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DER TERRORIST

"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.

Como descobri Alexandre O'Neill

por josé simões, em 13.03.07

 Encontrei-me cara-a-cara com O’Neill pela primeira vez num fim de tarde, antes de 1980 – não me consigo recordar o quanto antes foi – de um dia qualquer de semana.

Eram ainda os tempos da cultura para o povo. Abaixo o futebol e as touradas! Fado só se for Carlos do Carmo! Procissões só a norte de Rio Maior…

 

Haviam àquela época uma espécie de palestras-debates, organizadas por não sei quem, com poetas e escritores, abertas ao público, num cubículo que servia de sala de ensaios ao TAS (Teatro de Animação de Setúbal) nos claustros do Convento de Jesus e, frequentadas por todo o tipo de intelectuais, aspirantes a, e pseudo – sendo esta última categoria a percentualmente maior. Invariavelmente todos de esquerda, daquela barbuda revolucionária e de boina à Che – com estrela e tudo – no alto da pinha.

 

Ora um belo fim de tarde, de um dia qualquer de antes de 1980, a conferência-debate da praxe tinha como “artista” convidado José Gomes Ferreira; mas o “belo” do Zé Gomes – foi assim que o moderador se lhe referiu – não pode comparecer por motivo de doença.

 

Mas não foi por isso que a palestra-debate se deixou de realizar; nada disso! Naqueles tempos pós-PREC toda a gente sofria (ainda) de um voluntarismo inexcedível, e como substituto de última hora apareceu Alexandre O’Neill.

 

Não sei se O’Neill sabia ao que vinha (na forma), mas uma certeza eu tenho, a maioria dos presentes não sabia quem vinha. Melhor, pensava que sabia. Era o Zé Gomes, pois claro! Sendo que 80 % dos presentes na sala, contas por baixo, não sabia identificar fisicamente José Gomes Ferreira que era assim como um poeta de serviço a toda a esquerda, à esquerda do PS (que tinha Manuel Alegre), quanto mais o “reaccionário” que o tinha ido substituir, e vai daí, naquela fatiota intelectual que tinham vestido propositadamente para a solenidade da ocasião, desatam a fazer perguntas ao O’Neill, sem saberem que era o O’Neill e, como se fosse ao José Gomes Ferreira.

 

Eu agora até penso que O’Neill sabia ao que vinha (no conteúdo) e porque vinha. Passados todos estes anos continua ainda fazer-me confusão porque aceitou.

Não se deu ao trabalho de desfazer os equívocos com uma apresentação prévia, ou com um esclarecimento que, a bem da verdade, deveria ter sido dado pela organização.

 

Entrou a matar e, desata a “falar mal” do “belo” do Zé Gomes – nestas coisas das letras, os ódios de estimação são muito difíceis de ultrapassar.

Durou cerca de 30 minutos a palestra e, Alexandre O’Neill não levou uma coça porque não calhou ou porque Deus não quis.

 

O meu conhecimento de O’Neill resumia-se a um texto que saíra num manual qualquer de Língua Portuguesa.

No dia seguinte cravei 100 escudos ao meu pai e fui comprar um livro. Do O’Neill.

 

(A propósito do livro Alexndre O'Neill - Uma Biografia Literária, de Maria Antónia Oliveira, e a que aqui foi feita referência no dia 23 de Fevereiro.)