Literatura "subversiva"
Passar por aqui trouxe-me à memória um dos livros da minha vida e um acontecimento a ele ligado que iria ter uma importância determinante na minha formação cívica.
No Ciclo Preparatório de Bocage, em Setúbal, havia uma espécie de clube de leitura, dinamizado por uma professora de Português de quem não recordo o nome. Resumidamente: os alunos faziam uma contribuição mensal de alguns tostões, a professora comprava os livros, a estrear e abaixo do preço de capa (nunca (se) soube como), era feita uma distribuição aleatória das obras a ler, e, no final de cada mês, o aluno tinha de fazer um sumário - como se usava dizer -, da obra que lhe tinha calhado.
Calhou-me O Valente Soldado Svejk de Jaroslav Hasek que devorei com sofreguidão duas vezes. A primeira porque sim, tinha de ser. A segunda depois de ter sido expulso da aula de Moral e Religião por um padre-professor de quem também não recordo o nome. “Nas minhas aulas não quero literatura subversiva!” foi a justificação. O que foi motivo para o meu pai ficar de pé atrás quando naquele dia cheguei a casa mais cedo e lhe dei conta do porquê. “Oh Diabo! Essa eu não sabia… Vai haver merda!”. E vai de dar sumiço a uns quantos livros que havia lá por casa e que nunca tinham despertado o meu interesse por aí além, até aquele dia.
Contra todas as expectativas não houve merda e limpei um Muito Bom como nota sobre o Svejk.
Anos mais tarde tornei a ver o padre-que-já-não-era-professor. Andava em campanha eleitoral pelo CDS de Adelino & Diogo. Contra os subversivos, obviamente.
Olhando agora para trás não sei a quem devo ficar mais agradecido, se à professora que me deu a conhecer Jaroslav Hasek se ao padre que me deu o empurrão definitivo borda-fora destas coisas das igrejas.