"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Diz que "trinta mil milhões de dólares depois, Argentina está de novo à beira da falência", e depois diz uma série de feitos históricos da moto serra, bué bons para a economia e para as pessoas e para a Argentina e, quase lá no fim, diz que a Argentina está outra vez à beira da bancarrota, a quarta em 25 anos, porque os argentinos, sim os argentinos, entraram em pânico com medo do regresso do peronismo, que deu uma derrota histórica a Milei nas provinciais de Buenos Aires, desataram a vender pesos, e os investidores ficaram receosos e rebéubéu pardais ao ninho.
Temos portanto que quem espetou uma derrota histórica na fronha do Milei não foram os argentinos, porque esses ficaram como medo do regresso do peronismo e desataram a vender pesos, se calhar foram uruguaios, ou brasileiros, disfarçados de argentinos e que foram votar enquanto tocavam bandoneón pelo caminho. E também temos que os mesmos investidores que investem em todos os cantos do planeta, da China aos Estados Unidos, de Portugal à Arménia e ao Aberbeijão de Trump, na Argentina dão de frosques porque o povo não vota no liberalismo, uma teoria económica que pelos vistos funciona bué bem em regimes onde as pessoas não são tidas nem achadas, também conhecida por ditadura.
E voltamos ao início, não do post, mas desta história, o tempo do Ilusão Liberal antes de haver Iniciativa Liberal, quando estes alucinados andavam pelos blogues e pelo tuita e pelo feiçebuque a defender o modelo económico da Argentina de Pinochet e que o liberalismo fazia falta em Portugal.
O nosso "problema" com os ilusionistas liberais é que já nos conhecemos há demasiado tempo, tanto quantos os anos deste blogue - 19, dos confrontos de ideias através dos posts, nas caixas de comentário com os escribas do Blasfémias e d' O Insurgente, e depois em "confrontos" rápidos no Twitter a 140 caracteres. Na altura da memória difusa, para alguns, inexistente para outros, revista e lavada a OMO para a maioria , o Chile de Pinochet e dos Chicago Boys, que fica nas costas da Argentina, era do lado de cá do Atlântico, aqui mesmo ao lado. A ditadura um mal necessário. A tortura, os assassinatos, as violações, os desaparecimentos, efeitos colaterais, quando não mesmo um exagero da esquerda. O país aí estava, preparado, pujante, um exemplo para toda a América Latina cubana e guevarista, até mesmo para Portugal, alegavam os especialistas em economês. Agora que a memória está fresca, que todos os dias somos bombardeados com o desemprego, a fome, a miséria, a prostituição nas ruas e os sem-abrigo como factor estrutural e não conjuntural, o ataque às liberdades, as cargas da polícia de choque a qualquer pretexto sobre tudo o que respira, enaltecidas no Twitter por minions com cargos mais ou menos importantes dentro da agremiação, um palerma a distribuir réplicas da moto-serra de Milei na Reunião Geral de Alunos congresso da colectividade, a Argentina é do outro lado do Atlântico, lá muito longe, aquele sítio onde o Magalhães andou às voltas quase meio ano.
Um dos poucos ministérios de Milei que não foram "afuera", o da Segurança, a primeira medida que tomou foi suspender a democracia com um decreto finalizado "cá se fazem, cá se pagam" de fazer inveja ao partido que se senta à direita do Ilusão Liberal no Parlamento, aquele que celebrou a vitória do alucinado argentino e que agora começou num processo de transumância com o vizinho do lado. Como se diz em português, "és liberal e não sabias", farinha do mesmo saco.
Antes do advento das "redes sociais" personagens como Javier Milei ficavam a falar sozinhos na rua, "tadinho, é maluco" ou "dá-lhe o desconto, não sabe o que diz" ou ainda "não tem os cinco alqueires bem medidos". Agora chegam a casa, ligam o computador, arregimentam uma horda de alucinados, vão a votos e ganham eleições. Onde é que se situa a fronteira entre a insanidade e a razão e quem é quem não tem medo disto?