"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
O sucesso eleitoral do partido da taberna deveu-se ao taberneiro ter trazido para a agenda um tema que ninguém se atrevia a mencionar no debate público e político: a corrupção.
Trazido o tema para o debate público e político rapidamente começou a ser fazer o jogo do taberneiro e andar a toque de caixa da agenda do partido da taberna falar em corrupção.
Um arguido por corrupção ganha as eleições numa região autónoma, a roçar a maioria absoluta e castigando eleitoralmente o partido da taberna, porque as pessoas já estão fartas de ouvir falar em corrupção e não querem saber disso para nada.
Parece que Portugal teve o pior resultado de sempre no "Índice de Percepção da Corrupção". Diz que demos um tambolhão e ficámos ao pé do Botswana e do Ruanda, sítios onde os portugueses, que não são racistas, percepcionam as pessoas com uma saia de folha de palmeira e um osso no cabelo a servir de travessão.
O Correio da Manha fez mais um editorial, e meteu McDonald's em Valongo, "Influencer", Estado, "Tutti Frutti", oh rootie, a wop bop a loo bop a lop bom bom, que é como quem diz essas coisas dos políticos, já cantava o Little Richard.
Mais uma oportunidade para Marcelo fala-baratar, com ar grave, que está preocupado, que é preciso cuidado, que há muito anda a avisar, e outras banalidades para a ocasião. Que alinha com o Governo na valorização das percepções, disse a imprensa da especialidade.
Depois vai-se ver e o famigerado "Índice de Percepção da Corrupção" não é elaborado em função de entrevistas, de sondagens, de relatórios oficiais, de casos transitados em julgado, não. O "Índice de Percepção da Corrupção" é elaborado por quatro ilustres especialistas, dois pela Transparência e Integridade e dois independentes. Gajos que percepcionam coisas. Doutores percepcionadores.
Também disse Marcelo, no exercício de fala-baratar, que é preciso ter atenção ao que vai na cabeça dos portugueses. Pela parte que toca vou ali comprar o Correio da Manha, sem til.
[Na imagem print screen da página 24 da edição do Correio da Manha de 12 de Fevereiro de 2025]
Como reza a lenda, laboriosamente construída nos espaços de comentariado nos jornais, nas rádios e nas televisões, o Governo patriótico que teve a hercúlea tarefa de tirar o país da banca-rota e de restaurar a credibilidade de Portugal no mundo e aos olhos dos mercados, antes do primeiro-ministro, Passos Coelho, saber que um dia ia ser sonhado para Presidente da República, antes da ministra das Finanças, Maria Luís, ser entronizada comissária europeia pela sua mui grande experiência e sentido de responsabilidade, antes do secretário de Estado, Pinto Luz, saber que mais à frente iria ser o ministro com a pasta nas unhas outra vez.
Andou o Ministério Público quatro anos a pescar à linha na linha de telefone do João Galamba, andou um parágrafo manhoso a ser martelado entre uma ida e uma volta da Procuradora ao palácio do Marcelo, foi um presidente de câmara detido por ter pedido a uma empresa privada apoios para o futebol juvenil da cidade.
Ninguém se demite, continuam a andar por aí fresquinhos que nem alfaces, a pátria foi salva do socialismo, o Galamba fuma ganzas, soube-se pelo Correio da Manha, sem til, que teve acesso às escutas em primeira mão, o Pinto Luz não é motivo de ira entre os M&M's laranja - Marcelo e Monetenegro.
Definidas as prioridades no primeiro Conselho de Ministros, do Governo que quer endireitar Portugal depois de décadas de "regime socialista", e que ia começar a trabalhar logo no primeiro dia:
. 1 - Regressa o discurso matarruano da Pátria e da bandeira, de quem ainda vive no tempo de António Ferro e não percebe, nem quer perceber, coisas simples como modernidade, associada à legibilidade e padronização, sem desvirtuar.
. 2 - Vacuidades
. 3 - Introdução na agenda de um tema bandeira da extrema-direita populista, facilmente resolvido com dotação e reforço de meios - humanos e técnicos, das entidades competentes.
O princípio do fim do regime socialista está a ser uma coisa digna de ver.
No meio da enxurrada de notícias plantadas, com o nome de "investigação jornalística", sobre casos, esquemas, matrafisgas, de corrupção, suborno, más práticas governativas, ausência de espinha dorsal, a envolverem autarcas, ministros, secretários de Estado, ex ou actuais, do PS, com o imediato contra-ataque de mais notícias plantadas, com o nome de "investigação jornalística", sobre casos, esquemas, matrafisgas, de corrupção, suborno, más práticas governativas, ausência de espinha dorsal, a envolverem autarcas, ministros, secretários de Estado, ex ou actuais, do PSD, o que eles não percebem é que o que menos importa ao povo é quem é que gamou, quem é que se abotoou, quem é que governou a vidinha, quem é que, na vox pop, "encheu o cu", se mais ou menos que o outro, o "não fomos só nós, eles ainda fizeram pior", que o que importa é que colonizaram o Estado e a coisa pública com familiares, amigos, camaradas de partido, se "encheram", falharam como governantes, traíram o povo, insultaram os compatriotas, desrespeitaram a democracia. E genuinamente não percebem, como o provam a enxurrada de notícias plantadas, casos desenterrados, a não assumpção da culpa, a fuga para a frente.
Os recentes casos a envolverem autarcas, ex-autarcas, secretários de Estado, ministros, políticos e empresários avulso, são a resposta, com um desenho, às duas perguntas que todos nós já colocámos uma vez na vida:
- Como é que aquele borra-botas, que não tem onde cair morto, todos os anos troca de topo de gama, vai passar férias ao fim do mundo, e janta em restaurantes que servem miniaturas ao preço do salário mínimo nacional?
