"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Correndo o risco de me ser colado o rótulo de “maluco-obsessivo”, por estar sempre a martelar na mesma tecla, cá vai: o PS pelas mãos de Mata Cáceres governou, sozinho ou em coligação com o PSD, durante quase 15 anos a Câmara de Setúbal. O mesmo Mata Cáceres que simultaneamente era presidente da Assembleia-Geral do Vitória Futebol Clube de Setúbal. O clube, anualmente e invariavelmente, recebia da autarquia uma contribuição financeira sob a forma de dinheiro vivo ou em terrenos municipais – leia-se nossos –, que invariavelmente iam parar às mãos dos construtores civis, que invariavelmente construíam aqueles mamarrachos que enfeitam a cidade e aos quais nós aqui chamamos “cagalhões”.
O método problema não é exclusivo de Setúbal. Já deu frutos por exemplo em Felgueiras, por coincidência - e só por isso – outra autarquia PS, e começa a apresentar resultados em Grândola, por coincidência - e só por isso – uma autarquia PS, com os PINs e o saque de todo o litoral alentejano. Se bem que o Grandolense não milite na primeira divisão do futebol nacional, mas também não surpreende nada que um dia destes desate a subir.
A notícia que o JN hoje publica e que vale a pena ler o conteúdo , uma vez que o leitmotiv foram as dívidas do Vitória e a necessidade de vender o estádio como forma de as pagar, e a autarquia construir um estádio municipal para o clube poder jogar, porque está nas lonas apesar do dinheiro e dos terrenos recebidos, e do presidente da Ass. Geral ser o presidente da autarquia (engenharia financeira; dizem), é:
Para melhor se perceber do que falamos e pela sua actualidade, recupero aqui uma crónica que Miguel Sousa Tavares escreveu n’A Bola no dia 8 de Maio de4 2007:
"Em minha opinião, o Vitória de Setúbal é a pior equipa do campeonato e a sua descida aos infernos da Liga de Honra é absolutamente natural e justificada. Passa-se com o Vitória a mesma coisa que se passa com a própria cidade de Setúbal.
Há 20 anos atrás, Setúbal tinha todas as condições para se transformar numa cidade modelo, em termos de urbanismo e qualidade de vida: Dimensão adequada, Espaço para se desenvolver harmoniosamente, Possibilidade fácil de recuperar o centro histórico e ligá-lo ao rio, Condições naturais excepcionais, Com o estuário do Sado aos pés, O mar em frente, A montanha ao lado, Praias magníficas, Frente de rio única, Avenidas largas, Praças suficientes, enfim, tudo ou quase tudo.
Mas vieram os Mata Cáceres e outros artistas do poder local e transformaram Setúbal numa coisa caótica e aberrante, com urbanizações dignas de subúrbio africano, esculturas pseudomodernas horrendas, o triunfo do pato-bravismo, do mau gosto, e da gestão sem planeamento nem ideias.
Também o futebol do Vitória chegou a encantar Portugal e a surpreender a Europa. Mas depois, as Forças Vivas da cidade, ou seja, os mesmos artistas que destruíram a beleza de Setúbal, tomaram conta do clube e demonstraram que eram tão bons a dirigi-lo como a fazer a cidade.
Hoje a cidade é uma dor de alma e o clube um cadáver adiado. Que ninguém fale em injustiça."
Também é fuga de informação quando uma determinada força política – e isto vale para todos – ganha as eleições para determinada Câmara Municipal, e, de repente, como por artes mágicas, desata a haver construção em tudo o que é sítio, em todo o palmo de terreno livre – excepto debaixo de água porque ainda não inventaram –, de tal forma que “até um cego vê”, como diz o povo?
Para ser sincero, o que menos me importa é quem é que esteve na reunião, onde é que a reunião aconteceu, onde é que para o dinheiro, ou se foi o tio, o primo ou o avô. E os meus amigos do PS que me desculpem, mas esta já é uma “guerra” antiga que nós vimos travando de há uns anos – muitos – a esta parte.
É o íman; a atracção fatal entre o PS e os construtores civis,e às vezes com futebóis pelo meio. Nunca consegui perceber ou encontrar uma explicação minimamente plausível.
Ontem pude ver / ouvir Francisco Van Zeller responder a Mário Crespo no telejornal das 21 na SIC Notícias, que uma das vantagens de Alcochete em relação à Ota para a construção do futuro aeroporto era a de não haver “especulação imobiliária possível” uma vez que todos os terrenos são propriedade do Estado. Eu acho que o presidente da CIP está a ver a coisa ao contrário. Isso é um ponto contra Alcochete; melhor, uma enorme desvantagem, a juntar a outra que parece estar a passar despercebida: A Câmara de Alcochete é gerida pela CDU. Então e a já lendária trilogia Autarquias PS / Construtores Civis / Clubes de Futebol? Se bem que estes últimos, em princípio, não são tidos nem achados para o que aqui se joga. De cada vez que o PS ganha uma autarquia, como que por artes mágicas, assistimos a um disparar da construção imobiliária por tudo o que é sítio. Dou só como exemplos, alguns, poucos, para não ser maçudo: Dezasseis anos em Setúbal (venham os americanos bombardear a cidade para se começar construir da estaca zero, tal é o caos urbanístico); dois mandatos em Sesimbra (só não se construiu dentro de água porque os engenheiros disseram que não era viável, mas na praia sim); um mandato (!) em Alcochete (e uma aldeia passou a megapólis num abrir e fechar de olhos). Ou Van Zeller anda alheado, o que não me parece; ou acredita no Pai Natal. Alcochete para o lobby construtor PS é uma péssima opção.
