"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
72 anos depois da publicação de As Origens do Totalitarismo temos a direita, que enche a boca de Hannah Arendt, a classificar o outro não como ser humano mas como alguém que professa outra religião ou que é proveniente de outra realidade cultural, com outros usos e costumes, e que por isso deve ser mantido à margem, de início. Sabemos como isto começa e sabemos como isto acaba. E também sabemos que a direita, que enche a boca de Hannah Arendt, nunca leu Hannah Arendt, ou leu e não percebeu, ou leu e percebeu até bem demais e enche a boca para fazer um bonito ou para parecer que é muito erudita. Ficam pior na fotografia que a fotografia que distorcem do outro, do diferente. 72 anos depois.
Imigrantes em Portugal só "se tiverem contrato de trabalho" deixou cair Carlos Moedas numa entrevista à Rádio Renascença. O mesmo Moedas dos unicórnios, das startup's, dos nómadas digitais, dos vistos gold, e que sabe perfeitamente no que assenta o modelo de crescimento da "cidade que está na moda": turismo alimentado pelos baixos salários e precariedade, dos uber - eats e driver, aos tuk tuk, passando pelos alojamentos locais e quem lhes faz a manutenção, à restauração e hotelaria, e às hordas de apalavrados em trabalhos de construção civil e reparações. Uns sem os outros não funcionam e, ao invés de exigir regulação, fiscalização, legalidade e respeito pelos direitos, humanos e laborais, veste uma pele de xenófobo e de uma penada passa a perna ao ex camarada de partido, Ventas, alçado em Le Pen de trazer por casa, ao líder em funções, o homem sem passado, o passado chama-se Passos, e coloca-se à frente dos dois, a arrebanhar votos a um, a posicionar-se para a sucessão do outro. Moedas não é tolinho, pode parecer mas não é.
Podemos não ter o altar-palco no formato Zeppelinfeld de Nuremberga e o palco-altar em Minecraft, no alto do Parque, e haver na mesma o famoso "retorno", por que tanto anseiam alguns "famosos".
Assim como não é necessário evento nenhum, religioso ou outro qualquer, para investir o mesmo dinheiro e reconverter a zona. Mas há o factor "cagança" que é o que parece pesar mais.
A soberba, a luxúria, a gula, três pecados mortais de que enferma a direita, beata e temente a Deus, por detrás da organização do comício da ICAR.
Um interessante trabalho de jornalismo era recuperar o que Carlos Moedas, Filipe Anacoreta Correia, e restante tropa-fandanga, escreveram e disseram sobre o dinheiro do contribuinte enterrado nos estádios do Euro 2004, à época também eles apresentados como uma "obra para o futuro" e "investimento com retorno", damos-lhe um porco e recebemos de volta um chouriço.
Carlos Moedas, presidente da câmara de Lisboa que se disponibilizou a disponibilizar 3 milhões de euros para apoiar lesados de umas cheias que causaram prejuízo de 49 milhões, é o Carlos Moedas, presidente da câmara de Lisboa, que despeja 4 milhões e meio de euros, por ajuste directo, parcelado por causa do ajuste directo, nas mãos da Mota-Engil, do seu ex-colega de Governo Paulo Portas, aquele que foi abrilhantar a convenção do Partido Popular espanhol com o número circense "socialistas são bons a gastar o dinheiro dos outros", na construção de uma bancada de trabalho para o Papa Bergoglio perorar sobre desigualdade e fome no mundo. É mais que um altar, é um investimento que vai servir para outras coisas, dizem em coro alto, na tribuna elevada com vista privilegiada para o altar, o sonso Moedas e o beato-presidente-beato Marcelo, aquele que anda sempre bué preocupado com os sem-abrigo e com o banco alimentar. "Outras coisas", que estão no topo da lista de prioridades dos portugueses, em geral, e dos lisboetas, em particular, a inflação, a guerra na Ucrânia, a habitação a preços acessíveis, e um palco para eventos futuros, tipo entregar a exploração ao senhor genro de Cavaco e em conjunto com o Pavilhão Atlântico criar o hub da pop/ rock, que lindo, e até dá para expor unicórnios. Assim como assim já estamos habituados a ser tratados como lorpas e a deitar dinheiro no bolso de chico-espertos.
Como diria um tal de Mateus em 26:26-28, "Tomai e comei; isto é o meu corpo. Tomai e bebei; isto é o meu sangue. Tomai e governai-vos; este é o meu dinheiro. É fartar vilanagem".
Alguém sabe se António Costa telefonou ao presidente da câmara de Setúbal? Alguém sabe se António Costa telefonou ao presidente da câmara de Campo Maior? Alguém sabe se António Costa telefonou ao presidente da câmara de Oeiras? Alguém sabe se António Costa telefonou ao presidente da câmara do raio que o parta? Mas toda a gente sabe que António Costa não telefonou ao presidente da câmara de Lisboa e toda a gente andou dias a falar de uma pergunta feita por um jornalista a propósito de uma pergunta que não foi feita. Traduzindo, António Costa, político com traquejo e experiência, levou cartão laranja, aquele amarelo a roçar o vermelho, papado por Carlos Moedas que, em modo Taremi, assim que viu a sombra do primeiro-ministro se fez à falta. E Costa caiu redondo que nem um patinho. Costa papado por Moedas, que por estas horas ainda se deve estar a rir, a meias com Marcelo. E esta é que devia ter sido a notícia.
"Fechar a Praça do Comércio significa despedimentos".
"Fechar a Rua Augusta significa despedimentos".
"Fechar o Bairro Alto significa despedimentos"
"Fechar a Avenida da Liberdade significa despedimentos", avisa Moedas, ou quando se elege um acidente de percurso, incompetente e impreparado, presidente de câmara.
Marcelo, que tem como paixão os sem-abrigo e que arranjou maneira de se encontrar "por acaso" com Carlos Moedas na Feira do Livro em plena campanha autárquica, já comentou que é preferível dormir na rua em pleni inverno que num local sem condições?
Do "caos no atendimento" e das "intermináveis horas de espera" para receber a vacina, nos idos de Fernando Medina, para "longas filas" e "algum constrangimento", agora, no tempo de Carlos Moedas. Agora que está a chegar a época se calhar recuperávamos a cantiga do spot "Para o Natal, o meu presente, eu quero que seja, A Minha Agenda, A Minha Agenda...".
No início da pandemia, e durante os confinamentos, volta e meia aparecia alguém "imaginem que isto acontecia durante o governo de Passos/ Portas...", depois Carlos Moedas é eleito presidente da câmara municipal e Lisboa e uma das primeiras medidas que toma é encerrar centros de vacinação para centralizar todo o processo, obrigando uma faixa da população, carenciada e sem meios de mobilidade, a deslocar-se para uma ponta da cidade, mal servida por transportes públicos, e a mega concentrações em filas de espera, após dois dias de suspensão da vacinação num período de corrida contra o tempo; tirar da cartola uma forma de transferir dinheiro do município para negócios privados, através do pagamento das deslocações em táxi. Agora já não é preciso imaginar o que seria o governo Passos/ Portas em situação de pandemia, têm o moço de fretes da troika a todo o gás à frente da maior câmara do país.
Houve uma altura em que a Web Summit era a maior coisa de todos os tempos em todos os lados, só comparável à ida do homem à Lua, tudo por causa da diplomacia económica do Portas e do não sei o quê do Mesquita no Turismo.
Depois veio o socialismo e o Web Summit passou a ser uma valente merda não aconselhada a ninguém de bom nome, uma coisa a evitar a todo o custo.