"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Esta debandada halloweenica do CDS tem pouco ou nada a ver com a alegada falta de democracia interna, com a pulsão autoritária do líder ou o desvio protoditatorial do infantil Chicão, num partido habituado a conviver com refugiados do fascismo nas suas fileiras desde o dia da sua fundação, mas tudo com a irreversível irrelevância política do partido, da sua inutilidade enquando porta de acesso ao poder, porta giratória privdo-público e rampa de lançamento para negócios à sombra do Estado. Parem de insultar a inteligência dos portugueses.
O que menos se espera ouvir de um dos partidos donos da democracia era uma discussão sobre voto secreto depois de 46 anos a atirar o voto de braço no ar à cara do PCP.
Quem é que anda enganado, aqueles que agora migram do CDS para o Chaga, por a vergonha ser coisa que não lhes assiste e já conseguirem dizer em público e em voz alta o que antes só se atreviam a pensar em privado, ou quem tenta resgatar um partido que só existiu pela vergonha da culpa que era assumir Salazar na memória fresca do pós 25 de Abril e por falta de alternativa no mercado para o nicho liberal, uma vez que os órfãos moderados e reformistas estão desde sempre albergados no centrão PS/ PSD?
O Estado é administrado por Governos saídos da Assembleia da República constituída por deputados eleitos nas listas dos partidos em eleições livres e democráticas. O CDS, caso consiga chegar à administração do Estado a partir do acto eleitoral, não se propõe "reformar o Estado" [sem piadismo] por forma a que o atraso nos pagamentos não seja a regra mas a excepção. Não. O CDS propõe que os atrasos continuem tal e qual os conhecemos mas que o "desconto" fique por conta do credor. Um partido de pantomineiros.
O mais interessante nesta ida de Pires de Lima para o Bank of America Merrill Lynch e de Adolfo Mesquita Nunes para a Galp é a contratação por empresas e grupos privados de agentes políticos e ex-governantes sem experiência na área nem curriculum para os cargos que vão ocupar e as funções que vão desempenhar, depois de terem passado a vida a vender-nos a ideia do supremo valor e da virtude da iniciativa privada e da urgência em aliviar o peso do Estado na economia, como se fossemos todos muito burros e ninguém percebesse o factor "porta giratória" e aposta a médio e longo prazo na inevitável alternância política governativa. Salazar era mais honesto, tinha o "condicionamento industrial".
Escreve a next big thing do CDS, Adolfo Mesquita Nunes, no Diário de Notícias sobre a culpa de Pedro Sánchez no crescimento dos fascistas do Vox na Andaluzia. Nada de novo. Trump governa nos States? É culpa do socialismo e do esquerdismo. O Brexit ganhou? É culpa do socialismo e do esquerdismo. Marine Le Pen está às portas do Eliseu? É culpa do socialismo e do esquerdismo. Bolsonaro no Brasil? É culpa do socialismo e do esquerdismo. Viktor Órban, camarada de bancada do CDS no Parlamento Europeu suspendeu a democracia e o Estado de direito na Hungria? A culpa é do socialismo e do esquerdismo e se calhar aqui também do comunismo. Depois olhamos para o quadro publicado nesse baluarte do socialismo e do esquerdismo que é o diário El Mundo e ficamos a saber que os fascistas que antes faziam a cruz no quadrado à frente do símbolo do PP e do Ciudadanos, chateados com Sánchez, o socialismo, o esquerdismo e o independentismo catalão, se mudaram em peso para o Vox... É a realidade alternativa da direita radical.
Enxofrou-se Adolfo Mesquita Nunes no Twitter com o vídeo do Luís Vargas, a ganhar nas redes a visibilidade que o nicho de mercado que são os frente-a-frente na SIC Notícias não dão aos intervenientes, principalmente quando desmontam a imagem que Adolfo Mesquita Nunes, laboriosa e pacientemente, anda a construir para se alçar à liderança do CDS num pós Cristas [já João Galamba, poucos dias antes de deixar o programa para ocupar a secretaria de Estado, com uma observação aparentemente inócua o havia tirado do sério e feito levantar a voz a falar por cima de toda a gente]. O CDS não é o partido herdeiro do fascismo, é só o partido dos netos do fascismo que invocam a sua condição de herdeiros para discursar no Congresso perante o aplauso da assembleia.
Na entrevista que o palerma Bernardo Ferrão, arvorado a homenzinho, foi autorizado fazer à "rã que quer ser boi" [copyright Jerónimo de Sousa] a cada 5 minutos ouvia-se da boca de Assunção Cristas as palavrinhas mágicas "Adolfo Mesquita Nunes". A ambição polítca de Adolfo Mesquita Nunes justifica que se sujeite ao "somos um partido retrógrado, quase a roçar o fascista, mas até somos tolerantes e muito open mind e até temos um gay de estimação assumido"?
Adolfo Mesquita Nunes, que sempre teve boa timeline de esquerda, da esquerda urbana-chic do amiguismo lisboeta [oficialmente por causa do bom gosto, do bem vestir e da simpatia open mind], lança a escada na tentativa de criar uma vaga de fundo exterior que lhe permita aspirar a liderança do partido conservador, e por vezes até reaccionário, mas que perante a possibilidade de chegar ao pote do poder renegue os princípios em que acredita e que defende. E assim vão as coisas, quando a ideologia passa para plano secundário perante a orientação sexual, a identidade e o género. É preciso coragem, dizem.
Sair de casa para a porta da Assembleia da República no dia de tolerância de ponto a seguir ao Natal, qual sem-abrigo ou deserdado pela família, para vir elencar para as televisões a educação [um processo em evolução desde 1975], o combate à pobreza [secretário de Estado do Governo que mais pobres criou em 50 anos de democracia] e o emprego [do Governo que mais falências fomentou e mais emigrantes patrocinou desde os anos 60 do séc. XX] como uma boa herança do Governo da direita radical PSD/ CDS que integrou, ou é um brincalhão ou se faz de tolinho ou ambas.
Alguém que tenha uma casa, por exemplo, no Algarve, segunda habitação, herdada, o que quer que seja, desocupada todo o ano, ou ocupada um mês por ano, como queiram, quem é que impede esse alguém de emprestar a casa a um familiar, a um amigo, a um conhecido, como queiram também, xis dias durante o mês ípsilon para passar férias e até como forma de mostrar, para ladrão ver, que há gente ali?
O Estado, para o caso o fisco, vai plantar um fiscal à porta de cada habitação ou moradia a pedir a factura e o recibo do aluguer? "É pá, desculpe lá mas a casa foi-me emprestada por uma amigo", é isso?
E quem é que impede alguém, que pagou o aluguer duma casa para passar férias durante xis dias no mês ípsilon, muito mais barato do que um apartamento, aparthotel, hotel, de dizer, previamente combinado com o alugador, ao fiscal plantado pelo fisco ali à porta, que "não senhor, não paguei um cêntimo de euro pelo usufruto da casa, sou amigo do dono, é uma troca de favores, ocupo a casa durante xis dias durante o mês ipsílon e, enquanto ocupo a casa, além de ajudar na água, no gás e na electricidade, dou nas vistas porque o ladrão vê que há gente aqui"?
O que vai acontecer é que cada vez vai haver mais gente com "amigos" com casa no Algarve onde até fazem o favor de ir passar férias.
Passos Coelho que, depois da Teconoforma, para sacar fundos comunitários e da ONG, para sacar fundos comunitários, quer moralizar e disciplinar o acesso ao uso e ao mau uso dos fundos comunitários, quer também disciplinar a fuga ao fisco e o turismo paralelo, depois das férias "clandestinas" na Manta Rota.