(Porque é que insistem em chamar ao novo aeroporto “de Lisboa”? Pergunta: “Onde é que moras?”, resposta: “Em Lisboa… mas tecnicamente falando é em Alcochete, distrito de Setúbal…”)
Já por aqui tinha escrito sobre as relações pouco claras no famoso triangulo “Câmaras Municipais / Construtores Civis / Futebol” a propósito da contestação à nova Lei das Finanças Regionais.
E como que a fazer prova de vida, assiste-se ao regresso do triangulo na máxima força, se bem que sem o vértice futebol; até ver e até prova em contrário.
A Câmara Municipal de Lisboa – apesar dos pedidos do Governo – aprovou um loteamento para uma urbanização que poderá colidir com o traçado do TGV e da nova ponte sobre o rio Tejo, Barreiro / Chelas.
A proposta foi levada a votação pela vereadora do urbanismo e passou com os votos contra de toda a oposição, abstenção de Maria José Nogueira Pinto, favoráveis do PSD e voto de qualidade de Carmona Rodrigues; apesar de a projectada urbanização violar o PDM em vigor, o que por si só já seria motivo suficiente para reprovação.
Em face disto, resta ao Governo tomar as chamadas “medidas preventivas” para impedir a operação urbanística, não inviabilizando de qualquer modo que o promotor do empreendimento venha a reivindicar direitos adquiridos e uma indemnização que poderá ser superior a 60 milhões de euros (!).
Jackpot sem jogar no euro milhões.
O cidadão comum, quando é chamado a eleger uma administração autárquica – ou outra – espera que ela sirva para solucionar problemas e não para os inventar onde não existem; e espera que tome medidas de governação límpidas e transparentes para o bom funcionamento das urbes, onde o beneficiário seja o colectivo e nunca o individual.
O que se assiste, é que a ganhar aqui, já existe um: Lismarvila do Grupo Obriverca.
Lesados: Todos os cidadãos de Lisboa, por uma clara violação do seu PDM, e todos os cidadãos contribuintes do País pelo óbvio encarecimento do TGV ao nível dos custos.
Depois da secretária de Estado dos Transportes, Ana Vitorino, ter pedido na Assembleia da Republica solidariedade institucional ao município de Lisboa para que o loteamento não fosse aprovado, é no mínimo “estranho” a ligeireza com que tudo se encaminhou; sabendo-se de antemão quais as implicações que daí adviriam, quer a nível das medidas a tomar pelo Governo, quer ao nível de verbas e valores em jogo a haverem indemnizações.
Haverá mais algum / alguns beneficiários escondido(s)?
Até quando o suposto benefício de alguns se irá sobrepor ao inquestionável benefício colectivo, é uma questão que urge levantar.
É por esta e outras como esta que Duarte Pacheco deixa saudades.
Alguém ainda se recorda de como lidou com os proprietários dos terrenos que se interpunham no caminho da primeira ponte sobre o Tejo?
Bem sei que se vivia numa ditadura, mas não haverá mecanismo legal em democracia que acabe de vez com este Chico-espertismo autárquico/ construtor?
Fez ontem um ano, que Jorge Sampaio, então Presidente da República, no discurso comemorativo do aniversário do 5 de Outubro, pediu "uma revisão criteriosa das leis anticorrupção ".
Cavaco Silva, agora na pele de Presidente da República, pega no discurso de Sampaio e diz: "É preciso que o combate à corrupção seja assumido como um esforço a que todos são chamados". Mais à frente no seu discurso, a todos convoca para este combate, começando pelo Poder Central, Autarquias, Poder Judicial e Jornalistas.
Fiquemo-nos por ora, pelas Autarquias, até porque está na ordem do dia a nova Lei das Finanças Locais.
O que quer dizer Cavaco Silva quando apela aos autarcas?
Estará a referir-se à aparente facilidade com que constantemente se fazem alterações aos PDMs ; sejam elas em Zona Urbana, Zona de Paisagem Protegida ou Reserva Agrícola Nacional?
Ao facto de serem sempre as mesmas empresas a ganhar os concursos, seja qual for o tipo de candidatura, ou valor da proposta apresentada?
Ouvindo o discurso do Presidente da República ocorre-me, que de hà algum tempo a esta parte, o deputado socialista João Cravinho, anda numa "guerra" dentro do PS - partido do governo - com uma proposta que visa criar um organismo de supervisão de práticas da Administração Pública, e que constantemente tem esbarrado na recusa do seu grupo parlamentar em agenda-la para debate. (um dos argumentos é de que vem acrescentar despesa...).
Haverá alguma correlação entre esta recusa e o misterioso mimetismo construtores civis / Partido Socialista / caos urbanistico?
Qual a explicação (científica ou não) entre o boom que se verifica ao nível da construção civil e as autarquias geridas pelo PS? A título de exemplo, e restrinjo-me apenas e só ao meu distrito, Setúbal, facilmente comprovável pelo comum dos cidadãos:
Setúbal, 14 anos de consulado PS; Montijo, quantos anos? (um amigo meu em jeito de brincadeira costuma dizer que Setúbal e Montijo não têm salvação possível, tal é o caos urbanístico, só chamando os Americanos para bombardear e tornar a construir de novo...) ; Sesimbra; Alcochete, um só mandato; Grandola, todas as resmas de propostas em cima da mesa, para a construção em Reserva Natural do Estuário do Sado, Península de Tróia e Lagoa de Melides.
Não se percebe porque é que José Socrates não põe ordem no seu grupo parlamentar e assume como uma das prioridades máximas do governo a causa do combate à corrupção.
À mulher de César não basta ser séria, há que parecê-lo.