"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
"Censos 2021 – Portugal a perder população, pela primeira vez desde a década de 60/70 do século passado. Não é uma grande surpresa. Mas é uma enorme preocupação. Provavelmente o problema mais sério que o país tem pela frente."
Imigrantes qualificados para trabalharem nas estufas de Odemira ou na construção da futura barragem do Pisão. Na homilia semanal, com conversa de Chega, herdada do CDS, muito preocupado com a míngua de pessoas de que padece o território, sem explicar por que cargas de água um país que exporta os mais qualificados da Europa para o mundo precisa de "imigração qualificada", já que o obrigava a chegar aos salários dignos, ao mérito, ao reconhecimento, e a contrariar a narrativa do "baixar os custos do trabalho foi a reforma que ficou por fazer" que é o ADN do PSD.
O imbecil que governa os States proibiu a entrada de emigrantes para "proteger o emprego" dos nativos 'amaricanos' assolados pela pandemia Covid. E não está propriamente a pensar nos Navajos, nos Cheyennes, nos Comanches, nos Apaches ou nos Sioux. Os mesmos 'amaricanos' que fazem km filas em jipes, pick ups e vans, para ir à Jonet lá do sítio, a limpar retretes, lavar pratos e trabalhar nas explorações agrícolas. Até os mexicanos se riam.
[Na imagem a primeira página do nova-iorquino El Diario com edição em espanhol]
Querem os fascistas do Vox, entre outras, "Expulsar a 52.000 inmigrantes sin papeles". Os imigrantes que trabalham 12 horas/ dia a troco de quase nada nas estufas dos transvases que pintam a paisagem andaluz de plástico e que metem a Europa inteira a comer frutas e vegetais made in Spain a preços imbatíveis, com mais-valias pornográficas que engordam as contas bancárias de empresários sem escrúpulos, alguns financiadores do Vox. Nem para eles são bons...
[Na imagem um print screen ao acaso da zona de Motril, Andaluzia, com as milhares de estufas alimentadas por mão-de-obra imigrante clandestina]
"He's made of bones, he's made of blood, He's made of flesh, he's made of love, He's made of you, he's made of me, Unity!"
Nos dias do medo e do ódio de Trump, de Salvini, de Orbán, de Farage e da English Defense League, fazer uma canção de protesto e denúncia, hit, com uma letra assim e meter as rádios a tocá-la. Chapéu!
"My blood brother is an immigrant, A beautiful immigrant. My blood brother's Freddie Mercury, A Nigerian mother of three.
My best friend is an alien (I know him, and he is!), My best friend is a citizen, He's strong, he's earnest, he's innocent.
My blood brother is Malala, A Polish butcher, he's Mo Farah"
"O medo leva ao pânico, o pânico leva à dor, A dor leva à raiva, a raiva leva ao ódio".
Como «é preciso diferenciar os imigrantes por motivos económicos dos que são perseguidos por motivos políticos» mesmo que os imigrantes por motivos económicos sejam consequência dos motivos políticos, com o alto patrocínio do Reino Unido, quer por cúmplicidade, quer por omissão – a que se deu o pomposo nome de realpolitik, quer por acção directa, é não perceber que é melhor, infinitamente melhor, ser homeless nas ruas de Londres do que viver debaixo de tecto na Somália, na Etiópia, na Eritreia ou no Sudão, e empurrar o "lixo" para debaixo do tapete mesmo que o debaixo do tapete seja o tapete da porta da rua de quem passa e já nem vê. Pela ausência de massa cinzenta foi Nigel Farage quem ganhou as eleições na bifelândia?
Os trabalhadores que fazem as sandes com as mãos que os ingleses vão depois comer com a boca não são trabalhadores que fazem as sandes com as mãos, são migrantes que fazem as sandes com as mãos que os ingleses vão depois comer com a boca. Só os ingleses. E mais de metade dos trabalhadores que fazem as sandes com as mãos que os ingleses vão depois comer com a boca são do leste da Europa, polacos. E as sandes que os ingleses, só os ingleses, vão comer com a boca depois de feitas por migrantes com as mãos numa fábrica inglesa, são assim feitas com as mãos, pelos migrantes, porque em Inglaterra ninguém quer ir trabalhar para um fábrica a fazer sandes. Nem com as mãos nem com luvas a calçar as mãos. Se calhar porque o salário é baixo para aumentar a mais-valia ao dono da fábrica e/ ou aos accionistas e nem um penny sobra para comprar luvas para calçar as mãos dos migrantes que fazem as sandes que os ingleses, só os ingleses, vão depois comer com a boca.
E ainda há o garrafão da Ponte 25 de Abril, consequência dos empregos para ucranianos, moldavos e brasileiros, só não há Nigel Farage que Paulo Portas agora vende vistos e a nova vocação do CDS ainda não passa por aí.
O Governo que aconselhou os portugueses a emigrar é o mesmo Governo que vai agora lançar um programa com «o objectivo de apoiar a integração de estrangeiros» imigrantes, a começar já pelos «quadros de empresas que põem as suas competências ao serviço de quem precisa delas» [e não de quem lhes paga bem e lhes dá qualidade de vida]. E o alvo primeiro são os filhos e os netos dos que partiram e que se espera que regressem agora pela yellow brick road de um país com a economia aberta, como diz o mentor do secretário de Estado que é adjunto de um ministro que é adjunto [nem na emigração há tanta adjunção]. A gente faz que acredita e a gente dá um desconto. Ao fim e ao cabo estamos em Agosto, o calor na moleirinha, a silly season como sói dizer-se, o deslumbramento de um cargo governativo e o homenzinho grande a brincar ao "sentido de Estado". O melhor mesmo é encolher os ombros.
Não é só de limpeza de casas de banho, de varrer as ruas e recolher o lixo, de lavar escadas e tratar de jardins, de lavar pratos e descascar batatas em hotéis e restaurantes que se trata. A selecção suíça de futebol sem imigrantes.
Não explicou como é que as causas que potenciam a saída da geração de elevado potencial ou de grande valor acrescentado de Portugal para o estrangeiro vão ser ignoradas pelos imigrantes, "de elevado potencial ou de grande valor acrescentado", que se pretende captar ou, na mesma linha de raciocínio, vão esses potenciais imigrantes optar por Portugal e não por outro qualquer país, da opção dos portugueses de elevado potencial ou de grande valor acrescentado. Se calhar recorrendo à "fórmula fisico-química", na moda, da "mobilidade social", explicada a anjinhos...
Entre o humanismo e a lucidez de António Guterres e o populismo demagogo de Nigel Farage, os tories optaram por Nigel Farage, numa fuga para a frente e numa tentativa de minimizar os danos da anunciada vassourada nas próximas eleições. [O passo seguinte, e depois do descalabro, é encostar à agenda xenófoba e racista de Nick Griffin...].
É já um clássico na Europa do séc. XXI, "casa onde não há pão e todos ralham e ninguém tem razão", e com a respectiva correspondência no lado de cá do canal, com o "socialista" Manuel Valls a trabalhar pelos enfants de la Patrie em modo Marine Le Pen.