"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
"Dezenas de militantes na mesma morada, quotas pagas à pressa e em bloco e um ex-governante (Hermínio Loureiro) e o líder parlamentar (Luís Montenegro) como mandatários dos dois lados da barricada."
"Em dois meses do último verão (junho e julho) foram inscritos 418 militantes na secção de Ovar, dos quais 271 pertencem à freguesia de Esmoriz e 80 tinham residência na rua dos Pescadores."
Em 1998 Jim Carrey, pela câmara de Peter Weir, é Truman Burbank, um personagem que, mesmo antes de ter nascido, já vive numa realidade simulada dentro de um estúdio de televisão, uma vida vivida em tempo real e transmitida para milhões de telespectadores em todo o mundo no maior reality show da televisão global. Uma sátira cruel ao lixo televisivo na linha das Casas dos Segredos, Quintas e afins.
Em 2016 Pedro Passos Coelho, pelas câmaras de televisão do pensamento único dominante e pela pena dos jornalistas arregimentados, é o primeiro-ministro do Governo de Portugal no exílio, numa realidade simulada e transmitida diariamente para todo o país. O Governador do Banco de Portugal dá uma entrevista a um jornal à meia-noite e um minuto e os jornalistas às oito da manhã estão, não à porta de António Costa nem tampouco à porta do ministro das Finanças, Mário Centeno, estão à porta de Passos Coelho para saber de sua justiça sobre as palavras do seu Governador.
Passos mete o pin na lapela, made in China, do Estado chinês que nacionalizou os sectores estratégicos portugueses durante o seu consulado de aliviar o peso do Estado na economia, e vai trabalhar, arduamente e com o salário substancialmente reduzido. Lê os jornais no caminho para o trabalho, que trabalho é trabalho e cognac é cogac, e tem reuniões e despachos enquanto almoça, quando almoça, que o tempo é curto e o dia só tem 24 horas, e nada de mais salazarento, do que estes sinais que se pretendem transmitir e estes princípios que se fingem cumprir, há.
Com as câmaras de televisão escondidas, e estrategicamente colocadas, em directo 24 horas por dia para o Portugal global. Passos, primeiro-ministro no exílio, passa mais tempo na televisão que o primeiro-ministro, ele próprio, e de que quando era primeiro-ministro.
"Quem não tem nada para fazer faz colheres", vox pop. E quem não tem nada com que se preocupar dá largas ao seu espírito tolerante e cultura democrática e faz petições para limitar a liberdade de expressão de cada um no Estado laico, ao mesmo tempo que, na informalidade do Twitter e do Facebook, vai lamentando o fim das fogueiras da Inquisição e da separação entre o Estado e a Igreja sob a forma de um "eles haviam de fazer isso era no Irão ou na Arábia Saudita". Allahu Akbar.
Foi por isso que nós votámos contra, na generalidade, e nos vamos abster, na especialidade, por ser "mais realizável". Uma coisa e o seu contrário no mesmo dia, na mesma ocasião e até na mesma frase são pormenores e a coerência é mesmo essa já que o sentido de responsabilidade fica para melhor ocasião. "Social-democracia, sempre!".
O tempo corre contra Passos Coelho. Passos Coelho corre contra o tempo. O tempo corre mais rápido que Passos Coelho. O tempo está a esgotar-se para Passos Coelho. O tempo de Passos Coelho não é o tempo do partido de Passos Coelho. O partido de Passos Coelho começa a ficar sem tempo. Passos Coelho não tem a noção do tempo.