- Como é que é possível tamanho atentado urbanístico e ambiental em zona histórica, em zona de reserva ecológica; quem é que autorizou a construção de semelhantes cagalhões arquitectónicos?
Em que medida é que o escrutínio e a transparência contribui para afastar os mais qualificados do governo, das empresas públicas, da administração pública, do que quer que seja? Maior qualificação é sinónimo de maior apetência para a vigarice e a trafulhice? E se o é devemos olhar para o lado, fingir que não vimos, desculpar qualquer coisinha, para que assim os mais qualificados aceitem vestir a camisola do governo, das empresas públicas, da administração pública, do que quer que seja? O senhor Silva espalhou-se ao comprido, reset e nova entrevista.
O cidadão anónimo que se veja metido numa alhada que implique ficar atrás das grades uns meses, uns anos, vê a vida levar uma volta e é o descalabro total para alguém que tem a dita organizada em função do salário, fruto do seu trabalho, no caso de um casal com filhos ainda é pior, por toda a organização familiar girar em torno do bolo comum. Depois temos políticos - autarcas, secretários de Estado, ministros, ex ou no activo, gestores, pantomineiros genericamente denominados "empresários", uma conquista do 25 de Abril, até essa data os trafulhas e vigaristas da cidade respondiam por "industriais" e os do campo por "agrários", vão de cana, obviamente inocentes, nunca se abotoaram com um tostão, aparecem de imediato atrás dos advogados mais caros da praça, e a vida, a sua, da mulher e dos filhos, continua lá em cima como se nada se passasse, além do mau nome na praça pública. Portanto à justiça o que é da justiça, à política o que é da política, ao dinheiro o que é da política.
Ao contrário do que possa parecer, os Migueis Alves desta vida não foram nomeados ou tomaram o poder por "golpe de Estado", porque o que depois mais se ouve é "eu não votei nele". E mesmo quando cumprem penas de prisão, atrás das grades, não domiciliária, e voltam todos lampeiros e fresquinhos e voltam a ser eleitos e volta a conversa do "eu não votei neles". E o papão do "aproveita o populismo" fascista não funciona, nem o fascismo populistas se aproveita. Nas últimas autárquicas o Chaga em Oeiras foi remetido para uns míseros 3,71% dos votos, e a mesma agremiação, no mesmo concelho, nas legislativas ficou-se pelos 5,75%. É a falta de cultura da exigência democrática, para os Migueis Alves desta vida e para os dígitos do partido unipessoal chegano.
A verdade é que todo o badameco, mais anónimo, menos anónimo, preso e acusado de corrupção, e que alega ter vivido toda a sua vidinha com os frutos do seu honesto trabalho, tem dinheiro para contratar o advogado mais caro do país logo no minuto seguinte. É o que se vê na televisão.
«Em comunicado, a PJ explica que, "aproveitando a proximidade das eleições autárquicas, assim como o previsível lançamento de programas para a recuperação económica, o suspeito terá estabelecido contactos ao nível empresarial, autointitulando-se titular de cargo político com capacidade de decisão em matéria de contratação pública".»
Podemos ver isto de duas maneiras: a primeira, e a mais óbvia, a da promiscuidade entre o poder político e o tecido empresarial; a segunda, não menos grave que a primeira, antes pelo contrário, a da classe empresarial que, na lamuria programática do "colaborador" improdutivo e da rigidez das leis do trabalho, passa a vida encostada ao Estado que abomina.
Antes do 25 de Abril de 1974 havia duas classes de pantomineiros: os ligados à agricultura, denominados "agrários", os com ramo de actividade na indústria, conhecidos por "industriais", a revolução democratizou o léxico e renomeou todos em "empresários".
De manhã tivemos a doutora Joacine em directo na televisão a acusar o Livre de se ter aproveitado duma negra gaga para eleger um deputado, exactamente o argumento usado pelo Livre e pela deputada para classificar de racista e de extrema-direita para cima quem disse o mesmo da doutora Katar-Moreira quando foi eleita.
À noitinha tivemos a doutora Isabel dos Santos no Twitter a classificar de racismo e preconceito os casos de corrupção e nepotismo onde aparece envolvida na investigação jornalística "Luanda Leaks".
"Racismo" e "preconceito" é o novo maravilhoso.
De caminho a Price Waterhouse Coopers cortou relações com a filha do pai depois de décadas a ser paga para trabalhar na maquilhagem das trafulhices da empresária, dar-lhe um ar decente, aceitável e com "sentido de Estado, enquanto o Cigarette Smoking Man ou Cancer Man dos X-Files, também conhecido por Fórum de Davos ou Forum Económico de Davos, 'desconvidou' a senhora. Tem peçonha, ninguém sabia ou sequer desconfiava. Por causa das carradas de maquilhagem e do cabelo esticado que a fazem quase branca. Uma afirmação claramente preconceituosa e racista, esta.
Entretanto vai grande alegria e excitação no jornal do militante n. º 1, também ele sentadinho em Davos e apanhado de surpresa com toda esta embrulhada, enquanto ficamos todos à espera que depois de publicar a prometida lista dos jornalistas avençados do BES nos Panamá Tretas, o Expresso publique também a lista dos jornalistas avençados da cleptocracia angolana que conseguiu roubar e fazer mais mal ao seu próprio povo que o colonialismo, e isto sem qualquer acusação de racismo e preconceito, sublinhe-se.