"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Mindinho Mendes anunciou com ar grave e muita pompa e circunstância e grandes movimentos de mãos e fartura de gestos no tampo da mesa, e as televisões todas e os jornais todos repetiram todos a grande nova e o grande furo jornalístico que foi o acesso a uma carta do Banco Central Europeu, a outra face da moeda dos Estados não terem acesso directo ao crédito – o BCE empresta aos bancos que por sua vez emprestam aos Estados, e que é o BCE decretar que dinheiro dos contribuintes – ler "ir ao bolso ao contribuinte", "esbulhar salários e pensões", "esmifrar poupanças", só para recapitalizar bancos privados, bancos públicos não, never, nein, já-mé. E depois toda a gente de boca aberta comentou a grã descoberta de Mindinho Mendes e as televisões todas e as rádios todas fizeram todas no dia a seguir fóruns de debate mui participados.
Isto é a gozar, certo? Ou falta de assunto, certo? Ou aquela coisa da estação parva que chega com o calor?
Paulo Teixeira Pinto saiu do BCP com uma indemnização de 10 – milhões – 10 de euros e uma reforma mensal de 35 – mil – 35 eurosvezes14 meses. Mas como diz a outra, “isso agora não interessa nada!”, já se tornou banal aqui dentro do rectângulo e nem adianta o Presidente da República espernear nos discursos. É assim mesmo “e prontes!”
O mais interessante está lá dentro; na página 41. Reza assim: “O ex-CEO acabaria por renunciar ao lugar, que ocupava há mais de dois anos, garantindo uma indemnização à cabeça de 10 milhões de euros, o que o impede de voltar a exercer funções em instituições bancárias concorrentes” (negrito meu).
O BCP defende-se e preserva-se. Teixeira Pinto sabe muito. Nada de dar trunfos à concorrência.
Santos Ferreira passa, directamente e sem passar pela casa da partida, da Caixa, o maior banco nacional, para o concorrente directo, o maior banco privado.
Os accionistas que o elegeram não são burros. Miguel Cadilhe ainda não percebeu porque é que levou uma cabazada nas eleições?
Se dúvidas houvessem que os jobs existem à medida dos boys, aí está a prova que faltava a alguns cépticos (era para escrever anjinhos…).
Armando Vara que se prepara para dar o salto (à vara?) da Caixa para o BCP, quer jogar pelo seguro, e, não vá o diabo tecê-las, pediu licença sem vencimento enquanto a situação no “outro lado” não fica completamente esclarecida.
Licença sem vencimento; leram bem! Na minha empresa – privada – não há licenças sem vencimento. Por uma razão muito simples: as pessoas estão na empresa, porque a empresa precisa delas para determinada função. A haver licenças sem vencimento, implicava a empresa contratar outra pessoa para ocupar o lugar da que está de licença.
Licença sem vencimento, suportada por um banco ou por uma empresa, significa uma coisa, e só uma: estar ou não estar é igual ao mesmo. E a isto chama-se One Job For The Boy.
“O novo presidente da Caixa Geral de Depósitos (CGD) não vai reconduzir Celeste Cardona na administração do banco público. Segundo apurou o CM apenas transitam da anterior administração Norberto Rosa (ex-secretário de Estado do Orçamento de Manuela Ferreira Leite) e Francisco Bandeira, que ascende à vice-presidência da CGD.”
A ser verdade o que aqui se escreve, fica parcialmente explicada a ida de Armando Vara a reboque de Santos Ferreira para a nova administração do BCP. Há que preservar o ganha-pão dos boys. A parte que falta explicar – aguardemos pelo que o futuro nos reserva – é saber da real importância de Vara, o seu “peso” dentro do PS, que justifique esta tipo de benesses.
Outra é, se com a exclusão de Celeste Cardona da futura administração da Caixa, o silêncio sobre a situação no BCP se vai manter por estas bandas…
“Disparate. Quem pode ficar contente com a intromissão do estado nos negócios privados são todos os socialistas/sociais-democratas. Não é isso que defendem? Mas de tão envergonhados que são na defesa do intervencionismo, nem sequer isso fazem, coitados.”
Caro Gabriel, disparate é não ver o óbvio. E o óbvio aqui é o Estado dar de mão beijada ao maior banco privado nacional informação classificada e confidencial sobre os meandros do seu concorrente directo, a Caixa. A haver, a presumível intervenção do Estado no mercado foi em favor do sector privado – um “empurrão” –, em flagrante prejuízo do banco do Estado, por mera coincidência aquele com quem o BCP disputa ombro-a-ombro o espaço vital….
Mas há por aí mais gente a disparatar. Este senhor obviamente só pode ser um mau administrador – do ponto de vista privado, claro. No fundo, no fundo, está a defender os interesses da Caixa ao dar-se ao luxo de desprezar a informação estratégica na bagagem de Santos Ferreira…
Sobre as trocas & baldrocas no BCP envolvendo a CGD, já aqui havia escrito que se estava a assistir a uma operação de espionagem industrial com o aval do Governo e do Banco de Portugal. João Duque, Professor Catedrático do ISEG, assina hoje no Público Economia um artigo com o título “Quem defende o interesse a CGD?”:
“Calos Santos Ferreira não é um qualquer trabalhador da Caixa. É, simplesmente, o seu Presidente! E das duas umas: ou conhece a CGD, conhece os seus pontos fortes e as suas vulnerabilidades, sabe quem são os seus clientes conhece a sua estrutura de custos, é a sua “cabeça”, o seu líder e o motor de estratégia da Caixa, quem sabe o que quer para a empresa e sabe como o vai conseguir (conquistar quota, aumentar o lucro, etc. à custa de esmagamento de margens, de “cross-selling” agressivo, de campanhas estratégicas, etc.) ou não sabe nada disto e então não se percebe como se mantêm essa incompetência à frente da Caixa.
(…)
Achará o próprio Carlos Santos Ferreira, bem como os promotores da ideia que ele esquecerá tudo o que sabe sobre a Caixa no dia em que dela se demitir?
(…)
Se tomar posse como Presidente do BCP que fará Santos Ferreira na sua guerra contra a Caixa? Imagine-se que Pinto da Costa ia dirigir o Benfica. Quem é que ele iria defender depois de tomar posse?
Ora admitindo-se que Santos Ferreira vai mesmo defender os interesses do BCP os accionistas deste banco aplaudem! Isto é como o Tottenham tentar ir buscar José Mourinho ao Chelsea, coisa que terá tentado! No entanto, o patrão do Chelsea sabe defender os interesses do seu clube e deixou claro na cláusula de rescisão o impedimento deste treinador para conduzir qualquer clube concorrente em Inglaterra nos três anos subsequentes!”
(Ler na integra aqui – clicar na imagem para aumentar)
Por isso espanta-me que alguns blogues que visito diariamente e que me habituei a considerar e respeitar, conotados à esquerda, por exemplo, este e este, embarquem no lamiré de alguma direita da blogosfera a discutir amendoins, quando o que está em causa não é ser do PS, do PSD, ou outro P qualquer. Não é o PS "OPAr" o BCP. Nem tão pouco uma renacionalização. Ao que se assiste neste momento é a um ataque maquiavélico concertado ao único banco do Estado, e que disputa palmo a palmo o terreno ao BCP. Quais, ou qual o objectivo, ainda não percebi… Quem sabe uma futura privatização?
No fundo, no fundo, estes aqui e mais estes, até estão a esfregar as mãos de contentamento!