"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
No dia 27 de Novembro, 19 dias depois, Siza Vieira, o ministro da Economia do Governo do líder do PS, António Costa, vai à câmara alta não eleita do Parlamento, a Concertação Social, dar aos patrões o referencial de 2, 7% de aumento salarial para o ano de 2020, abaixo do que já está a ser negociado em algumas empresas, e quando para atingir a meta proposta por António Costa ao país a fingir que falava para aos militantes os salários só recuperaram para valores pré-crise com subida de 4%.
Onde é que pára o PS de esquerda que levou os anos da troika, que foram os anos do "poucochinho" Tó Zé Seguro, um quase cúmplice, a gritar que a austeridade estava a matar a Europa e a aprofundar o fosso, não só entre o norte e o sul, mas entre os mais ricos e os mais pobres dentro de cada país, enquanto fomentava o racismo e a xenofobia e era a responsável pelo ressurgimento dos fascismos no continente depois da II Guerra?
"Orçamento do Estado só deverá prever um aumento de um por cento para a Administração Interna. Cabrita exige 5% para fazer face às reivindicações sindicais e esvaziar o Movimento Zero."
Do CDS ao Chega passando pelo Iniciativa Liberal e pelas prestimosas colaborações do Livre, já que esta legislatura parece que vai ser a do "vamos brincar aos parlamentos", à chico-espertice da Iniciativa Liberal com o "projecto de lei para que passem a estar plasmados no recibo de vencimento dos trabalhadores por conta de outrem os custos suportados pela entidade patronal no âmbito das contribuições para a Segurança Social", devia a esquerda avançar com outro projecto de lei para que no recibo de ordenado passasse a constar o número de horas diárias que os trabalhadores têm de trabalhar para justificarem o salário que recebem no final do mês, a mui famosa e por vezes esquecida mais-valia. Talvez assim ganhassem consciência do valor do trabalho, da contratação colectiva, da reivindicação, dos direitos e garantias. Já que é para brincar aos parlamentos brinquemos a sério.
"Apesar de 60% da população estar isenta de taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde (SNS), são as classes média, média baixa e baixa que mais contratam seguros, ou seja, a motivação não se prende com a poupança". E é a mesma classe média baixa e baixa que toma o pequeno almoço fora de casa, que compra bilhete a bordo nos transportes públicos ao invés do passe mensal, que faz refeições habituais nas cadeias de fast food, que só veste roupa de marca e com a marca bem visível, e por aí. Portanto há aqui um padrão e tem a ver com educação, organização, economia e gestão do orçamento familiar, não ter nada a ver com a denominada "falência do Estado" e a "degradação do Serviço Nacional de Saúde", argumentos usados pela direita para cavalgar a notícia, na esperança de que ninguém se lembre das décadas de políticas de desmantelamento do Estado social em prol de interesses privados, nos seguros de saúde, na saúde negócio a cargo de privados, nos planos privados de reforma, de que ninguém se lembre que a falência do Estado e a degradação do SNS têm pai e mãe, não nasceram de geração espontânea.
A confusão entre a "missão" de serviço público, inerente ao cargo de deputado eleito da Nação, e um qualquer emprego na vida privada, por alguém que não sabe, nem quer saber, o que é ser deputado eleito, e por outrem que não sabe, nem quer saber, o que é ser assessor de imprensa de um deputado eleito por uma partido político. Siga a marcha.
A doutora Joacine, que não sabia como votar na questão "a culpa é como Israel", absteve-se por dificuldades de comunicação com o partido que mantém mãos cheias de dezenas de militantes activos no Twitter 24 horas por dia. Se isto não é ridículo é no mínimo ridículo. A doutora Joacine, que foi eleita sozinha sem precisar do partido para nada, nem sequer de Rui Tavares, o fundador do partido e a cara do partido, que andou meses com a doutora Joacine ao colo para a mostrar urbi et orbi e para promover a imagem de alguém que foi não precisa de Rui Tavares nem do partido para nada, não sabe o sentido a dar ao seu voto na questão, a seguir ao futebol, onde toda a gente tem opinião formada - "a culpa é como Israel". "Eu é que sou o presidente da Junta". E a doutora Joacine também não conhece Zeca Afonso, caso contrário a questão do sentido de voto, de quem não precisa de partidos para nada, nem se colocava. Se isto não é ridículo é no mínimo ridículo. A doutora Joacine, entretida em trabalho de campo com a meritória transladação de Aristides de Sousa Mendes para o Panteão Nacional, ó ironia, um facilitador de passaportes a judeus ainda a questão da "culpa de Israel" não se colocava, falhou a entrega do projecto sobre a lei da nacionalidade, em campanha eleitoral uma das bandeiras do partido de que a doutora Joacine não precisa para nada e pelo qual foi eleita. As minorias, "racializadas" ou não, podem esperar pelo ego da doutora Joacine ou que o ego da doutora Joacine vote no projecto de outro partido de esquerda, com ou sem indicação do sentido de voto do partido pelo qual a doutora Joacine foi eleita. Se isto não é ridículo é no mínimo ridículo. A doutora Joacine, que foi eleita sozinha sem precisar do partido para nada, quebrou unilateralmente o blackout decidido entre a sua pessoa e o partido de que não precisa para nada, para o acusar de falta de camaradagem e de promover um golpe contra a sua pessoa, "não sou descartável", estou aqui para ficar, "eu é sou o presidente da Junta". Se isto não é ridículo é no mínimo ridículo.