"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Carlos Moedas não pediu uma reunião com carácter de urgência ao ministro das Infraestruturas e Habitação devido à explosão de bairros de barracas na Grande Lisboa, um problema real e urgente a que o poder político tarda em dar resposta. Não. Carlos Moedas pediu uma reunião com carácter de urgência à nova ministra da Administração Interna devido à situação de insegurança e violência vividas na cidade, um problema que não existe, constantemente desmentido pelos relatórios e pela chefias das várias polícias. O título do post é roubado ao livro do outro porque a direita sempre foi excelente em manipular percepções para esconder a realidade fruto da sua incompetência.
No tempo das fotocópias circulava de mão em mão uma papeleta com um jacaré ao lado de um crocodilo e respectiva legenda "Sabes distinguir um jacaré de um crocodilo? O jacaré é aquele que está ao lado crocodilo". Aqui não há jacarés nem crocodilos, é mais lagartixa e lagarto sardão, e a legenda é "O que acha que os portugueses são todos estúpidos é aquele está ao lado do que acha que os portugueses são todos totós".
O sismo teve epicentro na Fonte da Telha, uma frente de mar/ praia partilhada entre os municípios de Almada e Sesimbra, mas quem apareceu nas televisões foi Carlos Moedas, de Lisboa, equipado de fluorescente para um cataclismo de proporções bíblicas, chateado com o Partido Socialista que lhe perguntou pela app, anunciada numa acção manhosa de propaganda num arremedo de terramoto em 2022, e que ninguém encontra, nem na Play Store nem em lado nenhum. Uma "politização da notícia" diz o homem que aproveita qualquer rodapé de notícia para vestir o colete da Protecção Civil sem qualquer contraditório ou espírito crítico. Telefona e lá estão as televisões de microfone estendido, as mesmas que andaram meses a fio com o taberneiro ao colo, curiosamente do mesmo partido do inefável Moedas. Como diria o fala-barato que tem cadeira em Belém, há aqui uma entorse informativa.
O Correio da Manha faz primeira página com uma alegada sondagem que dá 46,2% a Carlos Moedas contra 27,1% de Alexandra Leitão numa corrida à câmara de Lisboa, e na autarquia do Porto 29% a Manuel Pizarro, numa disputa com Pedro Duarte, que se fica pelos 26%. Lá dentro, Carlos Rodrigues, "director-geral editorial" e alegado jornalista, explica a alegada sondagem - o universo nacional a opinar sobre uma determinada câmara municipal onde só votam os residentes, tipo uma sondagem europeia sobre quem deveria ser o próximo inquilino na Casa Branca em Washington.
A primeira função já foi cumprida - os que lêem as gordas ao balcão do café, a segunda, que é a replicação em todos os telejornais desta "sondagem fidedigna", está em curso. Percebem agora porque é que Correio da Manha não leva til?
Na melhor das hipóteses Carlos Moedas vai ficar para a história como o personagem que matou a galinha dos ovos de ouro, o grande destruidor de emprego e de riqueza em Lisboa, e por arrasto nas regiões adjacentes. Ninguém no seu perfeito juízo quer viver ou passar férias numa cidade cujo "mayor" constantemente a apresenta ao mundo como violenta e perigosa, uma terra sem lei "a oeste de Pecos", a necessitar de um patrulha da polícia em cada rua, de uma CCTV em cada esquina.
Carlos Moedas a confirmar a suspeita que paira na cabeça das pessoas desde o dia em que sem saber ler nem escrever lhe caiu a câmara de Lisboa no colo. Não faz a porra da ideia do que é governar uma cidade, não tem a mínima sensibilidade para os problemas dos cidadãos. Desconhece completamente os bairros que para além da da zona onde mora e onde vive o seu círculo de amigos. Não sonha nem quer saber o que é sair de casa às 5 da manhã para fazer os trabalhos que os outros não querem fazer, limpar a merda que os outros fazem, e regressar a casa já o telejornal está no ar. Não sabe nem procura saber o que é ser criado à solta no bairro, o dia todo na rua, o gang como única relação de parentalidade. Tudo se resolve à cacetada, com repressão, quando é precisamente essa cacetada e essa repressão que geram os motins e a revolta.
O "fenómeno" Moedas devia servir para o PS parar, fazer introspecção, autocrítica, a [dimensão da] porcaria que fizemos [fizeram] para um inepto e incompetente, mentiroso e propagandista, chegar a presidente da câmara de Lisboa. Infelizmente não é isso que vai acontecer.
Apanhado a mentir com quantos dentes tem na boca, amuou, fez birra, e saiu da sala. Como toda a gente sabe o pelouro de chamar aos outros mentirosos é exclusivo de Carlos Moedas que acumula com o de presidente de câmara. Ensaia uma fuga para a frente, "vamos lá desviar o foco para a segurança", um clássico da direita pantomineira. Saiu-lhe mal. É inconstitucional. O exemplo vem de cima, de outros dois sonsos, o chefe e o sub-chefe, Marcelo & Montenegro, que marcam conselhos de ministros decisórios com a presença do Presidente da República. Continua a mentir. Não se sai pior por causa da mãozinha dos "inimigos do povo".
Luís Montenegro mentiu, Paulo Rangel mentiu, Carlos Moedas mentiu, como antes tinha mentido a ministra da Saúde, e como antes tinha mentido o ministro da Educação. Isto não é um Governo, isto não é um presidente de câmara, isto não é um partido, isto é um episódio do Pinóquio.
Sai o Relatório de Segurança Interna a dar conta do aumento da criminalidade, com os principais indicadores a incidirem no tráfico de pessoas, auxílio à imigração ilegal, crimes de ódio e violência entre grupos, curiosamente o que a direita, alegadamente democrática, insiste em desvalorizar: a imigração ilegal fruto dos entraves colocados à entrada em quem procura trabalho legal; crimes de ódio e violência entre grupos, pelo normalizar de comportamentos inaceitáveis, em nome da liberdade de expressão, liberdade de associação, e do princípio "se os proibimos aqui, amanhã abrem na porta ao lado, portanto é deixa-los estar", e logo o inefável Moedas apareceu nas televisões a dizer não estar surpreendido com o relatório porque "já há dois anos atrás [como será há dois anos à frente ou há dois anos ao lado?] "dizia ao antigo ministro que havia maior criminalidade, que ele sentia na rua", o mesmo princípio de análise científica - "O Sentimento", que o levou a assegurar que as Jornadas Mundiais da Juventude tinham sido um sucesso estrondoso para a restauração lisboeta, e não o fiasco que foram, porque alguém que tinha hospedado em casa lhe contou que o Pinóquio nos Restauradores estava com fila à porta.
A facilidade com que Moedas aparece nas televisões, por si convocadas para perorar por tudo e mais alguma coisa, sem qualquer contraditório, nem uma única pergunta difícil da parte dos pés de microfone, como forma de esconder a incompetência com "o barulho das luzes", é na base do mesmo princípio de quem engordou e andou com Ventura ao colo e que agora procura um candidato mais fofinho.