"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
Curioso não é que enquanto haja quem se preocupe em encontrar uma solução para o problema da dívida pública e para o peso do serviço da dívida no bolso dos portugueses que a primeira reacção e o primeiro pensamento de Pedro Passos Coelho seja para o dinheiro que os países que nos emprestaram vão deixar de ganhar com um perdão, uma renegociação, or ever, curioso é que diga isto com a maior das naturalidades, de ar grave e voz de barítono, e nem jornalistas, nem outras forças políticas, nem comentadores, nem politólogos, nem ninguém reaja.
Quem, nestes últimos dias de ressaca europeia às eleições francesas, passe pelo Twitter, pelo Facebook, pelos ainda blogues tradicionais e pelo blogue de tiragem nacional que dá pelo nome de Observador e ler cronistas, comentadores, opinion makers, apoiantes e militantes, dissimulados, envergonhados, descarados, anónimos ou figuras públicas da direita - do 'sentido de Estado' e da marcha do 'arco da governação', mais do que constatar aprende que o problema, o grande problema de uma vitória de Marine Le Pen é a economia, o regresso do proteccionismo, a reposição das barreiras alfandegárias, o encerramento das fronteiras e o travão à globalização. Fora isso tudo bem. E é por isso que Pinochet foi um gajo porreiro.
O aspecto mais curioso, chamemos-lhe assim, do argumentário justificativo da tolerância de ponto dada aos funcionários públicos aquando da visita de Francisco, Papa, a Fátima, ou à cova Deiria, como dizem as televisões, argumentário comum ao Governo, aos partidos da 'Geringonça' e à direita radical beata, uma verdadeira 'união nacional', prende-se com o facto de "muitos portugueses manifestarem interesse em se deslocarem ao santuário", por coincidência, e só por coincidência, todos funcionários públicos, que no Estado laico o sector privado não tem tempo para terços nem se governa com Pais-Nossos e Avé-Marias.
É que depois andamos todos muito assustados a debater a ascensão dos populismos na Europa por os eleitores, por saturação de contorcionismo e de double standards, já não se reverem nos partidos políticos todos iguais.
Em nome da Função Pública e com a benção dos partidos da 'Geringonça', ateus-agnósticos-jacobinos-laicos e religiosamente multi coloridos mas com a base eleitoral de apoio à sombra do Estado.
[Na imagem aquele que provavelmente é o graffiti político mais antigo da cidade de Setúbal, surgido logo na manhã do dia 26 na parede da então fábrica de conservas 1º. de Março à Rua Camilo Castelo Branco]