “Levou uma senhora lá para fora pá esplanada…” respondeu o empregado. “Oh que chatice!” pensava eu para com os meus botões. Como é que há alguém que consegue ler um jornal que, há excepção de algumas poucas colunas de opinião, tem no mínimo 20 páginas com crimes, assaltos e assassinatos? As outras são com futebol e mais um suplemento com anúncios de “convívio”; leia-se prostitutas.
Chego agora à conclusão que eu é que andava ao contrário do resto da maralha.
De repente vejo o país transformado num enorme Correio da Manhã. A página um fica ali na A2; a página 2 fica em Loures. E por aí fora.
O papel de director está entregue a um senhor de nome Rui Pereira. Compila as notícias e manda publicar.