Humans of Late Capitalism
A drone view shows informal shacks of the high-density suburb of Masiphumelele extending into a wetland adjacent to Lake Michelle private estate in Cape Town, South Africa. Reuters/ Nic Bothma
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A drone view shows informal shacks of the high-density suburb of Masiphumelele extending into a wetland adjacent to Lake Michelle private estate in Cape Town, South Africa. Reuters/ Nic Bothma
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Rússia, China, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egipto, Irão e Etiópia.
É esta a "rearrumação de forças no mundo", as new lyrics for old songs que é a "nova ordem" mundial que "o imperialismo não quer ver nascer".
Residents of Masiphumelele set up burning barricades amidst an ongoing strike by taxi operators against traffic authorities in Cape Town, South Africa, August 8. Reuters/ Nic Bothma
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A girl carries an empty water bottle through a flooded street caused by an overflowing of a water reservoir amid a cholera outbreak, in Hamanskraal, Pretoria, South Africa, Friday, May 26, 2023. AP Photo/ Themba Hadebe
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Um negacionista, não vacinado, hospedeiro da nova variante com origem num continente onde a vacinação é praticamente inexistente. Como é que era mesmo aquela hastag que apareceu no início da pandemia? #VaiFicarTudoBem
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Johannesburg, South Africa, 2020
Marco Longari, Africa wanderer for AFP Photos, Instagram
Sign O' The Times, Capítulo LIII
"These are the days of miracle and wonder, This is the long distance call, The way the camera follows us in slo-mo, The way we look to us all, The way we look to a distant constellation, That's dying in a corner of the sky, These are the days of miracle and wonder, And don't cry baby, don't cry, Don't cry".
O vingativo e egocêntrico Cavaco Silva, o do discurso do Centro Cultural de Belém na noite da vitória para o segundo mandato presidencial, rancoroso, a remoer "ofensas" do passado e a deixar ameaças para o futuro, agora na África do Sul, hipócrita e sonso, a elogiar a grandeza e a magnanimidade de Nelson Mandela por, após 27 anos de prisão, sair "sem sentimentos de vingança, recriminação e algum ódio".
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«O mundo chora a morte de Nelson Mandela, Madiba, na designação afetiva sul-africana, o prisioneiro 46.664 de Robben Island, na nomenclatura fria do cativeiro que ele suportou estoicamente durante mais de 26 anos.
O Nobel da Paz em 1993, Presidente da República Sul-Africana entre 1994 e1999, Mandela representa aos olhos de todos nós o último dos grandes estadistas do século XX, o verdadeiro Homem de Estado portador de uma envergadura moral admirável.
De Madiba guardo recordações pessoais intensas.
Mas estas não vêm ao caso, num momento de dor intensa da humanidade, na hora de uma perda irreparável que se vinha adivinhando nos últimos meses, pela luta desigual que Madiba vinha conduzindo contra a doença que o fragilizava, dia após dia, e que inelutavelmente o vergaria.
O testemunho que julgo oportuno prestar, a título de homenagem derradeira a uma figura superlativa do nosso tempo, prende-se com uma experiência pessoal cujo relato nunca tive a coragem de reduzir a escrito.
Decorria adiantado o ano de 1996. Pairavam ainda no ar fumos de ódio na África do Sul, resquícios do apartheid que, durante décadas, submeteu os não-brancos a humilhantes segregações por parte da minoria branca. Bandos de negros ressabiados apelavam nas ruas ao revanchismo sumário contra os antigos repressores.
É nesta complexa conjuntura social, sentado num barril de pólvora que ameaçava explodir a qualquer momento, que Madiba institui no ano de 1995, por lei especial (Promotion of National Umity and Reconciliation Act No. 34), as Comissões de Verdade e Reconciliação (CVR). Estas são denominadas, em linguagem comum, restorative courts, uma espécie de “tribunais pacificadores”, nos quais vítimas – ou seus familiares directos – poderiam acarear os perpetradores dos crimes contra elas cometidos e assim obter satisfação – catarse – sem cair na pura violência vingativa.
Duas condições presidiam a esta insólita forma de acareação: (i) que o criminoso confessasse toda a verdade sem nada escamotear; (II) que a vítima, ou seu familiar, dissesse, no final, se perdoava ou não o criminoso.
Os jurados – incluindo alguns estrangeiros expressamente seleccionados e convidados para o efeito – detinham o poder, no fim do processo, ouvidas as partes e ponderadas as provas documentais, de amnistiar o réu. Essa amnistia só poderia acontecer em casos justificados e votados como tal, segundo procedimentos registados em ata, contendo as fundamentações de voto por parte de cada membro jurado.
As primeiras audições públicas tiveram lugar em 1996.
Por razões que não vêm ao caso explicitar, fui convidado – tendo participado – como jurado plenipotenciário numa CVR.
E, nessa qualidade, presenciei situações dramáticas cuja intensidade, quiçá brutalidade, mantenho ainda hoje viva na memória e no coração, passados mais de 17 anos sobre a sua ocorrência.
Faço o relato de um desses "julgamentos".
Um fazendeiro boer, homem rude e grotescamente inescrupuloso, fazia, do alto do seu 1,90 m de altura, uma descrição sádica do que fizera aos familiares de um jovem adolescente, com idade não superior a 16-17 anos, único sobrevivente do massacre levado a cabo na propriedade do primeiro.
"É verdade. Matei o teu pai à paulada. Quanto mais ele gemia, mais forte lhe acertava com o maço, na certeza de que o calaria. A tua mãe, que assistiu à morte do teu pai, cortei-a às postas, com que alimentei os porcos na pocilga. Às tuas duas irmãs, violei-as repetidamente e chamei os meus colaboradores directos para assistirem, e banquetearem-se de seguida com os corpos jovens e apetitosos que lhes oferecia, após o que as matei sumariamente, a seu pedido, em nome da preservação das suas honras."
E, continuava, por aí fora, caprichando numa prosa ignóbil, perante o nojo dos jurados, que, entre estupefactos e revoltados com tão animalesca descrição, se viam compelidos a escutar, indefesos, o incrível rol de barbáries e de violências em catadupa.
Findo o martírio de uma narrativa digna de uma besta repugnante, o presidente da CVR vira-se para o jovem negro, silencioso, por cujas faces rolavam grossas pérolas salgadas de um mar revolto que lhe invadia as entranhas, e interpela-o:
"Tens alguma coisa a dizer?"
"Sim", afoita-se o jovem, subitamente recomposto por uma notável serenidade.
Olhando de frente o sabujo criminoso, olhos nos olhos, diz-lhe numa candura de voz que nos deixou, a todos nós, gélidos: "Perdoo-te! (I forgive you!)"
Foi a estupefação generalizada na sala de audiências.
Encerrada a sessão pública, dirigi-me ao jovem que se mantinha cabisbaixo, a um canto, confortado por outros jovens amigos que, na circunstância, o procuravam animar após a duríssima prova a que se submetera.
Num impulso irrefletido, interpelei o jovem: "Como foste tu capaz de perdoar àquele animal, àquela besta destituída de princípios de moral, àquela vergonha da espécie humana?"
Respondeu-me ele: "O senhor é estrangeiro, não é?
E, perante o meu assentimento de cabeça, rematou lesto: "Pois é. Não pode compreender. É que cada um de nós, sul-africanos, transporta dentro de si um pequeno Nelson Mandela".
Dei-me subitamente conta, só então, de como a grandeza de alma do Madiba tinha modelado o espírito sul-africano elevando a capacidade de perdoar – de que ele dera testemunho eloquente – à condição estruturante da filosofia de vida do seu povo sofrido. E, mais, pelo exemplo superior, soubera fazer sentir a uma população ressentida, e ávida de vingança, que só no perdão se encontra a verdadeira e duradoura redenção humana!
Escusado será esclarecer, que os jurados, longe do espírito reconciliador do Madiba, votaram por unanimidade a não-concessão de amnistia ao repugnante réu…
Professor e investigador, Universidade Católica Portuguesa
Aos 5 de Dezembro de 2013, dia em que a humanidade se vê tristemente órfã do pai Madiba»
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Só quem nunca teve o jantar temperado todas as noites, durante meses a fio, com as imagens que chegavam nos telejornais dos confrontos no Soweto, com a polícia do apartheid a disparar a torto e a direito sobre tudo o que respirava [e quem nunca teve pode procurar no tubo ou nos arquivos das televisões para ter uma ideia] é que engole a pantominice das «reservas [pelo] incentivo à violência».
E nem vale a pena recorrer a Bertolt 'lugar-comum' Brecht "do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento, mas ninguém chama violentas às margens que o comprimem", blah-blah-blah, ou à 3.ª Lei de Newton, "para toda interacção, na forma de força, que um corpo A aplica sobre um corpo B, dele A irá receber uma força de mesma direcção, intensidade e sentido oposto", blah-blah-blah também, para perceber onde é que estava a origem da violência.
É que há coisas que têm a ver com a ética, com a igualdade, com o respeito e com a tolerância, com o humanismo, ou para o caso e para os personagens em questão, com o "humanismo cristão", sempre mui pio na primeira fila da igreja mesmo frente ao ambão.
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Adenda: Outra pantominice, a da "preocupação da diplomacia de Lisboa em relação à comunidade portuguesa na África do Sul" foi desmontada por Ramalho Eanes, Presidente da República, depois de receber Thabo Mbeki com honras presidenciais no Palácio de Belém, com Mandela preso e o ANC na clandestinidade, mais ponto menos vírgula, porque "uma guerra revolucionária nunca é ganha pelo poder instituído e temos de projectar o futuro de 600 mil portugueses".
Há presidentes ainda mais hipócritas que o presidente hipócrita.
«Syria's Assad calls Mandela's life a lesson to tyrants»
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"Recordaremos para sempre o decisivo contributo de Nelson Mandela para o fim pacífico do 'apartheid'"